Wilson Bueno
PUBLICAÇÃO
sábado, 08 de abril de 2000
O Ilusionista
ReproduçãoGraham Greene fazia mágicas para encantar as mulheresRelatam os biógrafos de Graham Greene que ao fim da vida, no (doce) exílio suíço de Vevey, quando de bom humor, posto que se tornara um velhote mais que rabugento, o escritor costumava divertir os admiradores que de modo constante o visitavam, com surpreendentes exibições de ilusionismo. Dono de considerável biblioteca sobre o tema, sempre acrescida de novos títulos que os fãs lhe presenteavam, Greene iniciara-se no hobby, primeiro para divertir as crianças e, depois, por pura lascívia, para encantar as mulheres...
Admirador da revolução cubana, sobretudo em seu heróico início quando todos os sonhos pareciam se encaminhar para uma ilha de amor sobre a inóspita Terra, como nos versos de Nicolás Guillén, Greene, depois de cada mágica, costumava dizer, em péssimo espanhol e forte acento britânico De este modo Fidel hizo desaparecer Batista referindo-se ao ditador defenestrado do poder pela barbuda guerrilha de Sierra Maestra.
Ao ser informado sobre a carinhosa deferência do autor de Os Comediantes, el comandante, asseguram os biógrafos de Greene, fez chegar a este o convite muito especial para que visitasse Cuba e integrasse a comissão julgadora do Prêmio Casa de Las Americas, então um dos mais prestigiosos concursos literários do planeta. Entre uma baforada e outra do seu então inseparável Monte Cristo, Fidel deu os despachos daquele dia por findos e pediu ao secretário particular que lhe providenciasse, para aquela mesma noite, qualquer título do romancista, de preferência da área ficcional e, claro, em espanhol. A língua inglesa lhe provocava urticária...
Na manhã seguinte, irado e furibundo, o ditador vociferava, no gabinete, que sua assessoria acabara de o meter em papos de aranha, capaz de criar até mesmo uma crise diplomática com a Grã-Bretanha o Greene em questão era um acabado reacionário (como se abusava desta palavra, aquele tempo...) e, em nome do povo cubano e do futuro socialista do mundo, teria que desconvidar o escritor britânico...
O pequeno volume nas mãos, teatral, detalham os biógrafos, Fidel Castro sacudia um exemplar de O Malfeitor, bradando que além de se colocar como um religioso mal resolvido, angustiado e subjetivista (como era um pecado esta palavra, aquele tempo...), Greene não passava de um péssimo, um horrível e burguesíssimo escritor. Que se declarasse a guerra contra o Reino Unido mas que em hipótese alguma, com ou sem mágica y galanterias, semelhante espécime de literato jamais poderia pisar el martirizado suelo cubano.
Isto até que um atrapalhado assessor pedindo desculpas e miles perdones tentou consertar o estrago Comandante, este não é um livro de Graham Greene. Juanito lhe passou, a noite passada, um exemplar de O Malfeitor, do reacionaríssimo Julien Green É também inglês este Green? principiou a se acalmar el comandante. Não, senhor. É franco-americano. Ao que Fidel teria respondido ainda mais furioso Franco? Hijos de una perra, ninguno americano es franco!