Clássicos do terror marcam final do festival de cinema em Buenos Aires
Diversas exibições de clássicos em versões restauradas, como "A Noite do Demônio", foram exibidas ao público
PUBLICAÇÃO
quinta-feira, 27 de abril de 2023
Diversas exibições de clássicos em versões restauradas, como "A Noite do Demônio", foram exibidas ao público
João Vitor Moreno - Especial para a FOLHA

Os últimos dias do festival BAFICI (Buenos Aires Festival Internacional de Cinema Independente) foram marcados por diversas exibições de clássicos em versões restauradas. Um deles foi "A Noite do Demônio" (Night of the Demon, Jacques Tourneur, 1957), em cópia remasterizada pelo BFI (British Film Institute).

Mesmo tendo sido feito nos anos 50 e com diversos efeitos especiais, o filme envelheceu muito bem e continua um suspense de primeira com muita tensão. Isso porque o diretor Jacques Tourneur (de clássicos como "Sangue de Pantera" e "Fuga do Passado") dribla as dificuldades técnicas usando truques como fumaça e a fragmentação da montagem, que mostra apenas trechos curtos das aparições sobrenaturais intercaladas com os personagens “reais”.
O roteiro é muito hábil ao fazer algo semelhante ao que "O Exorcista" (William Friedkin, 1973) faria anos depois: trazer personagens céticos para uma trama sobrenatural, figuras que não aceitam naturalmente os eventos estranhos que começam a acontecer, o que faz com que a tensão seja muito maior, como se a encarnação do mal forçasse sua entrada naquele universo.
O desfecho é memorável por amarrar todas as pontas soltas e ter uma ótima sequência de perseguição em uma linha de trem. Mesmo com mais de 60 anos, "A Noite do Demônio" continua uma experiência envolvente e inquietante.
OUTROS DESTAQUES
Outros clássicos do terror britânico que tiveram exibições no festival foram "Os Inocentes" (Jack Clayton, 1961), "A Górgona" (Terence Fisher, 1964) e "O Sangue de Drácula" (Peter Sasdy, 1970).
Mais um exemplo de superação das limitações técnicas pode ser visto no lançamento japonês "Scary Friend", de Takara Mineo e Naohiro Takahashi, também presente no festival e que conta a história de um encontro entre um serial killer e uma menina que vive com animais de pelúcia falantes.

O filme tem um senso de humor bem particular ao mesmo tempo em que tem um subtexto de filme de terror que se revela aos poucos. Embora fique um pouco a impressão de um exercício de gênero descompromissado, o filme nunca é prejudicado pelo baixo orçamento que se reflete no elenco e locações mínimas, já que os diretores são bem criativos nos efeitos práticos e possuem uma preocupação especial com sua protagonista.
A fotografia deixa bem claro seu aspecto digital de câmera amadora, mas nada que atrapalhe o bom uso de cores e elementos cênicos cheios de personalidade.

A produção tcheca "Good Old Czechs", de Tomáš Bojar, é outro filme que explora ao máximo seu potencial, já que é composto apenas de imagens de arquivo da Segunda Guerra. Uma narração em off e alguns efeitos sonoros são adicionados e o que se cria é uma narrativa bem sólida sobre dois pilotos voluntários que lutaram contra a dominação nazista na antiga Checoslováquia.

Luta contra os nazistas volta a ser tema central em "Sisu", filme finlandês dirigido por Jalmari Helander que não tem nenhum medo dos exageros, tanto visuais quanto sonoros. O roteiro parece imaginar o que aconteceria se John Wick fosse finlandês e tivesse participado da Segunda Guerra, ao acompanhar um garimpeiro que tenta evitar que seu carregamento de ouro possa ser apreendido pelos soldados alemães, deixando um rastro de sangue pelo caminho.
Dividido em capítulos e com muita trilha sonora, o filme deixa clara sua influência de Quentin Tarantino, mas a premissa simples de um homem indestrutível que mata todos no seu caminho dialoga mais com produções recentes como John Wick. Certamente não agradará a todos, mas para quem gosta do estilo é um prato cheio.

Por último, destaco também dois títulos: a boa animação "Blind Willow", Sleeping Woman, de Pierre Földes, coprodução entre Canadá, França, Hungria, Luxemburgo e Holanda, que mesmo tendo dificuldades de saber qual história quer contar, é bem imaginativo na recriação de um Japão destruído pelo tsunami de 2011 e mistura elementos de drama e fantasia em um universo bem particular.

Já a comédia "Luxemburgo, Luxemburgo", de Antonio Lukich, é uma produção ucraniana feita antes do início da guerra, e que ganha toques de melancolia justamente por isso. O roteiro acompanha dois irmãos gêmeos de personalidades opostas que querem reencontrar o pai que os abandonou na infância. O filme tem momentos de humor muito eficientes, e lembra bastante o cinema feito na Romênia nas últimas décadas, principalmente pelo misto de pessimismo e afeto com que olha para o próprio país.
O BAFICI continua até o dia primeiro de Maio, quando serão anunciados os vencedores das mostras competitivas.

