Imagem ilustrativa da imagem Tem batuque no céu: samba negro, forte e destemido perde Nelson Sargento
| Foto: Bete Marques/Ofotográfico/Folhapress
Com um verdadeiro legado à cultura, Nelson Sargento faleceu nessa quinta (27), aos 96 anos, vítima de Covid-19. Reconhecido, é de sua autoria "Agoniza mas não morre", composta em 1979, onde fez uma ode ao samba.
"Samba/Negro, forte, destemido/ Foi duramente perseguido/ Na esquina, no botequim, no terreiro/ Samba/ Agoniza mas não morre/ Alguém sempre te socorre/Antes do suspiro derradeiro".
Do alto de sua patente, Sargento construiu uma história e fez mais do que fãs, admiradores ou seguidores. Sua honra em torno do samba o transformou em um ícone cultural e um influenciador à frente de seu tempo. No Carnaval de 2020, seo Nelson como também era tratado carinhosamente, atuou como como José, pai de Jesus, durante desfile da escola de samba Mangueira. Em janeiro de 2021, tão grande era o poder de sua imagem, foi convidado a participar da cerimônia de abertura de vacinação no Rio de Janeiro. Sob a hashtag #só vem, lá estava o negro, forte e destemido, servindo de modelo para que todos os idosos fossem tomar a vacina contra a Covid-19.
De cadeira de rodas e com os dedos para cima, como quem acompanha uma marchinha, ainda em 2019, inspirava gerações ao prestigiar evento de Dudu Nobre durante o Carnaval e, mais uma vez, provava o quanto era do samba, negro, forte e destemido. No mesmo ano, foi homenageado no Espaço Favela, durante o Rock in Rio. Até o último suspiro, Sargento não deixou o samba morrer para um sem número de apreciadores do gênero musical. Versátil, suas performances no palco eram também uma oportunidade para exibir, com satisfação, as canecas de porcelana que desenhava. Sábio, quando viu que não podia mais com a água ardente, trocou pela mineral, sem perder a autenticidade, a alegria e o modo de cantar contagiante.
Sua trajetória inclui também a presença no revezamento da tocha olímpica, em 2016. Devidamente paramentado como ditava o protocolo, o sorriso marcante e a emoção do sambista renderam imagens tão históricas como personificadoras do momento. Suas participações na Flip - Feira Literária Internacional de Parati, em 2017, em prêmios musicais como no Prêmio da Musica Brasileira no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, em 2014, são prova de um homem ativo, que recebia convites e tinha sua trilha pelo samba e pela cultura respeitadas.
A vitalidade de Sargento, somada a sua vocação e originalidade o fizeram um senhor de muito respeito. Se a linha do tempo não se apresenta acima de modo cronológico, sua carreira foi na raça e ainda que 96 anos pareçam muito, aos seu respeitável público.
Músicos, escritores, políticos, jornalistas não pouparam elogios e lamentaram a perda de Sargento. Foi firme, foi forte, deixou o samba um tanto órfão. Por isso, tantas palavras de pesar, proporcionais a seu valor. Da altura de seu talento, uma saudade que tenta alcançar o céu. E se serve de consolo, só deixa saudade quem faz bem.
A apresentadora da CNN Brasil, Luciana Barreto, prometeu lutar pelo samba e escreveu: "Nosso baluarte, seu Nelson Sargento, acaba de partir. Descanse em paz, Mestre. A gente promete luta pelo samba. Gratidão por tudo o que fez por ele e por nós".
Considerado uma lenda e presidente de honra da Mangueira, Nelson Sargento foi também sinônimo de resistência cultural. Produtor musical e idealizador do Samba da Madrugada, Michael Soares, trouxe o artista para Londrina em 25 de outubro de 2014. "Ele foi muito prestigiado e a troca de energia foi incrível. Para o público, ele parecia inatingível, mas foi de uma grande humildade, uma verdadeiro príncipe." Soares relata que à época, devido à falta de recursos, nem palco existia. "Habituado a cantar sentado, em Londrina, aos 91 anos, ele cantou de pé. Disse que se sentiu muito à vontade. Era um garoto, feliz e realizado por cantar. Ficou dois dias aqui. Amou a culinária de Londrina, o lago e fez questão de provar uma cachaça, embora não mais bebesse álcool", recorda.
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