Memórias de uma Rússia distante
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terça-feira, 13 de junho de 2000
A lista de escritores russos que foram esmagados após os desdobramentos da Revolução Russa de 1917 é enorme. Nesta lista figura o nome de Óssip Mandelstam, um dos poetas de maior popularidade dentro da literatura soviética do século 20.
Óssip Mandelstam (1891-1938) foi um dos primeiro literatos a se engajar na escritura de versos cívicos e otimistas em relação ao sucesso da revolução proletária. Seus sentimentos foram registrados com as seguintes palavras: A revolução de outubro não podia deixar de influenciar o meu trabalho uma vez que me privou da biografia, da sensação de importância pessoal. Eu sou grato por ela ter acabado de uma vez por todas com o bem-estar intelectual e a sobrevivência baseada em renda proveniente da cultura... À semelhança de muitos outros, eu me sinto devedor da revolução, mas lhe ofereço algo de que ela por enquanto está necessitando.
Essa dedicação não foi suficiente para o surgimento de um certo descontentamento com os rumos do regime stalinista. Após um isolamento de todo e qualquer grupo literário, foi preso por ordem do próprio Stalin em 1934 e confinado num presídio de trabalhos forçados na Sibéria, onde acabou falecendo após quatro anos de vida insalubre.
Diz a lenda que sua obra foi preservada apenas pela determinação e coragem de sua esposa. Com os escritos impressos confiscados pelo regime comunista, Nadejda Mandelstam guardou a obra do marido na memória e precisou, após o falecimento de Óssip, levar uma vida nômade, morando pouco tempo em cada local numa na tentativa de fugir da perseguição das polícia soviética.
A obra deixada por Óssip Mandelstam não é extensa. Escreveu não apenas poesia, mas também prosa. Dois desses textos em prosa acabam de ser lançados num único volume pela Editora 34. Traduzido diretamente do russo por Paulo Bezerra, O Rumor do Tempo traz narrativas de cunho memorialístico pontuadas por reflexões sobre cultura e literatura.
Na primeira narrativa, O Rumor do Tempo, que dá título ao livro, o poeta discorre sobre a própria Rússia e os caminhos de sua literatura. Na segunda, Viagem à Armênia, misturando memórias com relato de viagem, escreve sobre o período em que esteve morando na Armênia no início da década de 30. Em ambos os textos, o que chama a atenção é o estilo narrativo.
O curioso é que o leitor brasileiro possui, a partir de agora, a oportunidade de entrar em contato com os relatos memorialísticos de Mandelstam. Por outro lado, se procurar conhecer a produção poética que realmente o consagrou ficará a ver navios são raros os versos de sua autoria publicados no Brasil. (M L.)
O Rumor do Tempo - e Viagem à Armênia de Óssip Mandelstam, Editora 34, tradução e introdução de Paulo Bezerra, 162 páginas, R$ 18,00.