Ela aterrissa em Londrina neste final de semana com um repertório para lá de refinado. E não poderia ser diferente, já que vem da Portela, um dos celeiros mais férteis da música brasileira. Prestes a completar 79 anos, esbanjando vitalidade e simpatia, Tia Surica chega para interpretar Manacéia, Candeia, Aniceto, Monarco, Paulinho da Viola, entre outros mestres.

A pastora carioca da escola de Madureira, bairro onde nasceu e vive até hoje, é a convidada da nova edição do Samba da Madrugada, A Roda é Delas, com Tia Surica da Portela, neste sábado (12), a partir das 21 horas.

Iranette Ferreira Barcellos nasceu em 17 de novembro de 1940. Mas o nome de batismo não pegou. Ainda muito criança recebeu o apelido da avó e tornou-se Surica para sempre.

“Fui a primeira mulher a vencer um carnaval puxando samba”, contou ela por telefone à FOLHA. Isso foi em 1966 e o samba-enredo era “Memórias de um Sargento de Milícias”, de Paulinho da Viola. “É o samba mais longo que existe. Se fosse hoje, eu iria chegar na dispersão sem terminar de cantar”, brinca. De fato, a letra tem mais de 40 versos.

Dona de uma voz grave e potente, Tia Surica integra a Velha Guarda da Portela desde os anos 1980. O grupo tem vários discos gravados, como o belíssimo “Tudo Azul”, produzido por Marisa Monte em 1999. Mas a pastora também tem trabalhos solos, como “Poderio de Oswaldo Cruz”, de 2012, e “Tia Surica”, de 2003, todos dedicados aos grandes poetas do samba.

Ela está com planos de fazer um novo CD. Mas não tem data para começar a gravar. “Essa crise está difícil, o dinheiro sumiu”, afirma com bom humor.

A sambista não se queixa de nada. Provocada pela reportagem, nega que os grandes poetas e intérpretes sejam colocados em segundo plano no Carnaval das celebridades. “Tem espaço para todo mundo.” Também não pensa que a geração dela é imbatível. “Há compositores novos muito bons. Espero que deem continuidade ao trabalho dos antigos.”

Tia Surica: "Fui a primeira mulher a vencer um carnaval puxando um samba"
Tia Surica: "Fui a primeira mulher a vencer um carnaval puxando um samba" | Foto: Bruno Veiga/ Divulgação

Tia Surica não tem tempo para lamúrias. Em julho deste ano, foi comunicada pela direção da Portela que não poderia continuar com a feijoada que promovia todo primeiro sábado do mês na quadra da escola há mais de 15 anos. “Eles têm a crise lá. Não tinham condições de manter. A vida continua e a Portela também”, desconversa.

Segundo o Portal G1, da Rede Globo, patrocinadores deixaram de apoiar as feijoadas das escolas e a Portela decidiu terceirizar o evento.

Há mais ou menos 40 anos, Tia Surica busca manter viva a tradição do samba com feijoada, dobradinha que, segundo ela, teve início com Tia Ciata - Matriarca do Samba falecida em 1924 e prosseguiu com a portelense Tia Vicentina (1914-1987). Atualmente, ela promove rodas de samba com feijoada esporadicamente em sua própria residência. É o tradicional Cafofo da Surica.

A cantora é o quarto baluarte das velhas guardas do samba trazidos para Londrina pelo Samba da Madrugada, evento promovido na cidade bimestralmente pelo carioca Michael Soares. Em outubro de 2014,quem se apresentou na roda foi o mestre mangueirense Nelson Sargento, hoje com 95 anos. Em abril de 2018, o convidado foi Monarco da Portela (86). E, em abril deste ano, Aluízio Machado (80), da Império Serrano.

Também já se apresentaram no palco do Samba da Madrugada, artistas como Sombrinha, os jovens do grupo Casuarina e o falecido Almir Guineto.

SERVIÇO

Samba da Madrugada com Tia Surica

Quando: 12 de outubro, às 21h

Onde: Rua Paraíba, 574

Ingressos pelo Sympla