"Tempo": a ideia é que um grupo de hóspedes num resort tropical estão reunidos numa praia remota onde se envelhece de repente, cerca de 50 anos por dia
"Tempo": a ideia é que um grupo de hóspedes num resort tropical estão reunidos numa praia remota onde se envelhece de repente, cerca de 50 anos por dia | Foto: Divulgação
"Tempo": a ideia é que um grupo de hóspedes num resort tropical estão reunidos numa praia remota onde se envelhece de repente, cerca de 50 anos por dia
"Tempo": a ideia é que um grupo de hóspedes num resort tropical estão reunidos numa praia remota onde se envelhece de repente, cerca de 50 anos por dia | Foto: Divulgação

Diante de cada novo filme de Shyamalan, especialmente os mais recentes, é possível concluir que não deve ser fácil estar na pele do diretor dos ótimos “O Sexto Sentido” (1999), “Corpo Fechado” (2000) e “Sinais” (2002). Catapultado à fama internacional e a partir daí com aval de considerável parte da crítica e aprovação do publico, está liberado para fazer o que quiser - foi um dos raros diretores que alcançou o primeiro lugar nas bilheterias por três vezes seguidas.

Mas a partir de 2006, sua filmografia se tornou pantanosa, indo de uma espiritualidade entre o religioso e o ecológico (“A Vila”, “A Dama na Água”, “O Fim dos Tempos” e “Depois da Terra”) ao delírio absoluto (“O Ultimo Mestre do Ar”). Em 2015 pareceu que retornaria às boas origens com “Convidados”, incluindo pela primeira vez a possibilidade do humor. Mas então vieram “Fragmentado” e “Glass”, retomando um cinema solene e vazio, de auto assumida importância. E então chegou a vez deste “Old” (“Tempo” no Brasil, “Velhos” em boa parte do mercado internacional.)

Tratava-se de mais uma vez tentar adivinhar qual das personalidades assumiria seu trabalho mais recente. M. (de Manoj) Night, sobrenome artístico, apelido dado na Universidade de Nova York, onde cursou cinema, Shyamalan , sobrenome de família indiana, é um daqueles cineastas independentes que acha que todas suas ideias (sempre extraordinárias) são ótimas. É artista enamorado de si mesmo, o que significa nada de novo sob o sol.

Imagem ilustrativa da imagem O estranho caso de M. Night Shyamalan

Os traços de seu estilo – climas rarefeitos, enredo entremeado de delates que podem ou não ser resolvidos, personagens diante de situações sobrenaturais inexplicáveis, montagem e sonorização meticulosos, sempre um tour de force final – são mantidos de filme para filme. Ele também conserva a incapacidade de calibrar o tom de suas narrativas e, uma vez surgidos na tela os créditos finais, vem a questão que não quer calar: se, ao invés de seriedade e circunspecção, por que não narrou essa história amalucada de uma forma mais descontraída, muito menos solene, como um daqueles velhos e certeiros filmes classe B (que ele não reconhece como tal), uma espécie de imitação das primeiras temporadas de “Lost”, onde reinava o mistério e não o caos, como doses maiores de fantasia e capricho.

No caso de “Tempo”, ele adaptou uma HQ de um autor francês. Não li, e por isso ignoro como os quadrinhos resolvem a trama. Mas para Shyamalan a premissa vira uma armadilha da qual ele parece não saber como sair. A ideia – muito boa – é que um grupo de hóspedes num resort tropical estão reunidos numa praia remota onde se envelhece de repente, cerca de 50 anos por dia. O que se poderia fazer como este tema ? Uma resposta possível seria uma versão mais fantasiosa e mais populosa de “Náufrago”. Mas o diretor Robert Zemeckis conseguir extrair um grande filme – com a valiosa ajuda de Tom Hanks. Mas aqui um a um os veranistas são vítimas desse “feitiço do tempo”. A temporalidade acelerada gera um acúmulo de situações bizarras que incluem até uma gravidez e um parto, no decorrer das primeiras 24 horas. São tantas as situações que ninguém se pergunta o porquê do que está acontecendo ou não olha pra trás para por o passado em perspectiva, fechando assim qualquer possibilidade de reflexão sobre o tempo.

O filme, repito, tem uma boa premissa, mas Shyamalan joga a ideias ao acaso, não aprofunda e fica devendo consistência, perdido em seus choques intermitentes. Há um terceiro e último ato, que chega como explicação plausível do que ocorreu naquela praia, como uma espécie de denúncia da frieza do pensamento científico. Mas é muito pouco e muito óbvio, e não constitui reflexão satisfatória sobre a inevitabilidade do envelhecimento e da morte. E também não chega a sensibilizar o espectador que ainda sente os efeitos de ter sobrevivido à uma pandemia de tais proporções.

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