Ranulfo Pedreiro
De Londrina
Após o cruzado, o cruzado novo, cruzeiro, URV e real, qual será a próxima moeda brasileira? Lá nos confins do sertão apostam que se chamará nocaute. Para ter certeza de que tudo vai realmente para a lona. Zé Mulato & Cassiano, autores da teoria, mais que economistas, representam o bom humor de uma música que apanha muito mas não arreda o pé do ringue.
‘‘Navegante das Gerais’’, disco que a dupla está lançando pela Velas, traz elementos que andam escassos na música sertaneja: melodia e criatividade. Considerados ‘‘músicos de raiz’’, Zé Mulato & Cassiano não utilizam guitarras, arranjos country, versões de antigos sucessos e nem sonham com Miami.
Adeptos do formato viola e violão, a dupla passeia por toadas, pagodes-de-viola, cururus, xotes e valseados, mas não se limita ao passado. Há uma orientação espontânea para o humor e também uma variedade temática que vai do romantismo à vida no sertão, passando por questões sociais. Não há rodeios ou carros importados – nem altas cifras –, a ótica é a do pequeno proprietário, arraigado à roça.
O estilo acústico abarca ponteios que dialogam com ritmos tradicionais respaldados pelo violão. É a música sertaneja (ou caipira) distante dos centros urbanos e seus recursos, recuperando, com o afastamento, a personalidade. Não foi à toa que a dupla ganhou direção do violeiro Roberto Corrêa.
‘‘Pensamos em fazer um CD para o lado mais raiz possível da música, que o povo está se distanciando. A gente defende isso porque a nossa escola foi essa. Mas hoje até os cantadores estão vazando para o outro lado’’, comenta Zé Mulato. A dupla foi formada em 1974 e sempre teve dificuldades em chegar ao disco: ‘‘Fomos gravar em 1978, e na raça. Tentaram mudar e derrubar a nossa música, mas não aceitamos’’, revela.
A situação foi ficando complicada e ambos pensavam em aposentadoria – a carreira já dura mais de 20 anos –, quando encontraram o apoio de Pena Branca & Xavantinho. A dupla levou Zé Mulato & Cassiano para a Velas. ‘‘Nós fizemos um show juntos e eles ficaram maravilhados, bem numa época em que já estávamos desistindo. Desde então a coisa foi clareando’’, lembra Zé Mulato.
Com a divulgação do disco, a dupla pretende expandir os shows para a Região Sul. Enquanto isso não ocorre, Zé Mulato comemora o retorno à zona rural, próximo a Brasília, depois de morar um tempo na cidade: ‘‘Estou morando no mato de novo, estou quase na roça’’. A mudança resultou no cururu ‘‘Diário do Caipira’’ (Zé Mulato), que traz o refrão: ‘‘Eu já morei na cidade mas não pude ser feliz/ Voltei a viver no mato onde está minha raiz’’. Lançado pela Velas, ‘‘Navegante das Gerais’’ ganhou distribuição da Universal.Zé Mulato & Cassiano levam a música sertaneja de volta à zona rural em ‘Navegante das Gerais’
Ruy Faquini/DivulgaçãoO estilo direto e acústico de Zé Mulato & Cassiano demonstra maioridade, aos 26 anos de carreira, em ‘‘Navegante das Gerais’’