''Cazuza - O Tempo Não Pára'', em lançamento no país, é baseado no livro ''Só as Mães São Felizes'', escrito por Lucinha Araújo, mãe do cantor e compositor. Na tela, quem vive a personagem é Marieta Severo, em interpretação aprovada pela mãe de Cazuza. A ''Folha'', em entrevista exclusiva, conversou com as duas em São Paulo.
Marieta, você disse na coletiva que foi o Cazuza quem te escolheu há muito tempo para interpretar a Lucinha, mãe dele, já que ele achava vocês duas muito parecidas. Como foi, afinal, receber o convite?
Eu sabia que o papel era meu, eu tinha certeza disso, não só pelo que o Cazuza dizia toda vez que me encontrava mas também porque a Lucinha queria que eu fizesse. Foi uma escalação natural. A produção deu várias voltas, o rumo do filme foi para um lado, para outro, mudaram diretores, não sei quantos roteiristas, mas eu tinha certeza que o papel era meu. Era tranquilo. Já o João (Araújo, pai de Cazuza) demorou um pouquinho, ia ser o Antonio Fagundes, mas ele estava com a agenda cheia e quem acabou convidado foi o Reginaldo Faria.
Lucinha, o filme tem como principal fonte o seu livro, ''Só as Mães São Felizes''. Você se refere a ele como um livro de catarse. Você acha que o seu personagem no filme, através da Marieta, mantém essa dimensão catártica?
O livro que eu escrevi é um livro em que eu sou a protagonista, escrito na primeira pessoa, eu contando minha rica convivência com meu filho. O filme não, no filme o protagonista é o Cazuza, então meu papel é secundário, ele tem o papel principal, então mudaram algumas coisas.
Mas isso alterou para pior?
Não, não prejudicou em nada. Tudo o que está no filme foi real, aconteceu mesmo, não tirei nada nem acrescentei nada, aliás procurei não me meter... muito (risos). Ia de vez em quando às filmagens porque, afinal de contas, era a história de nossas vidas e eu queria acompanhar pra ver como é que ia rolar. Mas nunca precisei me meter em nada, apesar das pessoas às vezes pensarem o contrário porque me acham metidíssima. Às vezes assistia a filmagem de uma cena e dava umas dicas, umas bobagens que achava que ajudariam na construção dos personagens.
Você é mineira, Lucinha? Porque a Lucinha que a Marieta interpreta no filme é do tipo supermãe, asfixiante, castradora.
Sou mãe judia, pior que a mineira. O Cazuza me dizia: ''Mãe, a do Ziraldo perde longe pra você''. Mas ele dizia também: ''Amor nunca é demais, quem não é amado fica aleijado pra sempre''. Então ele me deu a maior força, e eu fui em cima mesmo...Mas ele reagia, não deixava que eu sentasse na primeira fila dos shows, viajar de ônibus com os Barões então nem se fala. ''Imagina que vergonha, mãe, roqueiro não tem mãe'', dizia.
Marieta, o que você sabia do Cazuza lá atrás, nos anos 1980?
Minha filha Silvia e minha sobrinha Bebel cruzavam muito na noite com o Cazuza, e eu também, várias vezes, em reuniões, em festas. Era uma figura adorável, muito divertido, o humor dele era uma maravilha, uma língua ferina.
Você e Lucinha fizeram algum tipo de laboratório, alguma preparação mãe para mãe ou algo semelhante?
Não, nada parecido. Pra mim, a minha bíblia foi o livro da Lucinha, lido, relido, todo anotado, marcado, os pontos que me tocavam, que me diziam mais de perto sobre a relação entre os dois, aquilo foi precioso. Eu sou muito mineira, cautelosa, cuidadosa, eu achava que eu ia me encontrar com a Lucinha e que ia ter sempre um certo pudor para ir além. E eu tinha que servir ao personagem com a dimensão que estava no roteiro. O filme tinha a trajetória de um artista a ser contada, um artista importantíssimo pra cultura brasileira, importantíssimo numa época que retrata uma geração vivendo um momento político muito importante.
Parece que a Sociedade Viva Cazuza, entidade que você dirige,Lucinha, vem tendo dificuldades financeiras.
As coisas não andam muito bem, este governo anda complicando o repasse de verbas não só para esta entidade mas em geral. Só há alguns meses recebemos uma pequena parte do repasse a que temos direito, e que pode ajudar centenas de crianças que estamos sempre recebendo, muitas em tratamento bem sucedido. Um recadinho para todos: dez por cento de toda a bilheteria do filme serão destinados à Sociedade Viva Cazuza. Além de o filme ser muito bom, é outro incentivo para uma grande audiência.