Seus olhos não estão enganando você, que está de volta àquela conhecida sala de cinema para encerrar a longa espera. Não quero aborrecê-lo com detalhes sobre os vários adiamentos, de resto todos conhecidos (pandemia, demissão do diretor Dany Boyle, contratação de Cary “True Detective” Fukunaga, entre outros percalços menores), mas as mudanças tornaram o filme um dos mais ansiosamente aguardados da série.

Então, para ser breve de modo que deixaria Bond orgulhoso: valeu muito a pena esperar por “No Time to Die”. E o que é mais impressionante: apesar do atraso de quase dois anos e dos inúmeros trailers, o filme desembarcou há uma semana nos seis continentes envolto em segredos. O que se sabia antes do 30 de setembro era um prólogo pré-titulo, espécie de continuação de “007 Contra Spectre” (2015). E logo depois da longa introdução estamos ao lado de Bond gozando de sua aposentadoria na Jamaica (onde surgiu o personagem em “O Satânico Dr. No”, 1962).

Cinco anos se passaram desde que ele deixou o serviço ativo. Mas agora muda de ideia a pedido do velho amigo Felix Leiter – um agente da CIA também surgido em “Dr. No”. Há pouco mais de meio século, a conveniência era ser branco para trabalhar na Agência; em 2020, correção política feita, Felix é negro. A missão, mais perigosa que o esperado: resgatar um cientista sequestrado, e logo enfrentar vilão misterioso que manipula nova tecnologia mortal que pode acabar com o mundo. Até aqui nada novo. Esta fórmula alimentou filmes com tramas que se sucederam por seis décadas. Enquanto esta descrição parece enredo de mais uma missão da série “Bond salva o mundo”, por outro lado “Sem Tempo Para Morrer” está intimamente ligado às outras estreias da era de Craig como 007. Felizmente ele está livre e sem o compromisso de explicar fatos que pesavam sobre Spectre, e é possível entendê-lo sem conhecimento dos outros filmes.

Daniel Craig como 007: nenhuma outra “era Bond” (Connery, Moore, Lazenby, Dalton e Brosnan) teve permissão para revelar o destino final dos respectivos 007. Mas “No Time to Die” cumpre a promessa de ligar todas as pontas soltas
Daniel Craig como 007: nenhuma outra “era Bond” (Connery, Moore, Lazenby, Dalton e Brosnan) teve permissão para revelar o destino final dos respectivos 007. Mas “No Time to Die” cumpre a promessa de ligar todas as pontas soltas | Foto: Divulgação

Será uma experiência mais rica se você assistiu a eles, mas o processo não é inacessível para potenciais espectadores recém-chegados. O longo (mas jamais pesado) tempo de duração (163’) poderia causar sobrecarga de exposição para Daniel Craig. Mas isto está longe de ser verdade. O roteiro é densamente traçado, mas o filme tem ritmo rápido, o que significa que raramente há um respiro entre as grandes sequências de ação e uma ou outra revelação. Para entrar em mais detalhes há sério risco de spoilers, mas com certeza a legião de fãs do agente do MI6 terão muito material para discutir após a exibição.

Nenhuma outra “era Bond” (Connery, Moore, Lazenby, Dalton e Brosnan) teve permissão para revelar o destino final dos respectivos 007. Mas “No Time to Die” cumpre a promessa de ligar todas as pontas soltas. Parece novidade (e é) como resultado, e não apenas mais uma missão 007, mas o diretor Cary Joji Fukunaga ainda esmiúça e vai atrás das marcas registradas de Bond ao longo de sua história (dele, Bond), incluindo o covil do vilão da hora incrivelmente projetado, como outros ao longo das aventuras dos anos mais distanres, os 60, 70, 80 e 90.

Por falar em vilão. Ou por último (quase...), mas não menos importante. Rami Malek, elevado à condição de ator de primeira grandeza (?!) graças à sua imitação de Freddie Mercury, procura ser uma presença ameaçadora como o malvado Safin, um assassino vingativo. Ele é um compêndio de clichês dos vilões enfrentados por Bond por mais de meio século. O desempenho de Malek não ajuda em nada. Pelo contrário. Poucos atores poderiam resgatar um papel tão básico, e Malek não é um deles, desprovido de carisma e energia. Sua especialidade é sussurrar em tom ameaçador e monocórdio. E só não compromete mais porque ocupa pouco espaço físico na história. Não aprendeu aquela história de que menos é mais. Um retorno a este momento elegíaco de Bond com certeza merece uma revisita, tão emotiva quanto esta a despedida dele. Ainda há muito o que escrever.

Confira o trailler de Sem Tempo Para Morrer