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OPINIÃO 5m de leitura

Entre o encanto e o assombro, um livro de Clarice Lispector no cinema

Em cartaz em Londrina, A Paixão Segundo G.H. era considerado "infilmável", mas o diretor Luis Fernando Carvalho encarou o desafio

ATUALIZAÇÃO
13 de abril de 2024

Celia Musilli
AUTOR

Imagem ilustrativa da imagem Entre o encanto e o assombro, um livro de Clarice Lispector no cinema

A dica preciosa para o final de semana é assistir  ao filme "Paixão  Segundo G.H." que traz para as telas um dos livros mais complexos e inspiradores de Clarice Lispector.
Para quem não  se conforma com diversão  restrita  à música  sertaneja na cidade, ir ao cinema neste sábado pode ser uma "salvação  estética". 
Protagonizado  por Maria Fernanda Cândido no papel  da escultora protagonista  do livro, o filme dirigido por Luiz Fernando Carvalho consegue o que era considerado  uma façanha: transformar em cinema uma obra que traz na literatura a linguagem profunda de um monólogo complexo e lírico que transborda  para pontos de inflexão  filosófica.



Das delícias  aos abismos interiores, o livro que faz da linguagem um sujeito, traz as possibilidades  do "ser" humano,  na acepção  do termo, como herói de uma paixão ou uma via crucis pelo melhor e o pior da existência experimentada  pela personagem. Da arte à angústia, do gozo ao nojo, tudo é  possível no espaço  de um apartamento onde a personagem vislumbra o inferno e o paraíso  de existir e pulsar  com a vida sem limites. A obra também aponta para questões sociais e da condição da mulher.
O romance conhecido pelo passagem crucial e nauseante da personagem "comer uma barata" pode provocar diversas reações, no cinema o espectador é arrebatado pela interpretação de Maria Fernanda Cândido mergulhada no  climax de uma experiência existencialista.

 


A barata ou as baratas do filme foram cuidadosamente selecionadas com a ajuda do Instituto  Butantã, de São  Paulo, que deve ter levado em conta a adaptação da espécie elevada a uma condição artística. 
Comer ou não a barata é o núcleo  de tensão em torno do qual se constrói a ação e o desenrolar do enredo. A encenação do drama transborda  muitas vezes para o teatro, mas é  a composição  cinematográfica que transporta o espectador  para os mundos e fundos da existência, num exercício  de linguagem que é pura beleza ou pavor.
Consta que uma espectadora de São Paulo passou mal ao assistir ao filme a ponto de vomitar. Mas é  preciso dizer que, muito além  da náusea, o filme é  uma revelação  como toda obra de Clarice Lispector que resplandece sob a direção  de Luiz Fernando Carvalho e a interpretação  de Maria Fernanda  Cândido. 
"A Paixão Segundo G.H." está  em cartaz neste sábado (13) no Cine Villa Rica, às 17h15,  e terá mais uma sessão na quarta-feira (17), às 19h.  Pode ser que continue em cartaz - claro que isso também depende do público - mas é  melhor não  se arriscar a perder o assombro que é assistir a  este filme em tempos de fatalidades sertanejas. Trata-se da salvação pelo cinema.

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