Petrônio Gontijo interpreta Edir Macedo (no detalhe): bispo da Universal  investe milhões na própria imagem
Petrônio Gontijo interpreta Edir Macedo (no detalhe): bispo da Universal investe milhões na própria imagem | Foto: Reprodução/ Roberto Stuckert Filho / PR



Na última quinta-feira do mês de março (29), estreou no Brasil a biografia "Nada a Perder", produzida pela Record Filmes. Desde então, ela lidera a lista das bilheterias do país e já é a maior do cinema nacional em 2018. Apenas na fase de pré-venda, quatro milhões de ingressos foram vendidos, segundo O Globo. O Top 5 diário das bilheterias pode ser acompanhado no perfil no Twitter do site "ComScore" (@cSMoviesBrasil), que "mede de forma precisa audiências, marcas e o comportamento do consumidor em todos os lugares". A liderança é ocupada invariavelmente, desde aquela quinta-feira, pela primeira das duas partes (a segunda está prevista para o ano que vem) da biografia de um bispo: Edir Macedo.

Autorizada e financiada pelo fundador da IURD (Igreja Universal do Reino de Deus) e dono da TV Record, o filme conta a história do "self-made man" (conceito importado dos Estados Unidos para falar sobre um homem que "se fez por conta própria"). A direção é de Alexandre Avancini, também diretor de "Os Dez Mandamentos" (2016), filme baseado na novela da mesma rede de televisão e que ocupa o posto de maior bilheteria do cinema nacional, à frente de "Tropa de Elite 2" (2010), com mais de 11,3 milhões de ingressos vendidos contra cerca de 11,1 milhões do filme dirigido por José Padilha.

Imagem ilustrativa da imagem Robôs põem tudo a perder



Apesar de ter a maior bilheteria nacional, quase sempre há uma nota de rodapé ou um asterisco ao lado dos números de "Os Dez Mandamentos" e ela diz, mais ou menos, que "há relatos de que as salas tinham poltronas vazias, mesmo que todos os ingressos estivessem de fato vendidos". Como isso seria possível? As apurações feitas por diversos jornalistas confirmou o que muitos supunham: a IURD comprou várias entradas (fato que justifica os números gigantes da pré-venda) e distribuiu entre os fieis em seus cultos. Se isso havia acontecido com essa produção da Record Filmes, por que não aconteceria com "Nada a Perder"? Assim como em 2016, foi constatado que as salas com poltronas todas vendidas não estavam lotadas e que ingressos estavam sendo distribuídos a fiéis. Em Londrina, no Cinemark Boulevard Shopping, um dos locais onde o filme está em cartaz, o relato de um dos trabalhadores é que a maioria das salas foi comprada, assim que a pré-venda foi liberada, e que alguns clientes disseram que estavam na praça de alimentação e ingressos foram oferecidos de graça para eles.

O fato novo, neste caso, é que o filme estava, na última quinta-feira (5), com nota 10 no IMDb ("Internet Movie Database" - Base de Dados de Filmes na Internet, em tradução literal), o maior banco de dados de filmes do mundo. O site pertence à Amazon, de Jeff Bezos, o homem mais rico do mundo. Os filmes mais bem avaliados no IMDb são "Um Sonho de Liberdade" (1994) e "O Poderoso Chefão" (1972), ambos com nota 9,2 e mais de um milhão de avaliações. A nota fica por conta da média dos clientes, que podem votar após criarem um simples cadastro. A única coisa que com a qual o IMDb se compromete é apenas divulgar a nota se houver um número "razoável" de avaliações.

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Para alcançar a nota 10, "Nada a Perder" contava com quase 15 mil avaliações perfeitas, o que chamou a atenção dos usuários e do próprio site, como relatou o jornalista Maurício Stycer em seu blog no UOL. "O Poderoso Chefão" e "Um Sonho de Liberdade" têm, dentre suas avaliações, "apenas" cerca de 50% de notas máximas. O que foi descoberto, após denúncias ao IMDb, é que robôs estavam sendo usados para votar e escrever resenhas. Várias delas foram excluídas e, até o fechamento da matéria, a nota do filme era 7,9, mas as avaliações continuam com mais de 80% notas máximas. "Os Dez Mandamentos", ao contrário, tem nota 3,6 (37% notas 10 e 43% notas 1).

Em outros sites, como o "Adoro Cinema", do qual a FOLHA retira avaliações para a programação semanal, a nota está em 4,8 de 5 na parte dos usuários; 1, na da imprensa e 2, na da própria página. 96% das mais de 5 mil avaliações dos visitantes é nota 5. Selecionando as 10 mais recentes, todas feitas nesta quarta-feira (11), a reportagem contou oitos notas 10 e 2 notas 0,5 – o mínimo possível. Assim como a dicotomia utilizada por muitas igrejas, a avaliação do filme vai do céu ao inferno.

*Supervisão: Celia Musilli
Editora da Folha 2