São Paulo, 10 (AE) - Na semana passada, Benedito Ruy Barbosa, autor da novela das oito da Globo, "Terra Nostra", recebeu um fax de Nova York assinado pelo presidente da Rede Globo, Roberto Irineu Marinho, que elogiava o texto, a fotografia, a direção, enfim, toda a produção da novela. "Você não pode imaginar a emoção de assistir "Terra Nostra" daqui de Nova York", dizia. "Os americanos gostam de tudo e só não elogiam o texto porque não entendem", prosseguia, para resumir: "Parabéns, está tudo lindo".
"Terra Nostra" como quase toda a programação da Globo, pode ser vista nos Estados Unidos pelos assinantes do recém-lançado canal pago TV Globo Internacional. Soaria suspeita a impressão do dono da emissora se os números do ibope não confirmassem que a novela está realmente no rumo certo. A audiência média de "Terra Nostra" tem variado entre 47 e 48 pontos, com picos de até 55 pontos. "É um resultado fantástico", diz o Ruy Barbosa, não por acaso, autor das duas ourtas novelas de maior audiência da década: "O Rei do Gado", com média de 51 pontos e "Renascer", com 59. Pesquisa - "Terra Nostra" aparece como uma das mais caras produções da TV brasileira não é à toa: além dos capítulos iniciais gravados na Inglaterra, ao custo de R$ 1,2 milhão, a emissora mantém pelo menos três equipes de pesquisadores responsáveis pela reconstituição de época: pesquisa de texto, pesquisa de arte e pesquisa de imagens históricas. A história é dividida em três fases, segundo o autor.
A primeira, que está no ar, teve início em 1896 e prosseguirá até a crise de 29; a segunda vai do fim da ditadura Vargas em 1945 até o golpe militar de 64 e a terceira começará na abertura política em meados dos anos 80 e até o ano 2000. A pesquisa de imagens históricas vem sendo feita há seis meses por uma equipe de três profissionais coordenados por Madalena Prado de Mendonça. O diretor Jayme Monjardim tem inserido as imagens entre algumas cenas aproximando o telespectador do tempo em que se passa a trama.
O trabalho de Madalena e sua equipe exige paciência para montar um imenso quabra-cabeças de filmes feitos entre a Europa e os Estados Unidos entre o final do século passado e o início desse século. O cinema tem sido o principal aliado da equipe, já que a história de Benedito tem início quase ao memso tempo que o cinema, 1896 e 1895. Os principais centros pesquisados foram a Cinemateca de Roma, na Itália; Associação Lumire, em Paris; a Biblioteca do Congresso Norte-Americano, em Washington; a British Pathé, em Londres e a Cinemateca Brasileira, em São Paulo.
Até o momento, Madalena comprou os direitos de 80 horas de trechos de filmes raros. Entre eles está toda a série de 85 filmes de 40 a 60 segundos de duração, feitos pelos irmãos Lumire, os pais do cinema. O primeiro da série chama-se "Sortie de lUsine" (Saída da Fábrica), em que os irmãos Lumire colocam a câmera em frente à uma fábrica e acompanham a saída dos funcionários das usinas Lumire. A imagem deve ir ao ar nos próximos dias. Também foram adquiridas imagens de "Lárrive du Train en Gare" (Chegado do Trem à Estação), "Le Deujéner de Bebé" (O Almoço do Bebê).
A aquisição de imagens dos italianos deixando seu país em massa não é tão fácil quanto parece. Alguns filmes foram vetados para a venda, segundo conta Madalena. "Para os italianos, a migração em massa e desesperada é um episódio triste", conta a pesquisadadora. Na Biblioteca do Congresso Americano, por sua vez, os pesquisadores obtiveram imagens dos italianos chegando nos portos dos Estados Unidos. Trata-se de um filme de Thomas Edison, inventor da lâmpada elétrica e que também se interessou pelo cinema no final do século passado. "O filme mostra a má-vontade e a irritação dos guardas americanos com os estrangeiros que chegam". Produção de arte - Num trabalho conjunto, as imagens históricas ajudam na confecção do figurino que, por sua vez, atua em sintonia com a produção de arte. A produção de arte é responsável por toda a montagem dos objetos de época. Tisa de Oliveira costuma dizer que numa casa de novela, fora as quatro paredes, o resto é montado pela produção de arte. Isso inclui móveis, instrumentos musicais, comida, impressão de jornais, confecção de documentos da época e chega ao requinte de descobrir o número exato do bonde que passava pela Avenida Paulista. "As pessoas são muito exigentes e não pode haver falha", diz Tisa, que divide o trabalho com uma equipe de mais quatro pessoas.
Desde março, a equipe de Tisa visitou o Museu da Imigração, em São Paulo, a Biblioteca Nacional, o Arquivo Nacional, o Centro Cultural Banco do Brasil, o Banco Central, a Agência Central dos Correios, o Museu do Trem, o Museu do Telefone e todos os lugares em que se encontrassem mobiliário e documentios usados no final do século 19. "Boa parte dos móveis foi comprada em feiras de antiguidades do Rio, São Paulo e do Sul", conta a pesquisadora. Responsável pela produção de arte das novelas da Globo desde "O Rebu", de 1974, Tisa afirma que esse se tornará o maior trabalho de arte da TV brasileira, considerando que a novela deve estender-se por cerca de 250 capítulos.
A pesquisa de texto está a cargo de ¶ngela Marques. De posse da sinopse da história, ¶ngela levanta os principais fatos históricos e envia diariamente por e-mail ao autor. A novela ainda está no ano de chegada dos imigrantes italianos, 1896, e ¶ngela tem-se dedicado a levantar cenas do cotidiano do brasileiros e imigrantes italianos no final do século passado. Boa parte da pesquisa tem sido feita nos arquivos do Jornao "O Estado de S.Paulo", fundado em 1875. "O Benedito conhece muito bem a histporia do País e serve apenas para pontuar a trama com fatos ocorridos na época", explica ¶ngela.
As pesquisas dão veracidade ao texto de Benedito que, diferentemente dos autores atuais, continua escrevendo sozinho. "Se não for assim, vou incorrer no mesmo erro dos outros autores de escrever uma históoria sem unidade porque cada escritor tem um estilo", diz. E contesta os que compararam sua trama com o filme "Titanic", de James Cameron. "Realmente teve um take do casal (Ana Pauloa Arósio e Thiago Lacerda) na proa do navio", diz. "Mas o restante de "Terra Nostra" não tem nada que ver com "Titanic". Ademais, a novela está longe do naufrágio.