Socorro coletivo à arte e à poesia

A classe artística é uma das atingidas pela crise financeira que a pandemia de Covid-19 deflagrou. Responsável por 2,64% do PIB (Produto Interno Bruto) nacional e pela geração de mais de 1 milhão de empregos, o setor deve ser um dos últimos a voltar à normalidade para evitar a aglomeração de pessoas mesmo após a flexibilização do isolamento social. Sem nenhum apoio do governo federal até o momento, artistas dependem do apoio do público para garantir a sobrevivência neste período crítico.

Um dos exemplos de iniciativas em prol dos trabalhares da cultura é o projeto “p-o-e-s-i-a.org”, que visa disponibilizar bolsas de amparo a poetas de todo o país que estejam passando por dificuldades financeiras. “Depois de dedicar a vida inteira à arte, a poetisa paraense Olga Savary morreu vítima do novo coronavírus há 15 dias, aos 86 anos, praticamente sem nenhum recurso financeiro. Criamos esse projeto para evitar que outros poetas morram sem nenhum tipo de amparo. Com a ajuda do público pretendemos disponibilizar bolsas emergenciais com valores que variam entre R$ 600 e R$ 2 mil”, explica o poeta paulistano Sérgio Cohn, idealizador do projeto desenvolvido em parceria com a poetisa e compositora Beatriz Azevedo.

Cohn enfatiza que a ideia é conceder as bolsas a cada um dos contemplados por um período que varia entre seis meses a um ano. “Nossa intenção é que a pessoa beneficiada tenha um tempo para se reestruturar e não apenas um socorro pontual”. Para atingir o objetivo, ele e um grupo de escritores criaram uma campanha virtual na qual doadores se comprometem a contribuir mensalmente com a iniciativa. “Os valores de doação variam de R$ 20 a R$ 1 mil por mês. A campanha não tem prazo para acabar pois a crise causada pelo novo coronavírus deve se arrastar por um tempo que ninguém ainda consegue precisar”, enfatiza.

O poeta informa que nas próximas semanas os critérios para solicitar as bolsas de amparo serão divulgados na página criada pela Cooperativa de Poesia no Facebook. “Provavelmente será lançado um edital para atender poetas de todo o país. A pessoa que precisa do auxílio terá que comprovar sua atuação na poesia, seja por meio de livros publicados, participação em movimentos de poesia urbana, colaboração em revistas ou outros veículos virtuais”, detalha ao salientar que a seleção dos contemplados será feita por uma comissão escolhida entre os conselheiros do projeto que tem entre seus integrantes nomes de peso como Chico Buarque, Conceição Evaristo e Glauco Mattoso.

Até a manhã de quinta-feira (28), a campanha criada no site Benfeitoria havia arrecadado 7,3 mil da meta estipulada em R$ 20 mil. “Além de ajudar a poetas que estão passando por dificuldades financeiras, quem contribuir terá acesso a recompensas que variam entre revistas de poesia digital e impressas”, afirma Cohen.

Além do auxílio emergencial, o projeto "p-o-e-s-i-a.org" tem como objetivo a criação de outras iniciativas para o fortalecimento da poesia brasileira a longo prazo, como uma revista mensal, iniciativas digitais, projetos de preservação, memória e articulação junto a instituições públicas e privadas para fomento de ações voltadas à poesia. Interessados em colaborar com a iniciativa podem fazer doações pelo site www.benfeitoria.com/poesia.

Boleto em Cena

No dia 14 de junho, o público londrinense que aprecia a arte terá a oportunidade de substituir os aplausos por gestos de solidariedade. Londrina será a segunda cidade do país a participar do projeto Boleto em Cena. A proposta é que trabalhadores da área cultural da cidade que estejam passando por dificuldades financeiras neste momento em que estão impossibilitados de exercer seus ofícios contem com a ajuda de apoiadores dispostos a pagar algumas de suas contas.

A ação será promovida pela produtora cultural londrinense Janete El Haouli. “No dia 14 de junho, farei uma live de duas horas, das 17h às 19h, em minha página pessoal no Facebook. Nesse período, qualquer trabalhador da área de cultural que esteja precisando de ajuda poderá postar seus boletos no mural. E as pessoas dispostas a contribuir poderão pagar a conta e postar o comprovante de pagamento durante o ato”, explica.

Segundo ela, a performance consiste na leitura de nomes ligados à área cultural. “Vou ler o nome de pessoas que autorizem previamente a divulgação de seus nomes. Pode ser tanto de pessoas que atuam no setor cultural quanto de quem pretende colaborar com a ação”, esclarece ao informar que podem solicitar o pagamento de contas todas as categorias profissionais que atuam no setor cultural.

“Podem ser os próprios artistas, técnicos de som e iluminação, camareiras e todos os profissionais que constam nas fichas técnicas dos espetáculos. Também poderá ser solicitada antecipadamente por in box a doação de alimentos e até mesmo o repasse de dinheiro a quem estiver necessitado. “Há pessoas que sequer têm conta no banco e que mesmo passando por muitas dificuldades sentem vergonha de pedir ajuda. Ver profissionais da área da cultura passando fome é muito triste. Sei que há pessoas que podem e querem ajudar. Precisamos agir", enfatiza Janete.

Ela ressalta que o projeto Boleto em Cena foi idealizado pela atriz e produtora cultural carioca Natasha Corbelino, que fez um ato na internet no dia 22 de maio para ajudar profissionais ligados à arte no Rio de Janeiro. “Eu a conheço há mais de 20 anos e achei a proposta muito interessante, por isso sugeri que o projeto fosse realizado uma vez por mês em diferentes cidades brasileiras. Já entramos em contato com produtores interessados em promover atos em Recife, Salvador, São Paulo”, informa.

Câmara aprova repasse de R$ 3 bilhões a artistas

Na última quarta-feira, a Câmara Federal aprovou um projeto que prevê o repasse de R$ 3 bilhões para o pagamento de renda mensal a trabalhadores da cultura, manutenção dos espaços artísticos e para ações que ajudem o setor a enfrentar a crise causada pela pandemia de Covid-19.

Conhecida como Lei Aldir Blanc, o texto ainda depende de aprovação do Senado e de sanção ou veto presidencial. A lista dos beneficiados inclui artistas, produtores, técnicos e outros trabalhadores que atuam no setor cultural, que terão direito a uma renda emergencial de R$ 600 por três meses.

Também terão acesso à verba espaços culturais e artísticos, micro e pequenas empresas culturais, organizações culturais comunitárias, cooperativas e instituições culturais. Nestes casos, serão disponibilizados recursos com valor mínimo de R$ 3.000 e máximo de R$ 10 mil. Em contrapartida, os espaços culturais, se comprometerão a promover atividades destinadas a alunos de escolas públicas ou em locais públicos de sua comunidade.