Vista de cima, lembra uma cruz gigante, imponente, que ocupa boa parte do quarteirão. Ao entrar por uma das três portas frontais, percebe-se as grandes colunas e o realce que a luz do sol dá aos vitrais coloridos nas laterais. O silêncio do ambiente provoca um pensamento reflexivo e convida os fiéis à oração. Trata-se da Paróquia Nossa Senhora da Paz de Ibiporã, município localizado na Região Metropolitana de Londrina, no norte do Paraná.

Seria estranho dizer que há munícipes que desconhecem a existência do principal cartão-postal da cidade. Ela está na área central, em frente a uma praça e ao lado de um cine teatro. Fácil de achar. Mas poucos sabem da história por trás desse templo religioso que remonta às origens da localidade de, aproximadamente, 52 mil habitantes, segundo o Censo de 2022 do IBGE.

“Conheço e frequento a igreja, mas não sei de alguns aspectos históricos e artísticos”, afirma o universitário Vitor de Campos, de 22 anos.

Paróquia Nossa Senhora da Paz, em Ibiporã: construção que começou em 1951 terminou em 1959
Paróquia Nossa Senhora da Paz, em Ibiporã: construção que começou em 1951 terminou em 1959 | Foto: Guilherme Eduardo/ Divulgação

ALICERCES ROBUSTOS

De acordo com o livro “A paróquia da Terra Bonita” (2023), escrito pela historiadora Ângela de Souza, pelo geógrafo Rodrigo Fernandes e por Maria Rossato, a conhecida “igreja matriz” é mais antiga que a emancipação da cidade (8 de novembro de 1947), já que a primeira capela foi criada no dia 19 de setembro de 1939, nomeada como “Paróquia Imaculada Conceição” em 1943 e era de madeira.

Celebrações já aconteciam no local antes mesmo de edificá-la, por isso, a escolha daquele terreno.

Com uma comunidade católica ativa e animada, decidiu-se, em 1950, levantar uma nova igreja, a que está até hoje. A planta foi idealizada pelo engenheiro Bartolomeu Giovani Bianchi e aprovada pelo bispo Dom Geraldo de Proença Sigaud. A construção começou em 1951 e o entusiasmo das pessoas a acompanhava.

“Arrecadações, quermesses, frango assado, sacas de café e algodão, tudo colaborava [...]. O trabalho pastoral na cidade e na região rural também não paravam”, relata o livro.

Mais do que angariar recursos, eram os próprios pioneiros que botaram as mãos na massa. Os blocos de concreto que dão forma à estrutura, por exemplo, foram feitos por eles. Em um vídeo publicado no YouTube da Secretaria Municipal de Cultura e Turismo, Fernandes conta que algumas das altas colunas chegam a 20 metros de profundidade, alcançando a rocha basáltica.

Na época das obras, os moradores a chamavam de “a igreja que cresce pra baixo”, pois ficavam surpresos com as longas e demoradas perfurações no solo. Reza a lenda, inclusive, que uma caixa com o nome de todos os construtores foi colocada dentro de uma das colunas. “Meu pai ajudou a fazer os bancos de madeira, porque ele trabalhava em uma marcenaria”, complementa Campos.

Diante de tanto envolvimento, fortalecia-se a fé das famílias. “A matriz ia se tornando o grande orgulho da cidade. As atividades religiosas, como batizados, casamentos, comunhões, confissões, encomendações e missas não paravam de crescer”, afirma no exemplar. Anos depois, em 1954, a pequena igreja de madeira, que ficava no lado de dentro da edificação, foi demolida e, em 1959, a nova ficou pronta. E, como o livro cita, assim começaram os tempos áureos da paróquia.

Vale mencionar a mudança de padroeira e a consequente alteração de nome, em 1956. A capela de Ibiporã deixou de pertencer à diocese de Jacarezinho e passou para a de Londrina, recém-formada. Com isso, houve a troca de “Imaculada Conceição” para “Nossa Senhora da Paz”. Atualmente, o terreno ainda conta com escritório e salão paroquial, centro catequético, auditórios, quadra esportiva e estacionamento.

ARTE E RELIGIÃO

Outro aspecto que chama a atenção de visitantes e devotos é a riqueza artística do local. A começar pelo estilo neogótico, segundo o geógrafo, e o formato de cruz, a qual tem o altar no topo e os bancos no percorrer da nave. Para reforçar a denominação, uma imagem de Nossa Senhora da Paz em madeira foi trazida em 1961 pelo bispo Dom Geraldo Fernandes.

