Mais de 59,7 mil pessoas devem receber o diagnóstico de câncer de mama no Brasil até o final de 2019. A estimativa foi publicada pelo Inca (Instituto Nacional de Câncer). No Paraná, o número deve chegar a 3.730 novos casos neste ano. Em 2016, 16.069 mulheres morreram por câncer de mama no País.

Imagem ilustrativa da imagem Outubro Rosa: por um tratamento adequado
| Foto: Roberta Dabdab/Divulgação

No mês do Outubro Rosa, a Femama (Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama) promove a campanha #MeTrateDireito. O objetivo é lutar pelo atendimento personalizado a partir do diagnóstico preciso de câncer.

A mastologista e presidente voluntária da federação, Maira Caleffi, ressalta que os avanços nas pesquisas relacionadas à doença revelaram novos tipos de tratamento que podem ser aplicados de acordo com os resultados dos exames, nem sempre disponíveis pelo SUS (Sistema Único de Saúde).

Na luta pela garantia dos direitos das pacientes, a chefe do serviço de mastologia do Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre (RS), busca também o apoio para a aprovação do projeto de lei dos 30 dias que estabelece prazo máximo para os resultados dos exames nos casos em que a principal hipótese de diagnóstico é câncer.

Como buscar o tratamento adequado para o câncer de mama?

O câncer de mama no Brasil tem se apresentado de forma muito tardia, com menos chances de cura. Uma das coisas que podem mudar isso está relacionada à campanha. A gente pode realizar o tratamento com base no tipo de tumor, por isso a campanha diz "para cada paciente, um tipo de tratamento", para remeter ao fato de que o tumor precisa ser muito bem estudado e diagnosticado para que o paciente tenha o tratamento correto com mais chances de cura.

Além do diagnóstico precoce, também é necessário o diagnóstico preciso para que a gente possa tratar direito, tratar bem e corretamente de acordo com as melhores chances de cura. Quando a gente fala do diagnóstico em câncer de mama, há muitos tipos. Basicamente, dentro da classificação, não é só mais dizer se é câncer ou não. Existem tipos que respondem a hormônios, outros não. Há tipos relacionados a mutação de um gene. Então, esse é um recado para os pacientes, de uma forma geral. Estamos dizendo "olha, nem todos os tipos de câncer são iguais. Você tem que perguntar ‘que tipo de câncer eu tenho e por que estou tendo’. É importante envolver o paciente na sua própria jornada".

Quais os direitos dos pacientes com câncer?

Essa é outra questão da campanha. É "me trate direito, mas de acordo com os meus direitos de paciente oncológico". A paciente oncológica tem várias leis ao lado dela. Por exemplo, a Lei dos 60 dias em que ela tem o direito de começar o primeiro tratamento em, no máximo, 60 dias depois de saber que tem câncer. Ela tem direito a reconstrução mamária imediata. Tem o direito a receber drogas orais, e não estou falando só dos atendimentos no setor público, estou falando também das pessoas que possuem seguro de saúde. Ela tem direito a receber essas drogas orais que são necessárias, às vezes, por 5 ou 10 anos. Ela tem direitos sociais como a quitação da prestação ou financiamento da casa; às vezes, quando tem problemas nos braços por causa da cirurgia, ela pode recorrer à isenção de impostos para a compra de um carro adaptado. Enfim, ela tem que conhecer os direitos como paciente oncológica.

A paciente precisa ser tratada com carinho, com acolhimento. A gente sabe o quão dura é a jornada de um paciente com câncer, de qualquer tipo. No caso da mulher, muitas vezes está envolvida a mudança da imagem corporal, a queda do cabelo. O processo todo é muito sofrido e pode ser que, às vezes, ela não consiga ter a empatia de uma equipe multiprofissional com um enfermeiro, um psicólogo e o próprio médico. Então estamos aqui tentando levantar a bandeira que nem tudo é robotizado e mecânico durante o tratamento. Precisamos muito da mão amiga e acolhedora de uma equipe para passar por essa fase de diagnóstico e tratamento do câncer de mama. Depois, ainda assim, é preciso contar com essa equipe para tirar dúvidas para que a paciente consiga, o mais rápido possível, retomar a vida.

De que forma chegar ao diagnóstico preciso?

