Com mais de 20 anos de experiência em pediatria, à frente de uma clínica na região metropolitana de Nova York (EUA) e pai de três garotas - com 16, 18 e 20 anos -, o médico francês Michel Cohen ostenta posições polêmicas em relação aos cuidados com os filhos. Em seu livro, ''The New Basics'', além de condenar a prescrição indiscriminada de remédios, ele ainda considera que a maioria dos pais se estressa muito, sem necessidade. Suas posições, ainda que controversas, nunca afugentaram os pacientes - alguns deles, celebridades de Hollywood cuja identidade Cohen não revela -, que esperam até dois meses por uma consulta. Em seu livro, as dúvidas mais frequentes são esclarecidas de forma didática. Leia, a seguir, trechos de sua entrevista:
A principal mensagem do seu livro para os pais é ''Não se preocupem demais!'' Não é uma missão muito árdua para quem acabou de ter o primeiro bebê?
Sim, pode ser difícil para os pais de primeira viagem. Eles têm muitas expectativas e são atraídos para sites da internet e livros. Mas as informações que recebem são muito alarmistas, gerando medo e ansiedade.
Como manter a calma diante de uma criatura cujo choro é a única forma de comunicação?
Chorar e ter cólicas e como lidar com esses momentos são alguns dos principais tópicos abordados nas visitas nos primeiros meses dos bebês. A maioria dos médicos não explica aos pais que o choro de um bebê novo é uma saída saudável para difundir um estado de excesso de estímulo comparado com o mundo intrauterino. Como resultado, muitos pais são pegos no ciclo de excesso de acalmar seus bebês, e acabam por fazer com que eles fiquem ainda mais nervosos.
Em que momento os pais devem, de fato, se preocupar?
Eu acho que a maioria dos pais tem um instinto natural de se preocupar quando eles precisam se preocupar.
O sr. decreta que as cólicas não existem. Como explicar a pais zelosos que, quando seu bebê chora ininterruptamente, ele quer apenas... chorar?
Em uma situação de choro, o bebê é constantemente alimentado, chacoalhado, acalmado com a chupeta na boca... Tudo isso adicionado a um estado de estimulação. A obsessão de suprimir o choro de um bebê pode provocar o efeito contrário. A maioria dos médicos tenta ajudar os pais com remédios inúteis em vez de dar-lhes sinal verde para deixar seu bebê liberar alguma frustração justamente por meio do choro.
Por que o sr. defende a aplicação mínima de remédios nos tratamentos infantis? Que tipo de enfermidades podem ser tratadas sem medicamentos?
A maioria das doenças em crianças é autolimitada e é natural que elas melhorem por conta própria, sem qualquer intervenção. Quando um bebê está doente, porém, os pais querem, naturalmente, ser pró-ativos e a maioria dos médicos concorda. O problema é que estas intervenções, muitas vezes, são inúteis. Às vezes chegam a ser prejudiciais. Muitas crianças são tratadas com xarope para tosse, remédios para asma e antibióticos que têm efeitos colaterais e não são necessários.
No Brasil, a prescrição de antibióticos para crianças é muito comum. Isso é prejudicial?
As crianças recebem frequentemente antibióticos para tosses, infecções respiratórias e infecções de ouvido, mesmo nos Estados Unidos. Contudo, essas condições são geralmente de origem viral, para a qual um antibiótico é ineficiente. E, mesmo quando as infecções são de origem bacteriana, as crianças são frequentemente bem armadas para lutar contra elas a partir de seu sistema imunológico e tornam-se mais fortes. O uso desnecessário desses remédios criou uma situação ruim: a resistência aos antibióticos. Agora, quando uma criança realmente precisa de um antibiótico para uma infecção bacteriana, o tratamento é mais complicado. Esses medicamentos se tornaram impotentes uma vez que as bactérias têm adquirido resistência a eles.
Outra mensagem do livro é evitar ao máximo as intervenções cirúrgicas. Diante de uma indicação médica, como saber se são realmente necessárias?
Cada vez mais cirurgias são prescritas. Uma, em particular, é a inserção de tubos na orelha para prevenir infecções de ouvido. Otorrinolaringologistas são tão rápidos em prescrevê-la que pode ser de grande utilidade para poucas crianças que realmente necessitam. O problema é que são aplicadas a muitas que não precisam.
É frequente ouvir que o bebê deve ser amamentado só até os seis meses de vida. Esse período de tempo é o ideal? Quais as vantagens de prolongar o período de aleitamento?
Em relação ao aleitamento, quanto mais tempo, melhor. Não só por questões de saúde (os benefícios fisiológicos são máximos nos dois primeiros meses), mas também por conveniência. É muito mais fácil ter uma fonte de alimento natural, quando você estiver em movimento. A maioria das mães que frequenta o consultório amamenta um ano ou mais (mesmo aquelas que trabalham) porque é fácil e simples.
Um projeto de lei em discussão no Brasil proíbe os pais de darem palmadas em seus filhos. O que acha disso? Qual a melhor maneira de impor limites?
Eu venho da França, onde dar palmadas e gritar com as crianças são esportes nacionais. Aprendi, ao vir para os EUA, que há uma maneira muito melhor para implementar limites de violência. A remoção gentil, chamada de tempo limite (ou ''cantinho do castigo''), é um recurso muito mais eficaz e fácil.
No Brasil, em geral, as mães assalariadas ficam com seus bebês entre 4 e 5 meses. Depois, voltam a trabalhar. Como tornar a separação menos traumática?
Elas deveriam estar felizes. Nos EUA, a licença-maternidade dura poucas semanas até três meses no máximo. Também acredito que, no Brasil, as famílias estejam mais próximas, o que cria uma estrutura para a criança quando a mãe retoma sua profissão. Regressar ao trabalho precocemente não é necessariamente um problema para os bebês, que podem se adaptar a uma boa babá.
Com três filhas, o sr. considera que já desperdiçou horas de sono com problemas que, mais tarde, se mostraram pouco importantes? Cite alguma situação que o tenha marcado como pai.
Minha esposa e eu éramos totalmente hippies quando se tratava de gerir o sono das nossas duas primeiras filhas. Nós ficávamos noites em claro, acalmando, alimentando, balançando e cantando. Nós acreditávamos que aquele comportamento era realmente o mais adequado. Pensávamos que, se as nossas filhas estavam acordadas, era nosso trabalho ajudá-las a voltar a dormir. Hoje, reconheço que perdemos horas de sono.
Como fazer o bebê dormir em horários apropriados?
Baseado na minha experiência pessoal e em 20 anos de prática profissional, eu desenvolvi um método para ajudar pais a criarem bons ''dorminhocos''. No consultório, explicamos aos pais o que implica o sono dos bebês. Nós encorajamos os pais a não se preocuparem demais e dar a chance aos bebês de voltarem a dormir logo após acordar. Depois de dois meses, temos uma abordagem mais radical com a ''Formação do Sono''. A partir daí, eles dormem entre 10 e 12 horas sem interrupção. Os pais estão entusiasmados!

Imagem ilustrativa da imagem Como cuidar do bebê sem estresse
"Os pais de primeira viagem têm muitas expectativas e são atraídos para sites e livros. Mas as informações que recebem são muito alarmistas, gerando medo e ansiedade" (Michel Cohen)