Você escolhe um livro na estante, senta em um lugar confortável e com boa iluminação, coloca a xícara de chá ao lado, lê o título, abre o livro e então um mundo totalmente novo se apresenta naquelas páginas.

Parte do acervo da Boblioteca Casa do Povo, em São Paulo
Parte do acervo da Boblioteca Casa do Povo, em São Paulo | Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Pode ser um romance noir, uma aventura ou fantasia, pode ser uma realidade semelhante ou um mundo distópico e completamente diferente. Seja qual for o gênero literário, o importante é ler.

Neste sábado (07) é comemorado o Dia do Leitor, que busca difundir e estimular o hábito da leitura entre os brasileiros.

O que dizem os especialistas

De acordo com a última pesquisa realizada pela Retratos da Leitura no Brasil, a média de leitura do brasileiro está abaixo dos cinco livros por ano. Além disso, dentre esse número, algumas das leituras não chegam a ser finalizadas.

Para o neurologista Rogério Pistori, o hábito de ler deve ser visto como um entretenimento, assim como o celular e o computador. Segundo ele, quando uma pessoa lê um livro que gosta, ela pode atingir o estado de flow, em que fica totalmente envolta pela leitura e com a concentração e atenção voltadas para aquela ação.

Pistori explica que a leitura também faz com que as conexões cerebrais aumentem por meio das sinapses, elevando a chamada reserva cerebral. “É como se fosse uma reserva contra possíveis danos cerebrais, como o Alzheimer, que é o tipo mais comum de demência”, lembra

Pessoas que lêem frequentemente têm menos chances de desenvolverem problemas neurológicos, afirma o médico. “O cérebro é como um músculo, então quanto mais você pratica, mais você consegue melhorar o desempenho e a força dele”, ressalta.

Segundo o especialista, a leitura também auxilia no controle das emoções, diminuindo o estresse e a irritabilidade. Pistori destaca que algumas habilidades, como a criatividade, estão ligadas à leitura. De acordo com ele, quanto mais assuntos diferentes uma pessoa passa a dominar por meio da leitura, mais conexões vão existir e, a partir daí, a criatividade se desenvolve.

O neurologista também esclarece que toda a leitura é válida, mas é importante que o leitor busque primeiro por assuntos de interesse, que vão fazer com que ele fique mais motivado e veja a leitura como parte da rotina.

“Mais importante do que o tempo que você passa lendo ou o quanto lê, é ter uma leitura de qualidade. É essencial olhar a capa do livro, ler o título, o resumo, sumário, todos esses detalhes antes de começar, de fato, a ler o conteúdo do livro”, aconselha.

Também de acordo com Pistori, outra técnica que o leitor pode adotar é fazer a leitura mais lenta de um trecho importante do livro, anotar, riscar e ler de novo, já que isso ajuda a melhorar a interpretação e o entendimento sobre o livro. “Leitura é prática. Quanto mais você lê, mais você aprende a ler”, frisa.

Com a popularização dos e-books, Rogério Pistori destaca que o leitor tende a se distrair e se estressar com mais facilidade com esse formato de leitura. “Eu falo por experiência própria, quando estou lendo no computador, eu percebo que fico mais estressado. Então, se possível, o ideal é que a leitura seja feita com livros físicos e que o celular, por exemplo, fique bem longe”, finaliza.

Uma amante dos livros

Letícia Bruno Dos Santos, 23 anos, é estudante de psicologia na (UEL) Universidade Estadual de Londrina e teve o primeiro contato com os livros ainda na infância. Ela conta que o pai costumava ler para ela e para o irmão todas as noites antes de irem dormir. “A gente tinha alguns livros, mas ele também imprimia outras histórias que achava na internet. Era muito legal”, relembra.

Letícia Bruno Dos Santos
Letícia Bruno Dos Santos | Foto: Arquivo pessoal

Com quatro anos, a estudante teve o primeiro contato com a leitura de forma independente. “Meu pai comprou um livro chamado ‘A Ema de Sorte’, que era bem infantil, com pouco texto e muita imagem. Eu pedia para ele ler quase todas as noites, até que ele começou a me ensinar a ler e a escrever algumas letras”, explica.

