Publicar poetas interessados na experimentação da linguagem. Publicar tradutores que entendem a trabalho de tradução de poesia como ato inventivo, como ato criativo semelhante ao gesto da própria criação poética. Com este objetivo, em 2017, Jardel Dias Cavalcante fundou em Londrina a Galileu Edições, uma editora interessada em publicações artesanais de pequenas tiragens.

Em seus quatro anos de existência, a Galileu publicou a impressionante marca de 90 títulos com criações de autores como Arthur Rimbaud, Sylvia Plath, Charles Baudelaire, W. H. Auden, Stéphane Mallarmé, Gustave Flaubert, Vladimir Maiakóvski, James Joyce e Marianne Moore, entre outros.

Entre os destaques do catálogo da Galileu Edições está o trabalho de tradução do poeta Augusto de Campos que recentemente completou 90 anos. São 16 plaquetes com traduções inéditas de poetas ingleses, italianos, franceses, espanhóis, russos e muito mais.

Entre os títulos lançados recentemente estão “O Cemitério Marinho”, poema de Paul Valéry com tradução de Luíza Mendes Furia, “Haikerouacs”, que traz haikais de Jack Kerouac com tradução de Rodrigo Garcia Lopes, e “Self-Publishers”, ensaio-reportagem de Felipe Melhado.

Professor de História da Arte e Teoria da Arte da Universidade Estadual de Londrina, Jardel Dias Cavalcanti apresenta a Galileu como uma “editora alternativa onde tudo é feito por um homem só”. A seguir Jardel fala sobre a Galileu Edições.

Como surgiu a Galileu Edições? Como você define sua linha editorial?

A Galileu Edições surgiu, antes de tudo, pelo interesse que sempre tive por livros e, particularmente, por poesia. E sempre fui admirador da editora de plaquetes Espectro Editorial, criada pelo Ronald Polito, na qual me inspiro e me fez querer dar continuidade ao mesmo tipo de projeto, após ele decidir suspender suas publicações. Meu interesse é publicar poesia, tradução de poesia, ensaios sobre poesia e, com menos frequência, trabalhos sobre artes plásticas. Editamos também, por isso, a revista “Bunker” de poesia e artes plásticas, que já está no número 3.

Você prefere nomear as publicações da Galileu como plaquetes, não como livros. Que diferença você estabelece entre livro e plaquete?

Não é que eu prefira. A plaquete é a definição para um livro de 30 ou 40 páginas mais ou menos. Gosto do formato pelo seu aspecto artesanal, que possibilita uma certa liberdade de experimentação gráfica e uma produção em pequena escala, como edições de 30 ou 50 exemplares, e com preço mais acessível.

Mesmo sendo uma editora de pequenas tiragens artesanais, a Galileu publica grandes nomes da literatura universal, autores empenhados na invenção da linguagem. Por que a escolha desses poetas e escritores?

Sem dúvida, existe uma opção por publicar poetas e tradutores preocupados com a questão de experimentação da linguagem e que entendem a tradução como um ato criativo, inventivo, talvez até próximo da criação poética. Nesse sentido, as reflexões de Augusto de Campos e Haroldo de Campos sobre tradução me interessam.

Nas últimas décadas as traduções literárias, especialmente a tradução de poesia, conquistaram um interesse especial na literatura brasileira, algo que era pouco comum no passado. Por que você acha que este interesse ganhou destaque?

Quando entrevistei Augusto de Campos eu perguntei porque ele publicava mais tradução do que seus próprios poemas e ele respondeu dizendo que o que o interessava era o fato poético em si e que a tradução era uma aproximação com a poesia tão importante como a sua leitura. O Haroldo de Campos me disse, também em uma entrevista, que considerava a tradução a forma mais importante de aproximação com a poesia, pois seria uma maneira de perscrutar o funcionamento de sua estrutura poética. Talvez a nova geração esteja entendendo assim a questão da tradução de poesia.

Você publicou 16 títulos com trabalhos de tradução de Augusto de Campos. Qual seu interesse na obra de Augusto de Campos?

O convite para que Augusto de Campos publicasse na Galileu Edições partiu de mim. Ele aceitou, depois que lhe enviei plaquete de uma tradução que fiz de um ensaio de Glenn Gould sobre Anton Webern. O formato da plaquete o agradou e começamos a publicar suas novas traduções, que incluem versões dos poetas Sylvia Plath, Arthur Rimbaud, Marianne Moore, dentre outros, e conjunto de poetas russos, ingleses, espanhóis, etc. Claro que o convite que fiz ao poeta está relacionado à profunda admiração que tenho pelo trabalho poético e de tradução dos irmãos Campos.

O que Augusto de Campos está produzindo atualmente?

Pelas suas publicações atuais pode-se perceber que Augusto tem se dedicado sistematicamente à tradução de poetas de variadas nacionalidades (como ingleses, espanhóis, franceses, russos, etc.) e de épocas variadas (como antigos latinos, barrocos, renascentistas e modernistas). Também estou reeditando dois ensaios dele sobre poesia. E algumas editoras estão reeditando suas obras fora de catálogo. Ainda tem havido interesse de editoras estrangeiras pela tradução e publicação de sua obra, o que deve estar dando muito trabalho e cansaço ao poeta de 90 anos.

Jardel Dias Cavalcanti: Jardel Dias Cavalcanti: "Em 'Self-Publishers', ensaio-reportagem de Felipe Melhado, é feito um levantamento da atividade de um grupo de jovens criadores ligados às preocupações poéticas e gráficas em Londrina"
Jardel Dias Cavalcanti: Jardel Dias Cavalcanti: "Em 'Self-Publishers', ensaio-reportagem de Felipe Melhado, é feito um levantamento da atividade de um grupo de jovens criadores ligados às preocupações poéticas e gráficas em Londrina" | Foto: Divulgação

Entre os novos lançamentos da Galileu está “Self-Publishers”, um ensaio-reportagem de Felipe Melhado sobre a geração de poetas florescida em Londrina na década de 1980. Qual leitura você realiza dessa geração?

Creio que esta publicação é especial, primeiro por fazer um levantamento da atividade de um grupo de jovens criadores ligados às preocupações poéticas e gráficas em Londrina; depois porque a importância deles está ligada ao fato de que eram pessoas antenadas com o que se produzia de mais avançado nessas áreas; estes jovens se desenvolveram atividades importantes na área de tradução, produção editorial (vide a revista Coyote), e poesia, como o caso, para citar apenas dois exemplos, de Rodrigo Garcia Lopes e Ademir Assunção.

Quais publicações da Galileu devem sair em breve?

Há uma nova plaquete do Augusto de Campos, especificamente um ensaio. A tradutora Simone Homem de Melo me prometeu algumas traduções de Paul Celan e estou ampliando minha plaquete de tradução de poetas pop alemães para publicar novos poetas dessa geração. Há propostas de tradução de poesia francesa, incluindo a tradução por Rodrigo Garcia Lopes dos poemas de Rimbaud anteriores a “Uma Temporada no Inferno”

Serviço:

Onde encontrar – As publicações da Galileu Edições podem ser adquiridas pelo e-mail: galileuediçõ[email protected]. Ou pelo site da Livraria Scriptum: www.livrariascriptum.com.br