A guerra entre a Rússia e a Ucrânia ultrapassa um mês e é acompanhada pelo mundo. Seus reflexos, angústias e acontecimentos estão também no topo dos assuntos discutidos nas escolas. Atenta a essa demanda e alinhada a uma formação holística, a Rede Municipal de Educação de Londrina prepara o curso Literatura Infantil x Guerra - como falar sobre a guerra com as crianças.

O curso para os professores será realizado em três encontros e, de acordo com a Gerente de Ensino Fundamental da Secretaria Municipal de Educação, Adriana Haruyoshi Biason, o objetivo é específico: "Trata-se de uma proposta de discussão com três encontros remotos para abarcar as situações que estão chegando pelas crianças às escolas em relação à Guerra entre a Rússia e a Ucrânia", informa.

A iniciativa, segundo Biason atenda à demanda já existente. Embora seja um assunto delicado para abordar com as crianças, esse trabalho será importante para todos. O conflito que segue ativo traz aspectos ligados às disciplinas de História, Geografia, Cultura, Economia, Geopolítica e permitem estudos tão esclarecedores quanto reflexivos.

Outros colégios de Londrina também estão levando o tema para as salas de aula para explicar os alunos questões de História, geopolítica e também direitos humanos.

Sergio Cavalheiro é professor de História do Colégio Marista Londrina. Leciona para o Ensino Fundamental e explica que a questão central do conflito tem sido a aproximação da Ucrânia à OTAN. "Uma aliança militar do ocidente, que é interpretada como ameaça à Rússia de Vladimir Putin, motivando suas ações. Em entrevista à FOLHA, ele aproxima o assunto das crianças e oferece a elas um punhado de aprendizado.

O que podemos explicar para crianças de até 11 anos sobre como crianças da idade delas estão sendo diretamente afetadas no confronto?

Normalmente pensamos numa guerra apenas envolvendo soldados dos países se enfrentando no campo de batalha. Porém, é comum que ataques aconteçam também nas cidades, atingindo diretamente a população, inclusive casas, empresas, comércio, hospitais e escolas, interrompendo o atendimento médico e as aulas por longos períodos. Pode faltar água e energia, limitação do transporte e o desabastecimento de produtos no comércio, inclusive gêneros alimentícios. Em outras palavras, em situação de guerra, todos são afetados, tanto pessoas quanto animais.

O senhor considera que ter esse tipo de conhecimento promove empatia?

Todos somos influenciados pelo cinema, quando as ações heróicas dos personagens nos inspiram a sermos corajosos e cheios de iniciativa. Contudo, não podemos romantizar uma guerra. Em situações assim, além da extrema violência, impactos sobre a população e a morte de inocentes, não são incomuns denúncias de excessos e desrespeito à dignidade humana, uso de uma força desproporcional e abusos de autoridade, situações que já ocorreram em outros conflitos e que a humanidade não gostaria que voltasse a ocorrer.

O que as crianças brasileiras já podem sentir em sua rotina como reflexo da guerra?

Nas últimas décadas, temos ouvido falar sobre globalização e cada vez mais as distâncias entre os povos estão diminuindo, seja em função das facilidades de termos acesso a produtos que chegam até nós vindo de longe, seja pela facilidade de comunicação proporcionada pela internet. Os países envolvidos têm grande produção agrícola e mineral - seriamente prejudicada pela guerra, impactando no preço de vários produtos, como combustíveis e matérias-primas. Isso pode causar variação de preços, como percebemos nas últimas semanas no valor do combustível por aqui. Também é necessário observar que a Rússia é parceira econômica do Brasil e um embargo econômico ao país em guerra, significa que a economia brasileira sofrerá consequências disso.

Pais, professores e responsáveis devem responder aos filhos sobre o que está acontecendo?

Sempre é importante o diálogo aberto, fortalecendo uma relação de confiança. Evidentemente não seria apropriado apresentar imagens violentas e traumáticas, embora seja importante um olhar atento, considerando a possibilidade de que eles já saibam muito sobre o assunto. Fingir que não está acontecendo não seria uma opção segura. No contexto dessa guerra, o volume de informações tem sido intenso e explicar para as crianças sobre a guerra é demonstrar o quanto é importante valorizarmos o diálogo, a paz e a segurança.

Que lições a guerra já traz para todos?

Ao testemunharmos uma guerra quase em tempo real, podemos refletir sobre a importância de valorizarmos uma cultura de paz e o respeito às diferenças, questões diretamente ligadas a origem desse conflito. Quando tomamos conhecimento dos fatos envolvendo a destruição, o sofrimento de pessoas e animais e os mais terríveis impactos que uma guerra causa, temos a oportunidade de repensar nossas opiniões e certezas. A História nos ensina sobre o passado e nos oferece a oportunidade de refletirmos sobre os erros, para que nunca mais aconteçam.

Um panorama histórico, geográfico e econômico

O também professor de História do Colégio Marista Londrina, Carlos Augusto Portello, leciona para o Ensino Médio e está com o tema na ponta da língua e traz aos leitores da FOLHA um parecer amplo sobre o confronto. Para começar, Portello situa que Rússia e Ucrânia ficam parte na Europa e parte na Ásia. "Lembrando que a Ucrânia fez parte da URSS, que era comandada pela Rússia durante a Guerra Fria, que durou de 1947 a 1991. A Ucrânia possui uma localização privilegiada para a Rússia devido ao porto de Sebastopol, Criméia, onde ficam os navios militares da Rússia", observa.

Numa linha do tempo, explica como a região da Crimeia foi conquistada pelos Rússia de Putin em 2014 - após a retirada do presidente eleito Viktor Yanukovych, por meio de uma revolução, pois Yanukovych era pró-Rússia e como os ucrânianos são de origem eslava e não russos realizaram uma manifestação e retiraram o presidente. "Novas eleições foram convocadas e o ator/comediante Volodymyr Zelensky foi eleito de maneira esmagadora em 2019 com 73% dos votos. Sendo esse a favor da anexação da Ucrânia junto a OTAN".

Sobre os aspectos econômicos, esclarece que a Ucrânia é uma nação rica em milho, soja, minério de ferro e o gás neônio; "Responsável por fabricação de parte dos chips utilizados nas indústrias, além de possuir portos para a exportação destas mercadorias. A Rússia é uma região conhecida por ser uma das maiores produtoras de petróleo, gás natural e fertilizante do planeta. Sabe-se que boa parte dos fertilizantes utilizados no território brasileiro são comprados dos russos", destaca.

OS UCRANIANOS NO PR

Ainda sob uma perspectiva histórica, Portello pontua que os convites para a entrada da Ucrânia na OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), uma organização militar criada em 1949 no início da Guerra Fria, tinha a ver com o conflito entre o bloco capitalista e o bloco socialista, que teve seu término em 1991.

O professor recorda que culturalmente a Ucrânia foi um país dominado pelos czares russos ou pelos imperadores austro-húngaros. "O que levou vários deles a fugirem de seu país para terem mais liberdade. Um símbolo muito marcante da cultura ucraniana são as “pessankas”, ovos inteiros e crus decorados à mão com motivos religiosos. Aqui no Paraná temos a presença da cultura ucraniana em cidades como Curitiba, Prudentópolis e Mallet, entre outas", diz.

Portello sabe que o um assunto é extenso e rende ensino e aprendizado a todos. Comenta também que as várias tentativas de se libertar da influência Rússia, as invasões na Criméia, o apoio da Rússia à separação das auto proclamadas Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk, levam à invasão do território ucraniano. "Isso também devido às fortes tendências do presidente ucraniano a favor do movimento pró-Ocidente", sustenta.

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