Ranulfo Pedreiro
De Londrina
A tristeza melancólica da morna cabo-verdiana – gênero gravado com frequência por Cesária Évora – dá embasamento para a faixa ‘‘Dindinha’’ (Zeca Baleiro), que abre e denomina o primeiro disco da cantora mineira Ceumar. O CD teve uma produção independente que tropeçou em dificuldades financeiras e na agenda dos colaboradores.
No emaranhado de tempo, gravação, estúdio e dinheiro (ou a falta dele), a vontade da intérprete se impôs apoiada pela produção do amigo Zeca Baleiro. Acústicos, os arranjos guiados pelo violão de Ceumar trazem uma simplicidade criativa que, associada à espontaneidade da interpretação, resulta num disco bom de ouvir. Soa despretensioso, mas está cheio de acertos.
Durante os dez anos que circulou por São Paulo, apresentando-se com o violão, Ceumar aprendeu muita coisa. Soube, por exemplo, balancear as influências mineiras com o toque urbano-tecnológico de São Paulo. Sua personalidade marcou o rumo e, dentro dessa esfera, desviou-se de resquícios regionais. O sotaque mineiro atravessa todo o CD, mas como uma característica maleável à rota imposta pela intérprete. Não é, portanto, um monolito a criar problemas de identidade.
As influências também passaram pelo crivo da cantora. De todas essas peneiradas, restou o equilíbrio. Ceumar é mais MPB que pop, mais mineira que paulista e, principalmente, bem brasileira. O canto é respaldado pela boa dicção, fluxo de som homogêneo e respiração discreta.
‘‘Eu vinha fazendo shows sozinha, depois tive oportunidade de trabalhar com dois violões ao lado de Webster Santos. Posteriormente, chamei um percussionista e um sanfoneiro. Foi um trabalho natural, a gente resolveu bem a sonoridade, é um disco bem acústico’’, comenta a cantora em entrevista por telefone à Folha2.
A experiência com a música paulistana ajudou a configurar o repertório, que traz, além de Zeca Baleiro, Itamar Assumpção, Chico César, Zé Ramalho e até Sinhô. ‘‘São Paulo foi uma descoberta de sonoridades, de música pop, de tecnologia. É uma música muito urbana, mais moderna, vamos dizer assim. Eu sou mineira, mais ligada em harmonia. Aqui eu fiz muitas adaptações, mas não abri mão de uma sonoridade mais rústica’’, explica.
Todo o CD foi elaborado de forma independente. Após as gravações, o projeto foi transferido para a Atração Fonográfica. Com uma ressalva interessante: o disco só está disponível para vendas pela Internet e pelo telefone. Nas lojas deve chegar apenas em abril. O show de lançamento está marcado para os dias 23 e 24 de março em São Paulo. No dia 30 do mesmo mês, Ceumar toca em São Luís do Maranhão.
‘‘Foi um mérito meu e do Zeca, não tivemos medo, fizemos o CD até o final independente, não estávamos no mercado. Foi um alívio, mas também enfrentamos dificuldades de tempo. Pelo menos tivemos liberdade, foi feito sem qualquer compromisso’’, argumenta.
A seleção do repertório ocorreu naturalmente, durante as apresentações. Muitas músicas foram verdadeiros presentes. ‘‘Dindinha’’, que dá título ao CD, foi composta por Zeca Baleiro durante um show em que Ceumar interpretou uma morna de Cesária Évora. A bela ‘‘Galope Rasante’’ foi oferecida por Zé Ramalho, seu autor. ‘‘Maldito Costume’’ (Sinhô), foi sugestão de Zeca Baleiro. ‘‘As Perigosas’’ e ‘‘Rosa Maria’’ foram cedidas pelo compositor, Josias Sobrinho. ‘‘Let it Grow’’, do grupo Renaissance, já fazia parte do repertório da cantora. O disco é vendido a R$ 19,00 no site www.atracao.com.br, ou pelo telefone 0800-136944.