Quando entrou na escola, ela se destacou entre os colegas por já saber ler e escrever palavras e frases básicas. Com o tempo, a estudante foi avançando para leituras mais desafiadoras, como os livros "Quando Meu Pai Perdeu o Emprego"’ e ‘"Harry Potter e a Pedra Filosofal". “Fui lendo cada vez mais rápido, livros mais difíceis e não parei desde então”, conta.

Hoje, a estante exibe mais de mais de 100 livros, dos mais variados gêneros, tamanhos e histórias. “Eu gosto muito de mangás também, que são aquelas histórias em quadrinho japonesas”, afirma. Dos Santos conta que não tem um gênero preferido, mas tem uma afinidade com a fantasia mais madura, que foge da literatura infanto-juvenil.

Dentre os livros preferidos, destaca o italiano ‘A Solidão dos Números Primos' e a trilogia estadunidense ‘Métrica’. Por conta da rotina corrida, Letícia Bruno Dos Santos lê com menos frequência do que antes, mas não abandonou e nem planeja abandonar o hábito. “Tem mês que eu leio todo dia, mas daí fico outros dois sem conseguir terminar um livro. Só que eu nunca deixei a leitura de lado, tento sempre ler um capítulo ou algumas páginas todos os dias”, conta.

A estudante de psicologia afirma gostar da sensação de ter o livro físico nas mãos, mas com o preço dos exemplares subindo, optou por investir em um aparelho exclusivamente voltado à leitura. “É muito prático, você consegue levar para todo lado e dá pra fazer marcações, que é algo que eu não consigo fazer nos livros físicos”, admite.

Real Gabinete Português de Leitura, no centro do Rio de Janeiro, uma das bibliotecas mais bonitas do mundo
Real Gabinete Português de Leitura, no centro do Rio de Janeiro, uma das bibliotecas mais bonitas do mundo | Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Para ela, ler é um exercício de criatividade e de imaginação. “A infinidade de mundos, de histórias, de personagens e personalidades que a gente encontra quando lê é incrível. Ler é deixar a cabeça e a mente fluírem”, finaliza.

Como fazer a leitura virar um hábito

Como no exemplo de Letícia, que teve o pai como principal fonte de inspiração e incentivo para entrar no mundo da leitura, Fernanda Passarelli, psicopedagoga com especialização em neurociência, garante que os pais têm papel fundamental em transformar a leitura em um hábito para as crianças. Segundo ela, a leitura deve ser incentivada de um jeito prazeroso e divertido.

“A leitura pode e deve ser dividida e compartilhada entre pais e filhos”, explica. Como dica, a psicopedagoga cita que os pais podem inserir na rotina um momento de leitura, com conteúdos que sejam coerentes com a idade da criança. “Se a criança não sabe ler, ela pode ser estimulada a olhar as imagens enquanto os pais fazem a leitura. Eles devem perguntar sobre detalhes das imagens, levantar questões do tipo: ‘o que será que vem depois?’ ou ‘o que você acha que vai acontecer com o personagem?’”, explica.

Mas ela faz uma ressalva: “Não é coerente que o pai ou a mãe diga para a criança ler se ela nunca viu eles fazendo isso. Os pais são espelhos para as crianças”. De acordo com Fernanda Passarelli, como benefício direto desse hábito está a melhora no desempenho escolar, já que a leitura pode fazer com que a criança fique mais atenta, focada, seja mais criativa e com um vocabulário mais rico.

Para os bebês, os livros devem ser coloridos, com imagens, sons e texturas diferentes. “Ela descobre o mundo pelos sentidos e quanto mais novinha é a criança, mais ela vai explorar”, destaca. Já para os adolescentes, ela sugere que os pais questionem o gênero literário que eles mais gostam. “Busquem em livrarias ou sebos e façam, também, uma leitura compartilhada. Não importa a velocidade da leitura, o importante é curtir o momento em família”, finaliza.

