Livro de Karen Debértolis traz memórias poéticas de 30 anos
“Para Alguém Escutar no Futuro”, novo livro da autora londrinense, comemora sua trajetória literária
PUBLICAÇÃO
sábado, 29 de março de 2025
“Para Alguém Escutar no Futuro”, novo livro da autora londrinense, comemora sua trajetória literária
Marcos Losnak/ Especial para a Folha

“A minha poesia se faz no cotidiano, nas pequenas coisas que me afetam e me chamam a atenção. No que as pessoas me contam sobre as suas vidas, numa frase durante uma conversa, em uma observação.”
Dessa maneira a poeta londrinense Karen Debértolis define a literatura de seu novo livro, “Para Alguém Escutar no Futuro”. Publicado pela editora Urutau, a obra comemora os 30 anos de literatura da autora. Uma trajetória iniciada em 1995 com seu primeiro livro “Caleidoscópio”.
Uma das principais característica da produção de Karen Debértolis está no diálogo da literatura com outras linguagens como a música, as artes plásticas e as artes cênicas. Um processo de criação que ela designa de “literatura expandida”.
O lançamento de “Para Alguém Escutar no Futuro” acontece neste sábado (29) na Livraria Olga com leitura de poemas por escritoras convidadas. A autora destaca que os textos de seu novo livro foram escritos para serem lidos em voz alta: “São poemas que pedem uma voz que os ilumine”.
A seguir, Karen Debértolis, autora de “Estalagem das Almas” e “Mapas Sutis”, fala sobre sua nova obra, uma memória poética de sua trajetória.
Você indica que os poemas de “Para Alguém Escutar no Futuro” devem ser lidos em voz alta. Por quê?
Porque são poemas em que exploro a sonoridade das palavras, o ritmo, através de rimas internas, e também uma narrativa poética, especialmente nos poemas em prosa. São poemas que pedem para ser escutados, extrapolam a relação da leitura silenciosa, pedem o compartilhamento, pedem uma voz que os ilumine.
O livro é formado por três partes nomeadas de “movimentos”, termo da música clássica para a estrutura de sinfonias. O que esses três movimentos representam?
A ideia de movimento, fazendo alusão à música, refere-se ao fato dos poemas terem um aspecto muito sonoro na sua construção e, por isso, é uma leitura que exige também uma escuta. E também demarcam três momentos temáticos: o devir/existir; a política; e a vida cotidiana. Entre os poemas selecionados para este livro estão alguns que também são canção (como “Insuspeito”, com melodia de Rafael Fuca, gravado por Gisele Almeida no álbum “Conversa de Varanda”) e os poemas que integram o projeto “A Mulher das Palavras”, reunidos na terceira parte do livro, e que há muito tempo os espectadores me questionavam onde poderiam encontrar os poemas impressos.
E o que é o projeto “A Mulher das Palavras”?
É um projeto de poesia e música que surge a partir do meu interesse pelo conceito de poesia expandida e também por outras referências como a Poesia Sonora, a Spoken Word e a Música Nova. É um trabalho coletivo em que, a partir dos poemas, construo composições em colaborações com músicos. Em 2007, convidei o compositor Bruno Morais, londrinense radicado em São Paulo, para produzir comigo um álbum que depois se transformou numa performance poética com banda. Circulei com este trabalho em festivais e eventos de literatura e arte até 2017. Ainda em 2017, algumas faixas do álbum integraram o programa Poesia e Música, da Rádio Documenta 14, da Documenta de Kassel, na Alemanha, importante evento de arte contemporânea do mundo. Naquele ano, os curadores do Brasil para essa programação radiofônica, Janete El Haouli e José Augusto Mannis, me convidaram para participar.

Nos poemas que formam o livro transparecem, como o próprio título indica, versos pontuados de significados para um futuro próximo. Que futuro seria esse?
É um futuro que não pode prescindir de um passado e um presente, não é estanque. Nos poemas percorro o passado e o presente na tentativa de que não esqueçamos as questões que precisam ser refletidas em relação ao que vivemos para olharmos para hoje e para o que desejamos com olhos críticos e de outras perspectivas, especialmente no que diz respeito ao país. Considero que se não descolonizarmos nossos sentidos e não nos ligarmos na “ancestralidade das folhas”, como me refiro no poema “Folhas da Resistência”, a todo conhecimento, também à natureza, o qual nos precedeu e que devemos reverenciar e referenciar. Talvez esse futuro, ou a ideia dele, seja incerto.
Os poemas de “Para Alguém Escutar no Futuro” utilizam elementos do cotidiano imediato. Como o cotidiano entra na poesia?
A minha poesia se faz no cotidiano, nas pequenas coisas que me afetam e me chamam a atenção. No que as pessoas me contam sobre as suas vidas, numa frase durante uma conversa com alguém, numa observação. Considero que não é possível se desvincular do cotidiano quando se produz poesia, porque “a vida ao rés do chão”, como dizia Antonio Candido, é matéria-prima não apenas para a poesia, mas para a literatura em si. O que os poetas fazem é preparar a lente do olhar e abrir os ouvidos para escolher a perspectiva a partir da qual podem abordar determinada questão do cotidiano.
Uma das partes do livro é dedicada a poemas que envolvem temas “políticos”, temática que praticamente não existia em seus livros anteriores. Por que você resolveu abordar essa temática?
A política está presente no nosso cotidiano, a ideia de que viver é um ato político, não é apenas uma frase, mas uma realidade. Então, esses poemas traduzem a perspectiva do meu olhar sobre esse tema da realidade que nos cerca. Os poemas incluídos nessa parte do livro já tinham sido publicados, no todo ou em parte, em revistas literárias ou na internet, e ainda em videopoemas. Assim, como este livro é também, de certa forma, uma memória poética da minha trajetória, decidi incluí-los.
O livro comemora seus 30 anos de literatura, que teve início em 1995 com a publicação de seu primeiro livro, “Caleidoscópio”. Que síntese você faz de sua literatura ao longo dessas três décadas?
Minha produção literária sempre foi marcada por um diálogo a partir da literatura com outras linguagens artísticas. Isso já está presente em Caleidoscópio – livro que reuniu um conjunto de textos e ganhou o prêmio Revelações do jornal Nicolau e evidenciava o aspecto visual daqueles poemas em prosa. Assim, ao longo do tempo, outros trabalhos me aproximaram das artes visuais (parcerias com Fernanda Magalhães e Maíra Bette Mota), da música (como o projeto “A Mulher das Palavras”) e das artes cênicas, através da montagem do livro “A Estalagem das Almas” pelo grupo Noisette, na Bélgica. Alguns dos meus trabalhos recentes me fizeram conquistar, em termos de criação, patamares que refletem minhas pesquisas, estudos e pensamento em relação a uma literatura expandida. Posso destacar o audiopoema “Qual Futuro?”, que integrou a exposição “Imagens Para o Futuro”, no MIS São Paulo e Ceará, e o videopoema “Amazônia”, que expus recentemente no Sesc Cadeião Londrina na sala imersiva.

SERVIÇO:
“Para Alguém Escutar no Futuro”
Autora – Karen Debértolis
Editora – Urutau
Páginas – 80
Quanto – R$ 49,90
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Lançamento:
Quando : sábado (29), às 15h
Onde - Livraria Olga (Rua Pio XII, 313, Londrina)

