A exemplo do que fez no ano passado com o professor Ismail Xavier, pensador do cinema brasileiro, o Instituto Moreira Salles propôs uma carta branca ao exibidor e distribuidor Adhemar Oliveira, dos circuitos Arteplex e Espaço Augusta. Adhemar apresentou uma seleção de 20 filmes para uma homenagem, e o IMS selecionou sete, que estão sendo apresentados na sede da Av. Paulista. Não são os filmes da vida de Adhemar, mas foram filmes importantes na definição de sua atividade. Se fossem os melhores, estariam Cidadão Kane, o clássico de Orson Welles, Rocco e Seus Irmãos, de Luchino Visconti, ou Jules e Jim, de François Truffaut.

"Comecei no Rio, fazendo a programação do Cineclube da ABI. Virei exibidor em 1985 e depois me estabeleci em São Paulo nos anos 1990. O Arteplex surgiu nos anos 2000. Muita coisa mudou nesse período - muita coisa não para de mudar. O circuito passou por uma revolução completa, as plataformas de streaming avançam cada vez mais. E, além de tudo isso, você viu hoje (ontem) a inclusão da Cultura como pasta do Turismo? Não tem nada a ver, é coisa de desmantelar, mesmo." Apesar das dificuldades, o conceito do Arteplex, do qual Adhemar foi pioneiro no Brasil - mesclando filmes de mercado e de arte -, vai bem, obrigado. "Você sabia que para nós houve um aumento de público de 107% em relação ao ano passado? Estou falando de setembro, antes da Mostra", explica.

Os filmes na seleção do IMS estão ligados a lançamentos, a riscos que ele correu, ao longo desses 30 e tantos anos. (Não é uma data redonda.) "Aproveitei para rever o Pasqualino Sete Belezas, de Lina Wertmüller, e foi uma surpresa. Não me lembrava daquele começo, que me pareceu a coisa mais atual do mundo. Lancei no Rio o SuperOutro, do Edgar Navarro, o que foi uma loucura na época, porque o filme é um média." A ligação com o cinema brasileiro foi sempre muito forte. "É o que nos revela." Fellini? "Quando me uni a Leon Cakoff para distribuirmos, descobri que Os Palhaços era um filme que ambos queríamos. O Fellini está todo naquele circo"

Peter Brook? "Foi uma experiência curiosa. Um grupo meio esotérico me ofereceu o filme. Fiz uma única sessão na ABI, e lotou. Foram mais de 700 pessoas, uma loucura. Quando tentei negociar mais exibições, tinham sumido. Anos depois, se apresentaram de novo." Grande nome do teatro, Peter Brook tentou algumas vezes o cinema, com resultados desiguais. Fez Moderato Cantabile, com roteiro de Marguerite Duras (e Jeanne Moreau). Deu o que falar com O Senhor das Moscas, adaptado do romance cultuado de William Golding. Podem-se citar, também, A Perseguição e Assassinato de Jean-Paul Marat pelos Internos do Asilo de Charenton, sob a Direção do Marquês de Sade, ou simplesmente Marat-Sade, baseado na peça de Peter Weiss, o Rei Lear com Paul Scoffield, A Tragédia de Carmem e o Mahabarata. De tudo o que Brooks fez no cinema, nada supera Encontros com Homens Notáveis, inspirado na obra do filósofo G.I. Gurdjieff, também conhecido como Maksimovic, que percorreu a Ásia em busca do sentido da existência humana.

Um ator também cultuado, Terence Stamp - de clássicos de William Wyler (O Colecionador), Federico Fellini (o episódio Toby Domnitt, de Histórias Extraordinárias) e Pier-Paolo Pasolini (Teorema) é quem faz o papel. Stamp chegou a uma quadra da vida em que, por suas experiências sensoriais, inclusive com drogas, podia encarnar o visionário. O Boulevard do Crime, de Marcel Carné (e Jacques Prévert)? "Marcou toda uma geração de cineclubistas." E ainda tem Próxima Parada - Bairro Boêmio. "Vivi muito tempo aqui no Bixiga e, no Rio, em Botafogo. Me identificava muito com aquela visão do Paul Mazursky de Greenwich Village. Fui a Nova York, há alguns anos, pedi informação para chegar a determinado lugar e, de repente, me vi no meio do filme. O cenário real. O cinema tem disso. É um filme que amo, e espero rever."

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.