GUAÍRA INVESTE NOS BALÉS
PUBLICAÇÃO
terça-feira, 06 de março de 2001
Zeca Corrêa Leite De Curitiba
Está acertado para o Balé Teatro Guaíra um caminho pavimentado com peças contemporâneas inéditas neste 2001. Quatro coreógrafos foram chamados para montar três trabalhos: a dupla Andréa Lerner & Rosana Chamecki, que há anos desenvolve intenso trabalho nos Estados Unidos, com regulares apresentações no Brasil, Ana Vitória e o mineiro Tíndaro Silvano, já conhecido da platéia curitibana pelas montagens feitas ao corpo de baile. A temporada deste ano começa em abril.
A baiana Ana Vitória Silva Freire assina uma coreografia ainda sem título definido, que mostra a diversidade rítmica e que, portanto, se estende aos movimentos, à música, figurinos, cenografia. A trilha sonora foi desenvolvida especialmente pelo compositor Cláudio Dauelsberg.
Fomos buscar inspiração dos ritmos tribais de culturas diferentes em todo mundo, como a japonesa, chinesa, africana, muçulmana, explica Ana. A equipe amarra as diferenças com texturas, como nas artes plásticas. Isso aparece, no palco, com relevos, som de percussão, flexibilidade de expressão, gestual geométrico, além de movimentos de cabeça, ombros, braços e mãos. Dezoito bailarinos nove mulheres e nove homens compõem o elenco.
O segundo bailado, Orikis é uma remontagem da coreógrafa sobre um texto de Pierre Verge, e novamente estará em cena a cultura africana. Ori significa cabeça e a personalidade dos orixás está toda concentrada nessa parte do corpo, esclarece Ana Vitória. Ela escolheu oito bailarinos que, de torsos nus e vestidos com jeans, movimentam-se especialmente com a parte superior do corpo. A proposta é a do equilíbrio com a terra. Os braços permanecem leves, em movimentos abertos; já a pélvis é empurrada para baixo, dando uma tensão pesada. A percussão africana remete sugestivamente aos rituais do candomblé. Isso se deve ao meu olhar baiano, diz.
A música é do sul-africano Manuel Wandji. Sob uma luz âmbar os bailarinos desenvolvem movimentos secos, rápidos, minimalistas. Trabalham muito na linha horizontal, como se tivessem à sua frente um foco preciso. Tanto nesta peça como na anterior, os figurinos e cenários são de Ney Madeira, com iluminação de Milton Gaglio.
Há seis anos morando no Rio, Ana Vitória tem passagens pela França, onde trabalhou com coreógrafos da Nouvelle Danse Française foi aí que deslanchou na carreira solo. Premiada com o Mambembe de 1996, como Melhor Coreógrafa do Ano, e pela Associação Paulista de Críticos de Artes, em 97, ela ainda não tinha trabalhado com o BTG. Por esta experiência posso dizer que é um grupo muito curioso, atento às novas informações, avaliou.
A dupla Chamecki-Lerner está desenvolvendo uma peça que basicamente explora o corpo humano e passa a idéia inicial de caos. Pernas dão ordens aos ombros, que definem os movimentos dos joelhos e assim por diante, conta Andréa Lerner. Os bailarinos dançam limitados por um cubo de metal e tela, criado pela cenógrafa Luciane Lobo. Doze membros da companhia foram escolhidos para a montagem.
A aproximação das coreógrafas com o BTG, devido ao trabalho, possibilitou-lhes maior convivência com o corpo de baile. Tivemos a grata surpresa de conhecer melhor a companhia que se posicionou de forma extremamente profissional, e ao mesmo tempo curiosa com as técnicas introduzidas.
Velho conhecido dos bailarinos, Tíndaro Silvano mostrará ao público neste ano a peça Diptico. Ele conta que díptico eram tábuas duplas que se fechavam como um livro e tinham no seu interior uma camada de cera sobre a qual se escrevia com estilete. A prática era comum na Idade Média.
Silvano inspirou-se nessa imagem para criar seu balé a fusão de dois seres unindo-se e tornando-se um. No início o homem e a mulher Denise Siqueira e Ian Mickiewicz estão mergulhados em seu mundo; aos poucos eles se sentem atraídos, mas aí então vem a gama de sentimentos, como a recusa, o desejo, a concessão, a raiva. Seria o cotidiano, mas no final celebra-se o encontro. O coreógrafo concebeu o quadro imaginando a proposta de dois jovens de uma cidade grande propondo-se à experiência de se transformarem em um só.
Depois de criar para o BTG Viva Rossini, em 1996, e Ao Luar, em 2000, Tíndaro Silvano transforma este Dipticos num gesto de despedida. Ele está de malas prontas para Portugal vai trabalhar na Companhia de Dança Contemporânea de Lisboa, com o diretor e coreógrafo Vasco Wellemkamp. Volta ainda para Curitiba no mês de abril, especialmente para acompanhar a estréia de seu espetáculo, marcado para o dia 25, no Guairão.