Um certo sentimento estrangeiro
PUBLICAÇÃO
quinta-feira, 10 de fevereiro de 2000
Zeca Corrêa Leite
De Curitiba
Entra em cartaz hoje, em Curitiba, o espetáculo Como uma Pera.... Trata-se de uma colagem feita com música, texto e gestos e que expressa as diferentes sensações de se estar numa terra diferente
Estréia hoje, na Casa Vermelha, em Curitiba, um espetáculo que tem como tema a reflexão sobre o sentido de ser estrangeiro e suas consequências múltiplas: a fase das descobertas, aprendizado do idioma, choques culturais, presenças, ausências, solidão. Como uma Pera... tem no elenco a cantora, bailarina e atriz suíça Martina Stofer, o músico Sérgio Albach e a cantora, atriz e bailarina Melina Mulazani. A direção é de Rocio Infante.
Martina pensava em montar um trabalho que falasse justamente sobre a mudança geográfica e como isso implica não só culturalmente, mas também espiritualmente sobre a pessoa. Ela e o marido deixaram a Suíça há três anos objetivando estabelecer contato com uma nova cultura, aprender uma nova língua, conhecer mais de perto o dia-a-dia de um outro povo.
Escolheram o Brasil e vieram não como turistas, mas com a disposição de serem novos moradores mesmo que isso não seja para sempre. Martina Stofer diz que às vezes se sente estrangeira, apesar da família ela, marido e filho ter-se adaptado à cidade.
São fases em que me sinto isolada, sem família, sem amigos. Fico pensando que todo mundo pensa tão diferente, é outra cultura e não sei o que faço aqui, confessa. Depois dá a volta por cima: Não importa onde você está; você sempre encontrará pessoas com as quais tem sintonia e consegue se comunicar mesmo com poucas palavras. O espetáculo condensa todos esses sentimentos.
A diretora Rocio Infante concebeu uma colagem de música, textos e movimentos que define como sendo a relação com suas raízes, etnias, vontade de encontrar outras pessoas. Foi por aí que teve início o entendimento entre ela e Martina, sem haver estranhamento quanto as inquietações da artista suíça.
Coisas que ela tinha em si acabou encontrando aqui. Como estive em outro país, também vi que meu comportamento em outro lugar era mais espontâneo, deixava reagir e identificar melhor que aqui. Quando cheguei a outro lugar era possível ser, explica Rocio. Para dar mais densidade à proposta foram incluídos textos de Clarice Lispector, Max Frisch, Vilma Slomp, Rocio e Martina.
A Casa Vermelha, com sua arquitetura antiga e sem maquiagens para esconder a idade, serve como moldura ao espaço onde se desenrola as cenas. O cenário junta um amontoado de memórias de Martina Stofer nas folhas secas do outono/inverno europeu. Elas delimitam o quadrado do palco, espalham-se pelo chão e, além da fronteira, a linguagem mais evidente é a televisão.
São quase 20 tubos de TV além dos próprios aparelhos que farão a iluminação do espetáculo. É o culto, a rosa dos ventos, espécie de mestre e espelho no qual o País tenta se retratar e quer imitar. Entre um território e outro, a bailarina experimenta de seus frutos, perde e reencontra pêras, como as da música de Milton e Ronaldo Bastos.
Como uma Pêra..., com Martina Stofer, Melina Mulazani e Sérgio Albach. Estréia hoje na Casa Vermelha (Largo da Ordem), às 21 horas. Em cartaz até 20 de fevereiro, de quinta a sábado às 21 horas, domingo às 19 horas. Ingressos: R$ 10,00, R$ 8,00 (bônus) e R$ 5,00 (classe artística e estudantes).ispector, Max Frisch, Vilma Slomp, Rocio e Martina.
José SuassunaElenco de Como uma Pera em cena: densidade ressaltada com textos de autores renomados como Clarice Lispector e Max FrischJosé SuassunaA diretora Rocio Infante concebeu uma montagem que englobasse raízes, etnias e até vontade de encontrar outras pessoas