Em entrevista à FOLHA, Ariel Palacios fala da face bizarra da América Latina

Os políticos afirmam que “política é coisa séria”, mas a realidade parece dizer completamente o contrário. A prova está em “América Latina Lado B”, livro do jornalista Ariel Palacios que acaba de ser lançado pela editora Globo.

A obra reúne uma coleção de absurdos, bizarrices, desvarios, excentricidades, exorbitâncias, pirações e peculiares perversões de presidentes, ditadores e monarcas da América Latina e Caribe dos últimos 200 anos. Fatos tão “sui generis” que parecem fruto da ficção, não da realidade.

São histórias e despautérios envolvendo líderes políticos da Colômbia, Venezuela, Uruguai, Porto Rico, Guiana, Suriname, Cuba, Chile, Argentina, Paraguai, Peru, Bolívia, Equador, México e República Dominicana, entre outros países da América Hispânica.

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O lançamento do livro acontece nesta sexta-feira (19), na Livraria da Vila do Aurora Shopping (Avenida Ayrton Senna, 400), às 19 horas. Antes, também na sexta, às 8h, o jornalista faz uma palestra sobre o tema Perspectivas Econômicas e Culturais da Relação Brasil X Argentina, no Auditório da ACIL - Associação Comercial e Industrial de Londrina (Edifício Palácio do Comércio, rua Minas Gerais, 297) - às 8h, a convite da ADVB-PR. Os ingressos, gratuitos e limitados, podem ser adquiridos na plataforma Sympla

Um dia antes, na quinta-feira (18), Ariel Palacios também participa de um bate-papo na UEL (Universidade Estadual de Londrina) no CECA (Centro de Educação, Comunicação e Artes), na sala 683, às 18h30.

Residindo em Buenos Aires, Ariel Palacios atua há décadas como correspondente internacional cobrindo os países da América Latina. Atualmente é correspondente da Globo News e da rádio CBN. Na década de 1980 residiu em Londrina onde estudou jornalismo e se tornou torcedor roxo do Tubarão. A seguir Ariel fala sobre “América Latina Lado B”.

No livro você reúne uma coleção de absurdos, bizarrices e excentricidades envolvendo líderes políticos da América Latina. Existe alguma razão para a região gerar governantes assim?

Existem vários fatores que confluem. Um deles é a mania do culto ao líder, da idolatria a certos políticos que vastas multidões consideram que são infalíveis... Ou líderes que as pessoas consideram que são “enviados especiais” do Destino, dos “poderes celestiais” ou de entidades sobrenaturais afins. Eles acham que esses líderes vieram para recuperar “velhas glórias do passado” ou para conseguir “futuros dourados” para suas nações. Em resumo, é o pensamento mágico. É a fé frenética, fanática, de acreditar piamente em qualquer loucura que o líder pronuncie. Mesmo que essas declarações estejam na contramão da lógica ou da realidade. Essa adesão fervorosa das massas turbina os egos – e consequentemente os delírios – desses líderes, que passam a fazer mais bizarrices do que já vinham fazendo. Ou sentem-se seguros em protagonizar casos de corrupção. A América Latina, desde as independências, acumula dois séculos de caudilhos, isto é, o líder forte, que faz o que quer, mesmo que isso implique violar as leis. E em muitos casos as multidões aplaudem as violações que seus líderes cometem. Por que elas próprias também gostam de violar a lei. Os caudilhos são uma herança espanhola que na América Latina floresceram de forma colossal. O livro enfoca os líderes latino-americanos porque cubro esta região há quase três décadas.

Em “América Latina Lado B” você sugere que a realidade geralmente supera a mais imaginativa das ficções no que diz respeito aos líderes políticos da América Latina. Por quê?

