Brasília - O governo Luiz Inácio Lula da Silva prepara a publicação de um decreto que vai estabelecer novas diretrizes para a Lei Rouanet, criada há mais de 30 anos para incentivar a cultura no país e atacada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.

De acordo com a minuta do decreto obtida pela reportagem, o fomento ao setor - que inclui expressamente a Lei Rouanet - passa a ter entre os objetivos ações que promovam a diversidade cultural, a superação do patriarcado e a erradicação de todas as formas de preconceito.

Esse último item volta a constar no texto, após ter sido excluído por decreto editado por Bolsonaro em 2021.

O texto também afirma que os projetos devem se voltar a povos indígenas e garantir a plena liberdade para a expressão artística, intelectual, cultural e religiosa - com a ressalva de que deve ser respeitada a laicidade do Estado.

O decreto será apresentado na próxima quinta-feira (23) em evento organizado pelo Ministério da Cultura no Theatro Municipal do Rio de Janeiro que contará com a presença de Lula e da ministra da pasta, Margareth Menezes.

O texto regulamenta e estabelece regras e procedimentos gerais para todos os mecanismos de fomento cultural, tanto de fomento indireto, por meio de renúncia fiscal, caso da Rouanet; quanto do fomento direto, de repasse de recursos do Ministério da Cultura aos estados e municípios (por exemplo, as leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc).

Os termos que estabelecerão como aspectos da norma serão executados na prática serão divulgados apenas em instrução normativa que o ministério tem que publicar em até 30 dias após o decreto. É ela que regulamentará todos os procedimentos de análise, execução e prestação de contas da Rouanet.

O texto também visa promover uma descentralização dos recursos, concentrados no Sudeste do país - o que, historicamente, é uma das grandes dificuldades da lei. O governo diz que isso permitirá ampliação de investimentos nas regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste.

Uma das formas de se fazer isso seria por meio da nova possibilidade de serem criados editais públicos com recursos da Rouanet, que serão regulamentados. Isso fará com que o ministério atue junto aos patrocinadores, estabelecendo diretrizes e critérios que terão de ser respeitados nos editais.

Segundo relatos, isso permitiria, por exemplo, que a pasta da Cultura estimulasse o aporte a determinadas regiões brasileiras.

O decreto também prevê a retomada da Cnic (Comissão Nacional de Incentivo à Cultura), que avalia se os projetos apresentados na Rouanet estão aptos ou não a captar recursos e que chegou a ser paralisada na gestão Bolsonaro.

A Cnic foi desativada em 2021 na gestão de Mario Frias. Naquele momento, o então secretário responsável pela Rouanet André Porciúncula passou a deliberar sozinho sobre os projetos que poderiam ou não captar recursos.

A comissão voltou a funcionar no começo de 2022, mas sem seu caráter consultivo, operando apenas como um órgão que analisava recursos de quem não foi autorizado a captar via Rouanet.

A composição de quem integra a Cnic também terá mudanças. A partir do novo decreto, será obrigatória a participação de pelo menos um representante dos povos originários e outro de "instituição cultural que atue no combate a discriminações e preconceitos".

Outra determinação da gestão Frias que será anulada é o enfoque dado à arte sacra. Em julho de 2021, o governo assinou portaria que incluía arte sacra entre as áreas atendidas pela Lei Rouanet.

Agora, segundo o decreto, ela deixará de existir. Os segmentos previstos passaram a ser: artes cênicas, artes visuais, audiovisual, humanidades, música e patrimônio cultural.

O decreto também irá restabelecer os planos plurianuais, que permite que projetos podem ser realizados por um período de até quatro anos - algo que havia sido extinto sob Bolsonaro.

Esses planos são voltados a atividades de manutenção de instituições culturais, de espaços culturais e de corpos artísticos estáveis, além de realização de eventos com edições recorrentes, como festivais, mostras, bienais e feiras.