São Paulo, 09 (AE) - Reestréia nesta sexta-feira em São Paulo "O Olho Mágico do Amor", primeiro longa-metragem da dupla José Antônio Garcia & Ícaro Martins, originalmente lançado em 1982. Dezessete anos atrás, portanto. É curioso ver, a essa distância, a quase unanimidade crítica, positiva, com que o filme foi recebido. Mais interessante ainda é rever o próprio filme.
A crítica teve razão em festejar a chegada de "O Olho Mágico do Amor". Seu erotismo inteligente parecia uma esperança de vitalidade para o cinema brasileiro, a essa altura já meio estagnado, com o modelo de produção da Embrafilme mostrando que entrava em declínio, como se comprovou a seguir. Chegava, então, com toda força, um novo cinema paulistano, urbano pela própria natureza e origem, debochado, libertário, que propunha um casamento, ou melhor, um affair informal, entre a estética da Boca do Lixo e a ECA. Entre a barra pesada da Rua do Triunfo e a militante Escola de Comunicações e Artes da USP.
O filme trabalha com essa noção-limite entre dois mundos por meio de um achado esperto. Vera (Carla Camurati) é a mocinha de classe média que arranja emprego no escritório de um taxidermista (Sérgio Mamberti), situado em plena Boca, lá naquelas quebradas entre a Rua do Triunfo, Aurora e adjacências. Na ausência do patrão, Vera descobre um buraco na parede, através do qual pode observar o desempenho da operosa prostituta Penélope (Tânia Alves).
Por um lado, a jovem inexperiente, que começa a descobrir o mundo variado da sexualidade. Por outro, a prostituta idealizada, realizadora da fantasia de cada um, agressiva quando necessário, terna, compreensiva a ponto de cobrar "meio ingresso" de estudantes em dificuldades financeiras. O estudante, aliás, é interpretado pelo músico Arrigo Barnabé. Há também um ménage à trois, do qual participam Penélope e mais os músicos Jorge Mautner e Nelson Jacobina. Como se a vanguarda paulistana do começo dos anos 80 tivesse marcado encontro no cubículo da garota de programas.
Como todo filme saído daquela leva, "O Olho Mágico do Amor" também obedece à vocação da auto-referência. É destinado a cinéfilos, capazes, por exemplo, de identificar uma época que se fecha com o desaparecimento de Gláuber Rocha - ouve-se, na TV da família de Vera, a chamada para um Globo Repórter sobre o cineasta baiano, morto na época. Há também o evidente diálogo (crítico e amoroso) com os clichês da pornochanchada.
O erotismo do filme situa-se no limite do hardcore e às vezes torna-se monótono, como ocorre com o gênero que procura mimetizar e, às vezes, parodiar. Assim, ressente-se de certa falta de ritmo interno que às vezes pode cansar o espectador. No entanto, quando se pensa que a criatividade dos diretores entrou em parafuso, eles apresentam uma boa surpresa para o desfecho. Um final lógico, pois se há um tema de fundo em "O Olho Mágico do Amor" é o da busca da personagem pelo mistério da sua sexualidade. Tema inesgotável, afinal de contas. O Olho Mágico do Amor. Drama. Direção de José Antonio Garcia e Ícaro Martins. Com Carla Camurati, Tânia Alves, Arrigo Barnabé. Duração: 95 minutos. Reestréia no Espaço Unibanco 4, às 19 horas. 14 anos