A literatura do realismo fantástico ou realismo mágico é um estilo latino-americano que fez sucesso no mundo inteiro. Ele conta com nomes de peso como o colombiano Gabriel García Márquez e o argentino Jorge Luis Borges. O realismo mágico tem elementos absurdos que a maior parte dos personagens considera que são normais! E podermos dizer que presidentes da região, nas últimas décadas, têm superado esses absurdos, a ponto de deixar García Márquez no chinelo. Como quando alguém diz que a Covid-19 é uma gripezinha. Quando outro líder diz que fala com seu antecessor morto por intermédio de um passarinho. Quando outro chefe de Estado sugere trocar o Viagra por carne de leitão! As bizarrices dos líderes latino-americanos eram absurdas no século 19, mas ficaram piores no século 20, e continuam no século 21! No entanto, recordemos a frase de Napoleão Bonaparte: “Na política um absurdo não é um obstáculo”.

A eleição de Javier Milei para presidente da Argentina recentemente seria um exemplo de como líderes bizarros e políticos excêntricos ainda determinam os caminhos da América Latina?

É um excelente exemplo dos líderes bizarros que são aplaudidos por seus seguidores, seja na direita, na esquerda e no centro. E, o mais impressionante, é que essas lideranças populistas e bizarras continuam florescendo, em parte nas redes sociais, onde a seriedade é baixíssima. Ali abundam as fake news, a versão moderna das conversas das comadres do vilarejo, nas quais uma fala algo sobre uma coisa que não viu pessoalmente, a outra repete de forma exagerada, mais uma outra comadre cita a informação com dados adicionais também falsos. E aí temos uma bola de neve informativa que é totalmente falsa. São as mentiras nas quais muitas pessoas querem acreditar porque são funcionais para seus preconceitos, medos ou convicções ideológicas. E, se alguém nas redes sociais diz algo retumbante, muitas pessoas acham que, se é “impressionante”, só pode ser realidade. Isto é, se a realidade é simples, prosaica, sem sal e sem sabor, muitas pessoas não acreditam. Elas preferem acreditar quando a coisa é pirotécnica!

Algumas figuras da política brasileira são tão bizarras e absurdas quanto as figuras de países hispânicos que você apresenta no livro. Por que o Brasil ficou fora de “América Latina Lado B”?

Sim, o Brasil também sempre teve um terreno fértil para as bizarrices. Tanto é que já existe uma obra precedente sobre isso, não no mesmo formato, mas com espírito similar, que é o livro do Stanislaw Ponte Preta, dos anos 1960, o “Febeapá – Festival de Besteiras que Assola o País”. E essas bizarrices foram aumentando com o passar das décadas! Em primeiro lugar, o Brasil merece um livro específico sobre o assunto. E aí, eu diria, essa obra que englobar não só presidentes, mas governadores, senadores e deputados e prefeitos. Mas eu sou especialista na América Hispânica, e não sobre o Brasil.

Apesar de ser uma obra destinada ao leitor adulto, você dedica o livro às crianças da América Latina. Por quê?

Expresso meus profundos desejos de que todas as crianças da América Latina não precisem passar por governos de políticos bizarros, tal como nos últimos 200 anos na região. Isto é, eu ressalto que “expresso meus desejos”. Mas uma coisa é meu desejo e outra são as perspectivas, que não são boas, já que nos últimos anos vimos o ressurgimento em grande estilo de lideranças bizarras, de tom autoritário, que geraram um desatado frenesi em multidões. Não subestimemos a capacidade de birutas reais chegarem ao poder. Em vários países o exame psicotécnico é obrigatório para todos os trabalhadores serem formalmente contratados. Esse exame é também necessário para ter a licença de motorista. Para dirigir um carro é preciso estar bem da cabeça e comprová-lo. Mas, para dirigir um país, infelizmente, não é preciso o exame.

SERVIÇO

“A América Latina Lado B”

Autor – Ariel Palacios

Editora – Globo

Prefácio – Guga Chacra

Posfácio – Nilson Klava

Páginas – 448

Quanto – R$ 64,90 (papel) R$ 44,90 (e-book)

LANÇAMENTO

Quando – Dia 19 (sexta-feira), a partir das 18h

Onde – Livraria da Vila Londrina (Aurora Shopping - Av. Ayrton Senna, 400)