A história tende, em alguns momentos, pular mulheres e seus feitos. O realismo mágico no Brasil começou ser datado apenas no começo do século XX, com os contos de Murilo Rubião. Mesmo a cearense Emília Freitas, nascida em Aracati, no interior do Ceará, em 11 de janeiro de 1855 tendo escrito o primeiro livro longo de realismo fantástico ainda no final do século XIX. ‘Rainha do Ignoto’ foi publicado pela primeira vez em 1899. A obra está agora sendo lançada em versão atualizada com assinatura da 106 Clássicos.

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. | Foto: Divulgação

Em um Brasil extremamente patriarcal e conservador as personagens da narrativa se desenvolvem entre mitos, espiritismo e parapsicologia, amarrando uma história de resistência às opressões de gênero e religião - as Paladinas do Nevoeiro formam uma comunidade de alto desenvolvimento tecnológico e sem interferências masculinas. Cada Paladina tem o superpoder da hipnose e com ele conseguem se comunicar com o mundo espiritual para identificar e ajudar mulheres doentes e oprimidas por homens.

Emília mudou-se para Fortaleza após o falecimento do pai para estudar e foi às margens do rio Negro, em Manaus, que ‘Rainha do Ignoto’ foi escrito. Além de uma das escritoras mais importantes de sua época, Emília levava sua escrita libertária para além dos livros e dos textos que publicava no jornal “O Libertador” (1881). A nordestina feminista, ao lado de Francisca Clotilde e Úrsula Garcia, era membra da Sociedade das Cearenses Libertadoras, um coletivo de mulheres abolicionistas que colaboraram com a luta pela liberdade dos negros escravizados no Brasil.

Ignoto é um adjetivo para designar coisas que estão ocultas, como a sociedade secreta das Paladinas. Metaforicamente, pouco se tem conhecimento sobre a Cearense que deu início ao realismo mágico no Brasil, mas assim como as mulheres eram fundamentais umas para as outras no livro, Emília ainda é para a literatura e para a história da emancipação feminina. ‘Rainha do Ignoto’ e quem a escreveu estão em tempo de serem lidos, reconhecidos e valorizados.

* Supervisão: Célia Musilli

Editora da Folha 2