Curitiba - Ele sobreviveu à maldição e está em Curitiba. O ator e cineasta Joshua Leonard, famoso pelo papel que viveu em ''A Bruxa de Blair'' (The Blair Witch Project) vem à Capital para ministrar aulas de direção de atores e um workshop de videoclipes, na Academia Internacional de Cinema de Curitiba, entre os próximos dias 20 e 24.
Só para refrescar a memória, ''A Bruxa de Blair'', com direção de Daniel Myrick e Eduardo Sanchez, foi um fenômeno do cinema independente na década passada. Lançado em 1999, os 88 minutos da película mostram a aventura de três jovens - Heather Donahue, Michael Williams e Joshua Leonard - em busca de esclarecimentos sobre uma bruxa em Burkittsville, uma cidadezinha do interior de Maryland, nos Estados Unidos. Durante a projeção, toda feita a partir de supostos vídeos encontrados na floresta local em 1994, os espectadores acompanham a aterrorizante experiência do trio em torno de uma descoberta fatal.
A produção, que custou US$ 40 mil, foi o primeiro filme a ter uma resposta massiva de promoção via internet, já que muitos dos que foram ver ''A Bruxa de Blair'' nos Estados Unidos, pensavam se tratar de um documentário baseado em fatos reais, todos espalhados pela grande rede virtual. A película chegou com fama de inovadora no restante do mundo e arrecadou nada menos que US$ 300 milhões, um recorde para material de baixo orçamento.
Depois disso, ''A Bruxa de Blair'' teve uma sequência fracassada e nada mais se ouviu falar dos atores e diretores, com exceção de Joshua Leonard, que conseguiu papéis em filmes de grande porte, como ''Homens de Honra'', ao lado de Robert DeNiro, e ''Ao Vivo de Bagdá'', estrelando Lili Taylor e Michael Keaton. Leonard falou com a reportagem da Folha a respeito da bruxa, de suas experiências posteriores e também de sua passagem por Curitiba.

>Você poderia começar falando sobre o início de sua carreira como ator e cineasta.
Era fotógrafo freelancer, quando tinha 17 anos, há 12 anos. Eu fazia fotos de bandas de rock, shows, capas de CDs, coisas do tipo. Meu primeiro trabalho foi para uma escola de cinema em Nova York. Eu não tinha dinheiro e usava a estrutura da escola de cinema também para meus próprios projetos. E depois eu trabalhei para filmes experimentais na Mystic Fire Video, sobre a vida de Alan Ginsberg e Jack Kerouac.

Você gosta da geração beat (grupo de jovens intelectuais norte-americanos que promoveram revolução cultural no período pós-guerra, a partir de meados dos anos 50, com relatos sobre viagens, música e consumo de drogas)?
Eu adoro a geração beat. Acho que é uma dos últimos grandes movimentos artísticos na literatura americana. Daí eu conheci muita gente boa trabalhando nessa época mas não conseguia dinheiro porque os vídeos experimentais você faz porque gosta e não apenas por dinheiro.

Como surgiu a proposta para trabalhar em ''A Bruxa de Blair''?
O projeto precisava de atores que também manuseassem a câmera e partia de um conceito desconstrutivista. O filme não usaria o ponto de vista na terceira pessoa e isso tudo me intrigou. Não porque seria um grande filme, que me daria dinheiro ou que seria um bom filme para minha carreira. Mas porque seria uma idéia e nunca tinha sido feito antes. Liguei para eles e fiz uma entrevista. O que me ajudou foi que atuo desde criança e tinha experiência no manuseio da câmera da época em que estive na escola de cinema.

E como foi a produção do filme, vocês tiveram muitos problemas?
Tentava ser natural, para parecer um documentário. Falávamos besteira, porque todos falam besteira. Foi interessante porque os diretores diziam o que queriam mas não nos dirigiam todos os dias. A gente filmava por conta própria e depois eles olhavam o que tínhamos gravados. Além de filmarmos também tínhamos que improvisar os diálogos. Pássavamos muito tempo na mata, chovia bastante, quando brigávamos, estávamos brigando de verdade. Os diretores queriam nos colocar no limite, pararam de nos alimentar, não estávamos comendo. Foi desconfortável mas era para o bem de algo em que acreditávamos.

