No mês da Consciência Negra muitos perguntam qual a origem da data - em 20 de novembro de 1695, o líder do Quilombo dos Palmares, Zumbi dos Palmares, foi morto. Naquela época, as pessoas que residiam no quilombo eram principalmente escravos que haviam fugido do engenho, e viram naquele local um lugar onde pudessem viver livremente.

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A função de Zumbi era zelar pela segurança de todos que residiam no Quilombo dos Palmares, por causa da organização social que tinha dentro local que se tornou famoso e uma referência para a população negra, principalmente entre escravos fugidos e a população de outros quilombolas.

Mas assim como o Zumbi dos Palmares, pessoas negras na atualidade precisam lutar cada vez mais para ganhar espaço na sociedade. Pensando nisso, a FOLHA conversou com três pessoas diferentes para falar um pouco de suas vivências, perguntando se já foram vítimas de racismo, se já se sentiram representados durante a infância na cultura pop e se o Dia da Consciência Negra é importante.

Confiram os depoimentos:

“Já fui vítima de racismo, e isso me fez pensar em como ser vítima deste crime em um país como o Brasil, porque a gente tem desde os casos de racismo declarados explícitos até o que é mais comum, os casos de racismo que ficam ali nas entrelinhas ou que se manifestam não de uma maneira direta. Acho que a primeira situação de racismo da qual eu sofri, da qual consigo lembrar e me fez refletir anos mais tarde, foi na escola mesmo, na infância, quando começam aquelas piadinhas sobre cabelo, e para nós, meninas, isso é uma coisa muito forte. Nesta o meu cabelo ficava mais armado e os meus cachinhos não tinham muita definição, neste mesmo período eu acabei mudando de escola, de uma municipal para uma particular, lembro do esforço que os meus pais tiveram que fazer para colocar meu irmão e eu nesta escola e o quanto ficaria financeiramente apertado, mas a prioridade era dar uma boa educação aos filhos. Isso sempre me fez ter em mente o quão eu precisava me dedicar aos estudos, e quando cheguei de fato à instituição o conteúdo foi o menor dos meus problemas, pois sempre gostei de estudar. Mas o maior problema foi que , diferentemente dos demais alunos, eu era a única criança negra e quando criança era mais difícil de me sentir representada, tanto que demorei muito tempo para assumir meu cabelo crespo, para conseguir me enxergar bonita enquanto mulher preta. Porque nem na televisão dos desenhos, dos filmes, nem entre as minhas amigas que estavam ali, entre as meninas que conviviam comigo na turma, eu sentia que não atendia a nenhum daqueles padrões.

É muito importante lembrar da data, porque o movimento negro no Brasil tem uma caminhada imensa, a gente luta desde que fomos trazidos para cá, enquanto pessoas escravizadas. A da história oficial não contar dessa maneira, o movimento aqui dentro nunca foi pacífico, os pretos e os indígenas sempre tiveram que lutar pela sua Liberdade e pelo seu direito de existência com dignidade”.

Fiama Heloisa, 30 anos, Jornalista e Professora de Português

Imagem ilustrativa da imagem Vivências negras: três pessoas falam do racismo, da infância até hoje
| Foto: Arquivo Pessoal

“Infelizmente o racismo é algo muito presente na minha história, desde pessoas atravessando a rua por me verem até mesmo palavras como “virou gente” quando raspei o meu cabelo. Mas quando o assunto é representatividade, sinto que no futebol e na música especificamente no rap, encontrei minhas maiores referências! Pessoas que realmente me fazem querer ser quem eu sou, além de que acho mega importante as crianças terem personagens para se espelhar, tirando toda aquela visão eurocêntrica de homem branco do Ken da Barbie e mulher branca - Cinderela - , como padrões de beleza e sucesso. Sinto que se eu tivesse tido mais representatividade, teria sofrido menos, teria tido mais força em momentos de dúvida e mais vontade de me manter firme com meu cabelo e visual quando era mais novo. Essa discussão da consciência negra às vezes me pega, pois sinto que ela não deve existir apenas nessa época do ano, e sim o ano inteiro! Criar uma consciência para pessoas negras, uma rede de apoio para elas entenderem que não estão sozinhas e não devem passar por apuros, não deve ser pauta só de uma semana ou um mês!”

Bruno dos Santos, 21 anos, Estudante

Imagem ilustrativa da imagem Vivências negras: três pessoas falam do racismo, da infância até hoje
| Foto: Arquivo Pessoal

“Todo negro e toda negra é alvo de racismo, às vezes é um racismo velado, às vezes é um racismo escrachado, mas desde muito jovens nós passamos por situações que, talvez, quando adultos, consigamos ter a consciência plena de que é racismo. Mas quando criança, a gente só consegue entender que são situações que as outras pessoas não passam, e pessoas negras sim. Mas apesar disso tipo de situação, acredito que todo tipo de representatividade positiva da pessoa negra é importante, principalmente no início da sua vida durante a construção do que a gente entende de personalidade, de caráter, e assim por diante. Além disso, é importante que se comemore, fale e que se reflita sobre o Dia da Consciência Negra. Mas sinto uma angústia e um incômodo, por ser apenas um dia em que é tão vislumbrada a reflexão sobre o racismo, a discriminação no nosso País. Mas acho que é uma cultura que a gente precisa mudar e é uma celebração que nós, negros e negras, temos que fazer durante o ano inteiro. Para termos orgulho de sermos quem somos.”

Poliana Santos, 40 anos, Educadora

Imagem ilustrativa da imagem Vivências negras: três pessoas falam do racismo, da infância até hoje
| Foto: Arquivo Pessoal

* Supervisão: Célia Musilli/ Editora