Casos de câncer e malformações em fetos estão disparando entre os agricultores franceses. Tudo leva a crer que a causa é um composto químico, a tetrazina, amplamente utilizado como pesticida. Relatórios da OMS alertam sobre os riscos e danos dessa substância, mas os trabalhadores no campo continuam sendo obrigados a usá-la em suas lavouras.

O advogado ambiental Patrick Fameau representa uma cliente cujo companheiro morreu de câncer; mas quando ela perde o julgamento, em desespero comete suicídio. Outra mulher, mãe de família, testemunha como o marido luta para vencer a doença após ser exposto ao agrotóxico.

Os protestos contra a Phytosanis, empresa responsável pelo produto, se multiplicam, mas nada muda. Matthias Rozen, o líder de relações públicas da Phytosanis, manipula todos os relatórios e políticos em cargos importantes para manter seu produto no mercado.


Esta é a síntese de “Golias”, um daqueles filmes desconfortáveis para grandes corporações que já viram sua ética nos negócios colocada na berlinda.

Seu apelo não soa propriamente original – temos filmes como “Dark Waters/ O Preço da Verdade” ou “Erin Brockovich”, que, como este, são inspirados em fatos reais.

É nítida a fragilidade dos cidadãos face às políticas governamentais – esse Golias inacessível – que ignoram os gritos de socorro diante da ambição sem limites das grandes corporações/multincionais produtoras de pesticidas químicos de uso corrente (alimentares, farmacêuticos, de limpeza, domésticos).

“Golias” enfatiza a falta de escrúpulos em mentir, ameaçar, subornar ou usar violência por parte de grandes empresas. Qualquer um pode ser o alvo: cidadãos, advogados, membros do governo, políticos internacionais (a União Europeia parece não estar exatamente do lado do Bem). A corrupção em todos esses níveis é grosseira, impressionante, aterrorizante. Só contam o dinheiro e a ganância.

O diretor Frédéric Tellier e seu coroteirista Simon Moutairou escreveram um filme denso, que segue três fios narrativos e entrelaça em algum momento as diferentes personagens destas tramas para criar uma coesão realista na denúncia da injustiça e da corrupção: uma parte jurídica, outra empresarial e política e, por fim, a parte individual, com os problemas pessoais das vítimas.

Talvez, a história do advogado e a do homem sem escrúpulos da Phytosanis sejam as que cativam pela maior intensidade. Em algum momento o desenvolvimento pode ficar um pouco lento, e pode parecer que esses segmentos sejam menos relevantes para a trama, mas no geral estamos diante um filme sólidamante construído e que funciona bem.

De resto há em “Golias” um sólido trabalho fotográfico e uma precisa direção de atores. Gilles Lellouche (não é filho do mítico Claude Lelouch) brilha como o advogado Fameau, Pierre Niney se dá perigosamente bem como o magnata manipulador Matthias Rozen e Emmanuelle Bercot como a combativa France (o nome da personagem não é por mero acaso). E o falecido (2022) Jacques Perrin, o Toto adulto em “Cinema Paradiso”, se destaca em um papel em seu canto de cisne no cinema.


“Golias” está em exibição no Ouro Verde, em sessões às 16h e 19h30.