A medicina está mudando muito. Para a gente fazer um diagnóstico, um tratamento bem específico para cada paciente, a gente precisa contar com a tecnologia de testes genéticos, não só no tumor, mas também quando a paciente está investigando, por exemplo, uma herança genética. Uma coisa são as mutações nas células que acontecem durante a vida de cada indivíduo. Outra coisa é já nascer com efeitos ou mutações celulares. Hoje em dia, saber disso, às vezes, é tão importante, não só para investigar a família, para saber se é um caso de herança genética como o da atriz Angelina Jolie, mas para saber qual o melhor tipo de tratamento na hora do diagnóstico. O acesso precisa ser muito agilizado nesse sentido.

Esse tipo de exame está disponível pelo SUS?

Os testes de herança genética não são oferecidos pelo SUS, para os casos de pacientes com câncer. Muitos convênios demoram no processo de liberação dos exames em geral e os resultados são muito lentos. Não é mais possível esperar mais que 15 dias para os resultados. Precisamos saber logo, o quanto antes, até para modificar o tipo de cirurgia ou também o tratamento sistêmico, para o corpo todo. Basicamente, por enquanto, essa é a questão: para cada tipo de paciente há um tipo de tratamento.

O mundo está falando muito sobre a questão da carga do câncer. Como é caro tratar o câncer. Isso é uma coisa que só tem uma saída: a gente conseguir tratá-lo mais precocemente. O câncer fica cada vez mais caro quanto mais avançado ele é. Por exemplo, um câncer de mama diagnosticado precocemente, que está no estágio 1 ou, no máximo, no estágio 2, custará menos para o paciente e para os cofres públicos. O acesso ao tratamento é muito melhor. A gente consegue ter a maioria dos medicamentos pelo SUS. É um ótimo motivo para ter cada vez mais precoce o diagnóstico e o tratamento, além da paciente ter mais chances de cura. A outra questão para os cofres públicos é a quantidade de pessoas com vidas perdidas porque o diagnóstico é tardio. Temos que evoluir muito. A grande defasagem entre SUS e medicina privada acontece exatamente no câncer avançado.

Como estão as dificuldades de acesso ao tratamento ao se comparar as regiões do Brasil?

Hoje em dia, cada vez mais, depende muito do gestor público que está no cargo para que a gente consiga ter um melhor acesso. Se a gente depender só do sistema público federal, isso não será possível. No Norte e no Nordeste há mais casos de câncer avançado. Isso é fato. Porém, no Rio Grande do Sul e no Rio de Janeiro, a mortalidade é muito alta e são lugares em que, teoricamente, as pessoas teriam mais condições de acesso ao sistema de saúde.

O que mais nos assusta é a morosidade que existe para resolver os problemas. A gente fala sobre essas coisas há muito tempo. O câncer não espera e precisa ser tomado como prioridade de saúde pública como é de fato. Poucas famílias ainda não foram afetadas por essa doença. Está na hora de levar esse assunto com seriedade porque existe cada vez mais a chance de cura. Temos uma medicina andando rápido, mas o acesso não está indo a contento, tanto ao diagnóstico rápido quanto ao tratamento adequado em, no máximo, 60 dias. Existe a Lei dos 60 dias, mas a gente sabe que muita gente descumpre. A lei prevê que o paciente inicie o tratamento em, no máximo, 60 dias a partir do diagnóstico.

As mulheres têm se conscientizado mais ao longo dos anos e perdido o medo de procurar ajuda após identificar algum possível sinal de câncer de mama?

Promovemos a campanha há 11 anos. De lá pra cá, as coisas evoluíram bastante. As campanhas e a desmistificação certamente ajudaram, mas não adianta só fazer campanha. Precisamos de ações. Vamos entregar ofícios aos senadores para que seja aprovada a Lei dos 30 dias para agilizar o diagnóstico de câncer em geral. Estamos com esse projeto de lei aprovado na Câmara dos Deputados desde o ano passado. Ele foi para o Senado, foi avaliado e foi retirado de pauta por questões que não entendemos. Vamos fazer uma mobilização em Brasília para esse projeto ir adiante. Já existe a Lei dos 60 dias para agilizar o acesso ao tratamento, mas vemos que o diagnóstico não está ocorrendo no tempo adequado. A paciente demora muito para ter o exame na mão, para saber se tem câncer ou não. Às vezes, são meses na espera por uma biópsia, por uma ultrassonografia ou colonoscopia. Então, este ano, estamos focando muito nessa questão do diagnóstico, desde a suspeita até o resultado do exame. É uma maneira de fazer com que haja um esforço para acelerar essa corrida contra o tempo.