Os vitrais vieram da Itália financiados por famílias pioneiras do município, associações e grupos. “Para quem entra na igreja, os vitrais do lado direito demonstram o Antigo Testamento da Bíblia, desde a expulsão de Adão e Eva do paraíso até Moisés com a tábua dos 10 mandamentos. Do lado esquerdo, narrativas do Novo Testamento”, explica Rodrigo.

Os vitrais vieram da Itália, financiados por famílias pioneiras da região
Os vitrais vieram da Itália, financiados por famílias pioneiras da região | Foto: Guilherme Eduardo/ Divulgação

Ele ainda elucida que os vitrais menores, que ficam nas laterais superiores, representam títulos de Nossa Senhora e os que estão abaixo da rosácea, também na parte de cima, os 12 apóstolos. Já a rosácea é constituída pela cabeça de Jesus Cristo no centro e rodeada por símbolos eucarísticos.

Obras do artista Henrique de Aragão (1931-2015) fortalecem o detalhamento do templo. Elaboradas desde a década de 1960, estão entre elas a escultura “Cristo Glorioso” no altar, a pia batismal, os medalhões em concreto de ícones da Eucaristia colocados nas paredes e as pinturas na cúpula.

Pinturas  na cúpula tem símbolos da Eucaristia: para ver melhor é recomendado se deitar num banco ou no chão
Pinturas na cúpula tem símbolos da Eucaristia: para ver melhor é recomendado se deitar num banco ou no chão | Foto: Guilherme Eduardo/ Divulgação

Essas últimas, da mesma forma, fazem referência às figuras eucarísticas, como pão, peixe e o pelicano (animal que, na ausência de comida, abre o próprio peito com o bico e oferece a carne aos filhotes), à Santíssima Trindade e aos livros bíblicos de Ezequiel e do Apocalipse. É recomendado que o visitante se deite em um dos bancos ou no chão para observá-las melhor.

"Cristo Glorioso": escultura de Henrique Aragão faz parte das obras de arte que foram integradas à igreja a partir dos anos 1960
"Cristo Glorioso": escultura de Henrique Aragão faz parte das obras de arte que foram integradas à igreja a partir dos anos 1960 | Foto: Guilherme Eduardo/ Divulgação

Além disso, o altar de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, os lustres, capitéis das colunas, as luminárias, lustres, pinturas de um cacho de café, um galho de algodão (fontes de riqueza da época) e de uma representação da Santíssima Trindade (o Pai, o Filho e o Espírito Santo); a reprodução da Via Sacra (refere-se ao caminho percorrido por Jesus Cristo quando carregava a cruz até a crucificação) em madeira e a presença do cobre em diversos itens, o qual os assemelha à cor dourada e faz alusão ao divino.

A CAMINHO DO CENTENÁRIO

Com 81 anos recém-completados no dia 8 de dezembro, o templo foi e continua sendo palco de inúmeras celebrações. De acordo com o livro apontado nesta reportagem, existem nele cerca de 40 grupos, movimentos e pastorais.

Enquanto acolhe fiéis e visitantes de diferentes lugares, o espaço é testemunha intacta das mudanças em Ibiporã. A tradição católica de frequentá-lo, participar de missas e eventos passa de geração em geração, o que fortifica a história do monumento estabelecido no coração da cidade.

“É uma construção emblemática. Ela expressa parte da identidade dos moradores de Ibiporã e é lembrada com muito carinho pelas famílias pioneiras, tanto as que vieram na década de 1930 para iniciar as derrubadas de mata, recolonização e o plantio de café quanto as que residiam na área central. Tem um destaque importante dos pontos de vista turístico, arquitetônico, artístico, histórico e cultural”, descreve Jaime Káster, jornalista e pesquisador da história local e do norte do Paraná.

Interior da Paróquia Nossa Senhora da Paz, em Ibiporã: templo religioso com valor histórico e cultural
Interior da Paróquia Nossa Senhora da Paz, em Ibiporã: templo religioso com valor histórico e cultural | Foto: Guilherme Eduardo/ Divulgação

SERVIÇO

Missas e visitas

Conforme a paróquia, as missas ocorrem todos os dias da semana. Veja os horários

abaixo. Fora esses, permanece disponível para visitações. Abre às 7h e fecha por

volta das 20h.

● Segunda, terça, quarta e sexta-feira: 19h;

● Quinta-feira:12h (com adoração das 8h às 17h30);

● Sábado: 19h;

● Domingo: 7h, 9h30 e 19h (no terceiro domingo do mês uma missa é

celebrada às 15h para os enfermos).