Não faz muitos anos, era muito fácil diferenciar uma obra cinematográfica de uma série de televisão. Os propósitos eram diferentes, assim como os meios de produção e seus valores estéticos. Mas com o passar do tempo, até chegar às atuais milionárias plataformas de streaming, essa diferença foi diminuindo. As séries estão cada vez mais parecidas com filmes, com grandes orçamentos e diretores com visão de autor; e os filmes estão cada vez mais fragmentados em sagas e multiversos, por razões comerciais.

É portanto surpreendente que um personagem tão clássico como Kevin Costner tenha optado por apresentar em forma de trilogia cinematográfica (ou tetralogia, ele não decidiu ainda) o que provavelmente concebeu como sua magnum opus “Horizon - Uma Saga Americana”, cujo lançamento disponível para assinantes no canal de streaming Max, para esta sexta sexta-feira (9), teve lançamento adiado para não se sabe quando.

As escolhas daquilo que Costner pretende fazer com esta saga de três ou quatro longas metragens faz com que “Horizon” pareça o projeto de sua vida. A trama gira em torno de diversas histórias na fronteira do oeste americano e busca ser uma espécie de western total. Estamos falando de um melodrama que trata todas as suas facetas com muita gravidade e grande dimensão. Dos vastos planos de paisagens à escalada de

violência em seu roteiro, o filme busca comprimir o “gênero americano por excelência” (rótulo didático, misto de real com mitologia) em vários e extensos segmentos. No entanto, apesar dos esforços louváveis ​​de seu diretor – não se deve esquecer que é de autoria dele um brilhante ensaio de criação artistica chamado “Dança com Lobos” –, “Horizon, pelo menos nesta sua primeira parte, é bastante inconsistente em nível

narrativo. E uma vez que o espectador mergulha nos 181 minutos de filme, logo percebe que a estrutura fílmica funcionaria muito melhor no formato de série.

TRILOGIA


Todas as histórias que se desenvolvem no filme parecem ter sido tiradas de um piloto de série de plataforma. Uma série muito cara e que seria provavelmente boa (nunca saberemos). Mas uma série, afinal. Um cálculo rápido ilustra que três filmes de três horas são perfeitamente exportáveis ​​para uma minissérie; e vendo a construção narrativa, provavelmente teria sido uma boa ideia.

Parece que o ator-produtor quis se distanciar o máximo possível do recente sucesso de “Yellowstone” (a série da Paramount estrelada por ele e que virou mania), e decidiu optar pela tela grande. O resultado desta primeira parte é um amálgama desconexo de histórias do velho Oeste

que precisam e buscam desesperadamente alguma conclusão.

Apesar dos problemas narrativos, o filme é até recreativo, embora sofra de um classicismo extremo. Kevin Costner optou por não correr riscos em sua encenação, e o resultado é um western bem realizado, mas sem maior interesse estético exceto em algumas cenas. A maioria das histórias tende ao melodrama novelesco, e isso pode distanciar um bom numero de espectadores do componente emocional da narrativa.

Dos vastos planos de paisagens à escalada de violência, o filme adiado busca comprimir o  western, “gênero americano por excelência”
Dos vastos planos de paisagens à escalada de violência, o filme adiado busca comprimir o western, “gênero americano por excelência” | Foto: Divulgação

Os cenários de ação, porém, elevam o filme a um patamar superior de produção e são os momentos que melhor funcionam no filme. O ataque da tribo nativa indígena ao assentamento é um exemplo óbvio do talento diretor de Costner, que em muitos momentos se confunde entre tantas narrativas paralelas e perde o ritmo que consegue nos segmentos mais tensos do filme.

“Horizon, uma Saga Americana” é, sem dúvida, um salto no vazio de um autor que sempre fez os (poucos) filmes que escolheu, mas que erra por querer abranger muito e estender-se demais. A honrosa exceção, repito, é “Dança com Lobos”, 1990. Sobre este filme é curioso notar que, quase 35 anos depois, aquele western revisionista ainda parece radical na maneira como reformulou o ponto de vista moral e narrativo do gênero

para os povos nativos americanos – exatamente o contrário diante de um Costner agora tradicionalista em “Horizon”.

Teremos que esperar as parcelas seguintes que ainda faltam para julgar em definitivo o projeto, já que esse início, por muito introdutório que seja, oferece pouca satisfação narrativa ao público. que parece cenário para minisserie de TV Parece que a proposta poderá, até quem sabe, se transformar em um épico, à medida em que a história avançar.

Mas o marketing vai ter que se desdobrar.