Racismo é assunto complexo e repleto de interpretações. Mas nem por isso deve ser varrido para debaixo do tapete. A melhor maneira de resolver o assunto é olhar para ele. Falar dele. Entender suas origens. Refletir sobre ele. Compreender suas implicações. Conversar sobre ele.

Em seu novo livro, “Pequeno Manual Antirracista”, a ativista Djamila Ribeiro afirma ser de suprema importância refletir sobre o racismo existente na sociedade brasileira. Uma reflexão que permita cada um de nós reconhecer preconceitos e discriminações raciais. E mais do que isso, assumir a responsabilidade de mudar o estado das coisas.

Um exemplo da complexidade do racismo está numa pesquisa realizada pela Datafolha que mostrou que 89% dos brasileiros entrevistados admitiam existir preconceito de cor no Brasil, mas 90% se declaravam como não racistas. Dados que demonstram que quase a totalidade dos brasileiros entendem que existe preconceito de cor no país, mas quase ninguém se considera racista. Os dados revelam que, para os brasileiros, os racistas são sempre os outros.

Djamila Ribeiro é uma das principais conferencistas brasileiras sobre a temática de raça e de gênero
Djamila Ribeiro é uma das principais conferencistas brasileiras sobre a temática de raça e de gênero | Foto: Marlos Bakker/Divulgação

Para Djamila Ribeiro, a maioria das pessoas admite que existe racismo no Brasil, mas quase ninguém se assume como racista: “O primeiro impulso de muita gente é recusar enfaticamente a hipótese de ter um comportamento racista e dizer coisas como ‘Claro que não, afinal tenho amigos negros’, ou ‘Como eu seria racista, se empreguei uma pessoa negra?’. A partir do momento em que se compreende o racismo como um sistema que estrutura a sociedade, essas respostas se tornam vazias. É impossível não ser racista tendo sido criado numa sociedade racista. É algo que está em nós e contra o que devemos lutar.”

Lançado pela editora Companhia das Letras, “Pequeno Manual Antirracista” deixa claro que a grande questão não está no racismo individual, na pessoa que possui um pensamento racista dentro de si, afinal a questão não é moral. A questão é estrutural: “O primeiro ponto a entender é que falar sobre racismo no Brasil é, sobretudo, fazer um debate estrutural. É fundamental trazer a perspectiva história e começar pela relação entre escravidão e racismo, mapeando suas consequências. Deve-se pensar como esse sistema vem beneficiando economicamente por toda a história a população branca, ao passo que a negra, tratada como mercadoria, não teve acesso a direitos básicos e à distribuição de riquezas.”

Em seus apontamentos, Djamila Ribeiro aborda como o racismo se manifesta em diferentes lugares e espaços, sejam objetivos ou subjetivos: “Argumenta-se da seguinte forma: ‘Veja só, não somos racistas, temos o Fulano, que é negro, trabalha em tal departamento’. No entanto, pessoas negras não são todas iguais, e Fulano, por melhor que seja, não pode representar todos os negros. Dessa forma, é preciso romper com a estratégia do ‘negro único’: não basta ter uma pessoa negra para considerar que determinado espaço de poder foi ‘dedetizado contra o racismo’. A herança escravista faz com que o mundo do trabalho seja particularmente racista – o que também o torna um dos espaços em que a luta antirracista pode ser mais transformadora.”

Para a autora, até mesmo nas relações afetivas o racismo não pode ser varrido para embaixo do tapete: “É fundamental que as pessoas brancas compreendam os mecanismos pelos quais o racismo opera, pois podem reproduzi-los acreditando estarem inumes por terem um marido, uma esposa ou um filho negros. Estar atento ao que a pessoa negra da família relata é um passo importante. Fala-se muito em empatia, em colocar-se no lugar do outro, mas empatia é uma construção intelectual, ética e política. Ao amar alguém de um grupo minorizado, deve-se entender a condição do outro, para que se possa, de fato, assumir ações para o combate de opressões das quais a pessoa amada é vítima. É uma postura ética: questionar as próprias ações em vez de utilizar a pessoa amada como escudo. A escuta, portanto, é fundamental.”

Autora dos livros “O Que É Lugar de Fala” (Letramento, 2017) e “Quem Tem Medo do Feminismo Negro” (Cia. das Letras, 2018), Djamila Ribeira nasceu em 1980, na cidade de Santos. Colunista do jornal Folha de São Paulo, é uma das principais conferencistas brasileiras sobre a temática de raça e gênero.

.
. | Foto: Divulgação

Serviço:

“Pequeno Manual Antirracista”

Autora – Djamila Ribeiro

Editora – Companhia das Letras

Páginas – 136

Quanto – R$ 24,90