O vazio existencial do francês Michel Houellebecq
Em seu novo romance, “Aniquilar”, o escritor retorna à temática política e à imprevisibilidade da morte
PUBLICAÇÃO
quarta-feira, 18 de janeiro de 2023
Em seu novo romance, “Aniquilar”, o escritor retorna à temática política e à imprevisibilidade da morte
Marcos Losnak/ Especial para a Folha
Em seu novo romance, “Aniquilar”, o escritor francês Michel Houellebecq retorna à temática política. Para narra a trajetória do funcionário público Paul Raison, imagina uma França de 2027 onde os políticos de esquerda estão praticamente extintos.
Bem sucedido profissionalmente, Paul atua como assessor do ministro da economia da França, homem forte do governo que se lança candidato à presidência do país. Devido a acordos políticos, acaba como vice-candidato numa chapa comandada por um humorista apresentador de televisão.
Durante a campanha eleitoral uma série de atentados terroristas abalam o país. Atentados aparentemente aleatórios e desprovidos de sentido, mas que com o tempo revelam um grupo terrorista de caráter místico que pretende instalar o caos utilizando táticas cibernética, militares e deep fakes.
A tarefa de Paul é encontrar os envolvidos, através do serviço de inteligência, escondidos entre ecofascistas, anarcoprimitivistas, lunáticos religiosos, anarcocapitalistas, defensores da “deep ecology” e teóricos da conspiração.
Prestes a completar 50 anos de idade, Paul vive uma crise que envolve tudo a sua volta. Desesperançado, vive um vazio existencial que o empurra para uma melancolia ampla e irrestrita: “Vejo o mundo como um lugar onde não queria estar, mas de onde não tenha pressa de sair, simplesmente porque não conheço nenhum outro. Talvez devesse ser uma árvore ou, melhor ainda, uma tartaruga, algo menos inquieto que um homem, com uma existência menos sujeita a variações.”
Mas sua visão de mundo vai além: “Para Paul, o mundo humano parecia composto de umas bolinhas de m... egoístas, não ligadas entre si, e às vezes essas bolas se agitavam e copulavam à sua maneira, cada qual em seu próprio registro, e passavam a existir novas bolas de m..., essas bem pequenas. Nos últimos anos, é verdade, as bolas de m... copulavam menos, pereciam ter aprendido a se rejeitar, sentiam o fedor mútuo e se afastavam umas das outras com nojo, a extinção da espécie humana parecia possível a médio prazo. Sobrariam outras porcarias como baratas e ursos, mas não dá para consertar tudo de uma vez.”
Vivendo uma crise conjugal, dois acontecimentos levam Paul a olhar a morte de frente. Primeiro seu pai sofre um acidente vascular cerebral e passa a viver vegetativamente numa cama de hospital. Um acontecimento que o leva de volta ao interior do país e reencontrar os irmãos com quem nunca teve um bom relacionamento. Depois descobre que ele próprio possui um câncer bucal em estado avançado e irreversível. Para enfrentar a fatalidade, se refugia na leitura de livros de Arthur Conan Doyle e Agatha Christie.
TRAJETÓRIA
Nascido em 1958, Michel Houellebecq se encaixa naquilo que os franceses chamam na literatura de “enfant terrible”. O sujeito que adora uma provocação e uma polêmica para ser amado e odiado ao mesmo tempo. Um dos principais nomes da literatura francesa contemporânea, é autor de romances como “Particulas Elementares” (Sulina, 2009), “Plataforma” (Record, 2002), “O Mapa e o Território” (Record, 2012) “Plataforma” (Record, 2002) e “Serotonina” (Alfaguara, 2019).
A temática política também está presente em seu romance “Submissão” (Alfaguara, 2015). Na obra Houellebecq imagina uma acirrada disputada eleição presidencial francesa onde o vencedor é um candidato mulçumano moderado. Ao assumir o governo, o novo presidente se revela um totalitarista e passa a promover perseguições e leis ditatoriais. Em pouco tempo o país passa a viver o caos e entra em colapso.
Em “Aniquilar”, Michel Houellebecq apresenta a possibilidade de que, diante da proximidade da morte o medo das pessoas pode germinar o desejo de mudar as coisas. Mas, para o personagem, “para isso precisamos de mentiras maravilhosas”.
Serviço:
"Aniquilar”
Autor – Michel Houellebecq
Editora – Alfagara
Tradução – Ari Roitman
Páginas – 480
Quanto – R$ 99,90 (papel) e R$ 44,90 (e-book)

