O retorno do agente atrapalhado
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quarta-feira, 31 de julho de 2002
Guto Barra<br> Agência Estado
Nova York Tudo começou com a imitação de um sotaque inglês que não saía da cabeça de Mike Myers, em 1995. A voz deu vida ao personagem Austin Powers, que chega a seu terceiro filme quebrando recordes de audiência: foram US$ 71 milhões em apenas três dias de exibição de ''Austin Powers em O Homem do Membro de Ouro'' nos Estados Unidos. A produção, que deve atingir a marca dos US$ 400 milhões de faturamento, também consagra definitivamente o comediante como um dos mais poderosos nomes de Hollywood desde o auge da carreira de Eddie Murphy.
Desde que o primeiro ''Austin Powers'' virou um hit cult nos Estados Unidos em 1997, com um faturamento considerado surpreendentemente bom (US$ 54 milhões), Myers vinha subindo na ''bolsa de valores'' de Hollywood. O humorista que havia transformado um quadro de ''Saturday Night Live'' no hit ''Quanto Mais Idiota Melhor'', conseguiu quintuplicar a arrecadação do segundo filme da série e, de quebra, ajudou o longa-metragem de animação ''Shrek'' a chegar ao Oscar e ameaçar o domínio da Disney no setor.
''Austin Powers em O Homem do Membro de Ouro'' é a celebração de status de primeiro time do cinema. Nos primeiros minutos do filme, Tom Cruise, Gwyneth Paltrow, Kevin Spacey, Danny DeVito, Steven Spielberg e Britney Spears aparecem fazendo pontas como eles mesmos. O esquema de superprodução e a presença de Beyoncé Knowles, do Destiny's Child, servem para mostrar que Myers está em posição única no mercado do cinema americana. Vale lembrar que além de ter criado os personagens da série, ele escreveu os três roteiros e trabalhou como produtor executivo.
Também reforça o poder do humorista a quantidade de merchandising vista na produção: da Motorola à Heineken, passando pelos carros Mini Cooper e a America Online, Austin Powers dá seu aval em doses quase similares a ''Minority Report'', de Steven Spielberg.
Mas talvez o fenômeno mais incrível seja que Austin Powers virou o primeiro fenômeno global da cultura pop mundial saída de uma comédia. Claro, filmes de Eddie Murphy, Steve Martin e Jim Carrey, além de séries como ''Apertem os Cintos, o Piloto Sumiu'', fizeram sucesso em todo o mundo nos anos 80, mas as roupas, as gírias e o comportamento de Austin Powers são reconhecidas em boa parte do mundo civilizado de uma maneira comparável apenas a personagens ou super-heróis ''sérios''. O personagem foi o primeiro a tirar proveito da distribuição maciça de cultura pop via internet e sistemas mundiais de TV por assinatura.
Prova disso é que, apesar das críticas negativas (o ''New York Times'', por exemplo, disse que o filme era ''recheado de altos e baixos''), o filme ainda teve o maior faturamento de toda história para uma comédia, batendo ainda o recorde de uma estréia de qualquer gênero no mês de julho.
O sucesso da série também impressiona quando se analisa a performance de comédias inspiradas em esquetes de ''Saturday Night Live'' (ou artistas saídos do programa) lançadas nos últimos anos. Desde a explosão de ''Quanto Mais Idiota Melhor'', no início dos anos 90, os personagens mais bem-sucedidos do humorístico têm sido levados para a grande e, apesar do esforço de nomes talentosos como Molly Shannon (em ''Superstar'') e Will Ferrel (em ''A Night at the Roxbury'') e da distribuição do programa para o mundo todo via TV por assinatura, não conseguem marcas impressionantes de bilheteria.
''Austin Powers'' também tem o mérito de ter transformado em estrelas um grupo improvável de atores, como Verne Troyer (o Mini-Me), Robert Wagner (o eterno Jonathan Hart da TV, esquecido desde o fim de ''Casal 20'') e Mindy Sterling (a Frau Farbissina).
''O Homem do Membro de Ouro'' pode ter começado a dar sinais de cansaço, afinal, a série Austin Powers é inteira baseada na combinação de diferença de costumes, insinuação sexual constante e escatologia. Ainda assim, o filme é recheado de boas piadas e cenas musicais impagáveis. A produção também acerta novamente nos figurinos e looks de vários personagens, em especial o de Foxxy Cleopatra, a agente black-power de Beyoncé Knowles. A direção de arte também consegue ser melhor do que a maior parte das grandes produções recentes de Hollywood. Resta saber se Myers vai resistir a tentação e manter a palavra de não fazer um quarto filme da série.