Você chegou a imaginar a repercussão que o filme teria?
Não, tivemos sorte. Foi uma anomalia, ninguém faz filmes de US$ 40 mil pensando em arrecadar o que arrecadou. Mas acho que o filme é bom e estávamos no momento certo e no lugar certo.

E o que aconteceu com os diretores e os outros atores depois? Eles sumiram para nós, você foi o único que seguiu uma carreira mais sólida.
Mike (Michael Williams) está ensinando atores, em Nova York, decidiu casar e ter filhos. Heather (Donahue) fez alguns filmes. Os diretores estão tocando seus projetos. Dan (Daniel Myrick) está dirigindo um programa de televisão em que participei e Ed (Eduardo Sanchez) vai fazer um filme sobre alienígenas este ano. Bem, acho que o filme teve um impacto tão grande e não foi algo que esperávamos ou queríamos. Fizemos um pequeno filme com orçamento baixo e colocamos nos cinemas, com uma inovação no cinema independente. Se nesse tempo nós inspiramos as pessoas a tirar suas câmeras e fazerem suas coisas, sem esperar as coisas acontecerem, então acho isso maravilhoso. Mas isso não era nossa intenção. Honestamente, queríamos apenas contar uma história. E o primeiro trabalho, principalmente um de US$ 40 mil e que arrecadou US$ 300 milhões, causa uma pressão para o que você vai fazer em seguida, como acontece com várias bandas. E às vezes é melhor dar um tempo, Hollywood é um mundo ilusório.

Você parece estar envolvido bastante com a música também...
Eu gosto de jazz, punk rock, gosto de Johnny Cash. Gosto dessas novas bandas alternativas, como White Stripes e Modest Mouse.

E os projetos que vieram depois de ''A Bruxa de Blair''?
Não imaginei que depois de passar frio na chuva teria um trailer só para mim nas filmagens de ''Homens de Honra'', ao lado de Robert De Niro e Cuba Gooding Jr. Fiz alguns filmes grandes, como ''Ao Vivo de Bagdá'', para a HBO, mas me dediquei para 15 filmes independentes. O cinema independente é onde meu coração está.

Essa é a razão pela qual está aqui?
Sim, é porque estou aqui. O Steven (Richter) e a Flávia (Rocha) (fundadores da Academia Internacional de Cinema de Curitiba) são grandes amigos, a gente se conheceu em Seattle, quando ainda era fotógrafo e acompanhava as bandas de rock grunge. A academia aqui se preocupa com a técnica e estou por aqui também porque é uma maneira de absorver a energia de quem está começando, para aprender também.

É a sua primeira vez no Brasil?
Sim. A minha primeira impressão foi ter notado que choveu nos primeiros quatro dias desde que cheguei, me senti um pouco culpado de trazer a chuva pra cá (risos). As pessoas que conheci são interessadas, educadas e bastante amáveis. Aqui não existe o ego inflado como nos Estados Unidos. É um país que ainda está aprendendo e procurando pela própria identidade, o que acho muito bom.
E a bruxa de Blair... Você chegou a vê-la, ela existe?
Vocês é que devem decidir.

Serviço:
- As aulas de direção de atores e o workshop de videoclipes, ministradas pelo ator e cineasta Joshua Leonard, acontecem entre os dias 20 e 24 de setembro, na Academia Internacional de Cinema de Curitiba (R. Engenheiro Rebouças, 1607). O projeto tem duração de segunda a quinta, das 10 às 12 horas, e sexta, das 8 às 18 horas. A taxa de inscrição custa R$ 500 e os interessados podem obter mais informações pelo telefone (41) 332-2684 e pelo endereço eletrônico www.aicccinema.com.br, ou pelo e-mail [email protected].