Viajar sem sair de casa

Maria Luiza Perez é bibliotecária há 40 anos e é fascinada pelos livros e pelo ato de ler. Para ela, a leitura é algo normal. “Eu leio tudo que aparece na minha frente, é algo muito automático”, afirma.

Maria Luiza Perez
Maria Luiza Perez | Foto: Arquivo pessoal

Segundo a bibliotecária, uma das inúmeras vantagens da leitura é a melhora no raciocínio, vocabulário e na capacidade de interpretação. “Uma pessoa que cultiva esse hábito tende a ter mais criatividade e imaginação e a conseguir se comunicar com mais facilidade”, destaca.

Perez admite que gosta da sensação de viajar para diferentes países e culturas sem sair de casa. Mas, além dos livros, costuma ler comentários de pessoas sobre determinadas obras. “Às vezes a gente não teve a oportunidade de ler um livro ainda e acaba aprendendo muito com os comentários de outras pessoas. São interpretações e visões diferentes que nos ajudam a entender a história”, afirma.

Com anos de experiência em bibliotecas, Maria Luiza Perez selecionou alguns livros que todo mundo deveria ler em algum momento da vida. São obras de vários gêneros e para vários perfis de leitores.

Confira as sugestões a seguir:

Menina Bonita do Laço de Fita

Autora: Ana Maria Machado

Preço: R$ 49,90

A autora apresenta com delicadeza e sutileza uma menininha negra, com olhos de azeitona e cabelos de noite, que encanta os leitores e um coelho branco, que não se cansa de perguntar qual o segredo para ela ser tão pretinha. Entre respostas engraçadas da menina, o coelho logo entende que a cor vem da genética.

O livro aproveita a tradição oral, numa fala coloquial e familiar, para homenagear a beleza negra. É um ótimo momento para conversar com as crianças sobre racismo e preconceito.

O Pequeno Príncipe

Autor: Antoine de Saint-Exupéry

Preço: R$ 17,80

O livro é, ao mesmo tempo, uma fábula e uma parábola. A criação de Antoine é atemporal e atinge todas as faixas etárias. Nessa clássica história, um piloto cai com seu avião no deserto do Saara e encontra um pequeno príncipe, que o leva a uma jornada filosófica e poética através de planetas e, por trás de cada diálogo existem enormes lições de vida.

A Menina que Roubava Livros

Autor: Markus Zusak

Preço: R$ 36,99

Considerado um novo clássico, o livro aborda com realismo a vida vivida pelos alemães durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). O livro conta a história da menina Liesel, que encontra conforto no mundo dos livros em meio a uma Alemanha nazista.

É uma história comovente, que mostra a maldade, a bondade, a crueldade e a coragem do ser humano.

Quarto de Despejo: diário de uma favelada

Autora: Carolina Maria de Jesus

Preço: R$ 47,15

O diário da catadora de papel Carolina Maria de Jesus deu origem a este livro, que relata o cotidiano triste e cruel da vida na favela. A autora morou com os três filhos na comunidade do Canindé, em São Paulo.

Carolina te prende com seu relato visceral e sensível das dificuldades da vida. Tudo isso é escrito com muita verdade e poesia.

O Castelo, A Metamorfose e O Processo

Autor: Franz Kafka

Preço: R$ 45,43

Franz Kafka, por seus escritos, muitos dos quais incompletos e publicados principalmente após a sua morte, é considerado um dos autores mais influentes da literatura ocidental e um dos maiores escritores de ficção do século XX. Os leitores precisam conhecer esses três títulos em que Kafka parece usar absurdos narrativos para denunciar a desumanização do homem frente à sociedade.

Comer, Rezar, Amar

Autora: Elizabeth Gilbert

Preço: R$ 29,90

Esse é um livro que todas as mulheres precisam ler e repassar a outras mulheres. O livro é um relato da jornalista Elizabeth Gilbert, que passou por três países (Itália, Índia e Indonésia) em um ano. Ela conta as percepções e experiências que teve nesse período, conhecendo culturas e pessoas diferentes. A escrita da autora é leve e, ao mesmo tempo, profunda, levando a muitas reflexões.