Um olhar sobre Londrina: a grandiosidade das pequenas coisas
"A Cidade na Retina”, livro de Célia Musilli que reúne crônicas publicadas na FOLHA, será lançado nesta sexta-feira (8)
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terça-feira, 05 de novembro de 2024
"A Cidade na Retina”, livro de Célia Musilli que reúne crônicas publicadas na FOLHA, será lançado nesta sexta-feira (8)
Marcos Losnak/ Especial para a Folha
Todos os dias ela sai de casa e percorre as ruas da cidade com os olhos repletos de palavras. Palavras que devem virar crônicas do cotidiano.
Célia Musilli começou a escrever crônicas semanalmente na Folha de Londrina em 2006. E não parou mais. Em 18 anos de ofício escreveu centenas de crônicas. Algumas delas estão reunidas no livro “A Cidade na Retina” que está sendo lançado pela editora Atrito Arte, nos 90 anos de Londrina.
A obra traz 48 crônicas que retratam a cidade e seus infinitos personagens, visíveis e invisíveis. Textos que trazem uma percepção afetiva de Londrina e de seus habitantes. Crônicas que revelam a grandiosidade das pequenas coisas que se escondem sob o manto da indiferença.
A autora não sai de casa todos os dias simplesmente procurando cenas ou temas para as crônicas. Não procura por realidades explícitas: “Acredito que cenas e temas se apresentam, se mostram. No íntimo eu talvez as ‘chame’, convoque como momentos imperdíveis de vida sem os quais seríamos menos humanos. Meus olhos tornam-se assim uma máquina fotográfica que vai transformar imagens em palavras. Um modo de registrar a beleza da vida que todos os dias nos traz presentes que nem sempre enxergamos.”
O lançamento de “A Cidade na Retina” acontece nesta sexta-feira (8), na Biblioteca Pública de Londrina, às 19h30.
A seguir, a jornalista e escritora fala de seu novo livro e de como a crônica pode desautomatizar o olhar diante da realidade.
Em uma das crônicas de “A Cidade na Retina” você escreve: “Meus olhos tornam-se se uma máquina fotográfica que vai transformar imagens em palavras.” O olhar é a sua grande ferramenta como cronista?
Sem dúvida. Como cronista do cotidiano e, neste caso, do cotidiano das cidades, não sou indiferente àquilo que vejo nas ruas. Registro o que mais me chama a atenção, coisas que podem passar despercebidas para outras pessoas. Vivemos um tempo em que a fotografia, sobretudo a selfie, é a razão de existir de muita gente. Não há evento que não seja fotografado. Mas muitas vezes me pergunto se as pessoas realmente vivem o momento, aquele instante que acontece diante dos nossos olhos e que não requer o filtro de uma câmera para ser visto. A experiência de olhar verdadeiramente para as coisas, usufruindo delas, sejam paisagens ou pessoas, é essencial. Por isso o título do livro, “A Cidade na Retina”. Registrar em texto, narrar, é uma outra experiência da memória.
Londrina é personagem marcante nas crônicas de “A Cidade na Retina”. Perceber a cidade é uma forma de entendê-la?
Londrina se torna personagem em muitas crônicas, uma personagem que convive, acolhe ou rejeita outras personagens. São essas cenas de acolhimento ou rejeição que muitas vezes registro. É sim um modo de entender a cidade, compreender seu funcionamento, puxar fios do cotidiano para narrar histórias da vida urbana. A partir deste entendimento, que gera reflexões, outras pessoas podem também pensar e entender Londrina a partir de suas próprias experiências, tendo um texto como ponto de partida. A crônica serve para atrair, sacudir ou questionar pessoas acerca do entendimento de um fato comum ou de uma cena excepcional que acontece nas ruas.
E que Londrina é essa que desperta tantas sensações, percepções e reflexões em suas crônicas?
Londrina é a minha cidade, a cidade que me acolheu desde que cheguei aqui aos 17 anos para estudar jornalismo, fazer a faculdade de Comunicação era um sonho. Desde a adolescência já sabia o que queria da vida profissional.
Londrina foi e continua sendo o cenário da jornalista e da cidadã. Também tenho um prazer particular em me deter em detalhes do cotidiano, puxar cenas e acontecimentos que podem render uma crônica. Ando atenta pelas ruas, isso não significa que também não me distraio vendo uma fileira de anus-brancos passeando em família na Praça Floriano Peixoto. São coisas assim que me fazem ver a cidade de forma poética ou de forma crítica. Isso desperta emoção, reflexão e também imaginação. Muitas vezes, as crônicas são metade realidade e metade ficção.
Na crônica “O Destino do Texto”, você diz que “humaniza coisas que parecem banais, mas que fazem toda a diferença no cotidiano”. Por que humanizar as coisas do cotidiano?
Acho que escrevi isso para me contrapor à crueza da realidade. Uma realidade na qual a automatização do olhar sobre o sofrimento humano não desperta quase nada na maioria das pessoas. Vivemos um tempo de anestesiamento das emoções. Muitas vezes as pessoas não estão nem aí com a mãe que vende balinhas no centro de Londrina com um bebê no colo. Mas ela está ali para levar o sustento para casa. Então, humanizar as coisas e as pessoas também é papel de quem registra os acontecimentos justamente para chamar a atenção sobre eles. Hoje, não ser indiferente é uma qualidade, um primeiro passo para a humanização.
Suas crônicas são inundadas por uma atmosfera de afetividades, acolhimentos e compreensões. Por que seus textos possuem essa atmosfera?
Acolher e amar são coisas muito próximas. Eu acolho acontecimentos e pessoas, os transformo em texto para expressar também meu amor pela cidade e seus personagens. Acho que um dia, daqui a 10 ou 20 anos, isso terá um valor de memória afetiva. Porque a história de uma cidade é feita também de afetos. Essas coisas estão aí, na cara, para a gente ver, acolher e registrar como marca da nossa passagem neste mundo. Os textos são também fotografias de um tempo.
SERVIÇO:
“A CIDADE NA RETINA”
Autora – Célia Musilli
Ilustrações – Fernão Galvão de França
Editora – Atrito Arte
Prefácio – Bernardo Pellegrini
Apresentação – Adriana De Cunto
Páginas – 146
Quanto – R$ 30
Patrocínio – Promic
LANÇAMENTO:
Quando – Sexta-feira (8), às 19h30
Onde – Biblioteca Pública de Londrina (Av. Rio de Janeiro, 413)