Quando estreou no Loew’s State Theatre de Nova York. em 14 de março de 1972, com filas debaixo de forte nevasca, o diretor Francis Ford Coppola e a Paramount achavam que o drama seria um completo fracasso. Não foi, é claro.

Baseado no romance de sucesso de Mario Puzo, um best seller de mais de nove milhões de cópias, “The Godfather” (Oscar de melhor filme) revitalizou o subgênero da máfia ao transformar o classicismo em algo radicalmente moderno. O historiador Mark Cousins ​​o define em sua influente “História do Cinema” como “um filme de gângster filmado como uma pintura de Rembrandt”, uma mistura perfeita entre as técnicas do passado e as revoluções do presente, além de ser um representante do sentimento de uma época.

O historiador Mark Cousins define o filme em "História do Cinema"  como "uma pintura de Rembrandt"
O historiador Mark Cousins define o filme em "História do Cinema" como "uma pintura de Rembrandt" | Foto: Divulgação

O filme, como a sociedade americana nos anos 1970, não acreditava na ideia de América, nem na infalibilidade da justiça, nem na honestidade dos políticos, nem na irrepreensibilidade dos heróis. Nesse contexto, Coppola ofereceu uma história

sombria para tempos sombrios, e isso lhe custou sangue, suor e lágrimas.

Nova York, EUA, verão, década de 1940. Don Vito Corleone (pelo gênio do então desacreditado Marlon Brando, Oscar da categoria) é o respeitado e temido chefe de uma das cinco famílias mafiosas da cidade. Ele tem quatro filhos: Connie (Talia Shire), o impulsivo Sonny (James Caan), o insistente Fredo (John Cazale) e Michael (Al Pacino), jovem militar que não quer nada parecido com os negócios do pai. Quando Corleone, contra a sugestão do "consigliere" Tom Hagen (Robert Duvall), se recusa a participar do tráfico de drogas, outro chefe de gangue ordena seu assassinato. Começa uma guerra violenta e sangrenta entre as famílias mafiosas.

NO INÍCIO, UM PROJETO DESPREZADO

Custa acreditar, decorridos 50 anos de seu lançamento e amparado historicamente por forte mitologia, que o filme foi de início apenas um projeto que ninguém queria executar. Na aparência, era uma oferta que poderia, e foi rejeitada. E por grandes cineastas da época, Elia Kazan, Costa-Gavras, Richard Brooks, Arthur Penn. Era um best-seller que ninguém queria filmar, material que poderia resultar num filme de gangster que parecia antiquado, sem potencial ou interesse. A miopia da Paramount não ajudava em nada.

O próprio Coppola desconfiava dos resultados, e aceitou porque tinha dividas e sua produtora Zoetrope estava na pior. Aceitou por sobrevivência. Mas... quando assumiu de vez o projeto, o fez de corpo e alma. E se jogou como nunca (quer dizer, se jogaria de novo em “Apocalipse Now”, quase dez anos mais tarde). Precisava, quis e conseguiu mais dinheiro do estúdio, brigou feio por Brando e Pacino e mergulhou fundo no roteiro (Oscar da categoria), que possibilitou explorar todas as conexões entre pais e filhos, os laços familiares, a violência brutal, as relações entre o sonho americano e a ganância capitalista, fortalecendo uma história que se infiltrou no inconsciente coletivo do público, criando a mística em torno da dramática transição de poder entre os Corleone. Era a Nova Hollywood firmando posição.

Marlon Brando como Don Vito Corleone: um de seus papéis mais emblemáticos
Marlon Brando como Don Vito Corleone: um de seus papéis mais emblemáticos | Foto: Divulgação

Os mitos examinam as origens e estabelecem tradições. Por isso deve-se ter poucas dúvidas sobre a existência de uma mitologia sustentada por “O Poderoso Chefão”. Durante as últimas cinco décadas, cinéfilos com os mais variados graus de curiosidade e competência tentaram compreender como o filme criou um momento decisivo na história do cinema. Nossa compulsão em continuar examinando o fenômeno e investigando por que ele é tão convincente, alimenta um status que o coloca em relevo na galeria das grandes obras cinematográficas.

Muito se escreveu para analisar as técnicas de Coppola; elogiar as performances incríveis; recontar os inúmeros conflitos de bastidores; estudar sua influência no gênero gangster, situando a obra em contextos históricos. Muito ainda vai se dedicar ao assunto, na esperança de entender por que ele continua a ter um impacto mais duradouro do que a maioria dos outros filmes. O fascínio de “O Poderoso Chefão” e seu alcance ilimitado enraizaram seu lugar mitológico em nossa cultura e história.

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