Faleceu no último dia 7 de abril, Dia do Jornalista, o jornalista, poeta e dicionarista Fernando Alexandre Guimarães Silva, de falência múltipla de órgãos.

Nascido em Maceió (AL) em 10 de março de 1950, “Fernandão”, como era conhecido por seus muitos amigos, estudou Jornalismo na Universidade Federal do Paraná (1968-1972), mas não se acostumou com o frio nem a morar longe do mar. Certo dia, um amigo o convidou para visitar Florianópolis. Depois de uma noitada etílica pela cidade, amanhecendo tomando cerveja no Mercado Público, encantou-se com o movimento dos pescadores e das canoas e barcos descarregando peixes e mantimentos. Decidiu-se mudar para a Ilha de Santa Catarina. Em sua primeira passagem, trabalhou dois anos no jornal O Estado.

Depois de uma breve passagem por Belém, Fernando decidiu morar em São Paulo. Depois dele editar o Shopping News, e de dois anos como editor da Gazeta de Pinheiros, ele descobriu que seria inaugurado no bairro um novo teatro: o Lira Paulistana. Ele viveria uma das grandes experiências profissionais de sua vida. O Lira Paulistana virou talvez a maior referência alternativa cultural de São Paulo de 1979 a 1986. Ao lado de Wilson Souto, Chico Pardal, Riba de Castro e Plínio Chaves, mergulhou fundo na nova aventura. O Lira funcionaria não apenas como casa de shows, mas teatro, cinema, jornal, editora e gravadora. Em 1981 Fernando criou o Jornal do Lira, um dos primeiros guias de cultura e lazer do Brasil. O lendário Lira Paulistana tornou-se talvez o principal espaço cultural alternativos de São Paulo e o palco principal da chamada Vanguarda Paulista. Foi pelo selo da gravadora do Lira que saíram os dois primeiros discos de Itamar Assumpção, de Cida Moreira, de grupos como Língua de Trapo, Premeditando o Breque, Patife Band, Rumo, entre outros. Nessa época, Fernando criou o personagem Professor Delyra, “um astrólogo anarquista que previa o passado e sentia saudades do futuro”.

Fernandão com o jornal Lira Paulistana: referência cultural alternativa entre as décadas de 70 e 80
Fernandão com o jornal Lira Paulistana: referência cultural alternativa entre as décadas de 70 e 80 | Foto: Carlos Pontalti/ Divulgação

Na sua segunda passagem pelo Paraná, nos anos 80, foi assessor de imprensa da Fundação Cultural e trabalhou na TV Iguaçu, em O Diário do Paraná, O Estado do Paraná, Indústria e Comércio, sucursais da Veja e da Folha de Londrina. Em 1988 conheceu a artista curitibana Andrea Ramos. Apaixonados, foram convidados por um casal de amigos a conhecer a praia do Saquinho, em Florianópolis, no extremo sul da ilha. Desta vez Fernando lançou âncora na ilha. Deslumbrado pela natureza local, o casal comprou um terreno e ergueu uma casa sobre um rochedo, com um deque que dava para a imensidão do mar. Ali o casal viveu por três anos e meio, sem eletricidade nem telefone, mergulhados no cotidiano simples e mágico da pequena comunidade e seus personagens.

Em 1992, por questões práticas de trabalho, mudou-se para a Costa de Dentro, em uma casa encravada na Mata Atlântica, alternando temporadas de trabalho entre Curitiba e Floripa. Encantado com o linguajar local, o “manezês”, Fernando foi coletando verbetes em pedaços de papel e passou anotar as expressões e o vocabulário dos nativos de Florianópolis. Anos depois nascia o best-seller "Dicionário da ilha, falar & falares da Ilha de Santa Catarina", seguido pelo "Dicionário do surf - a língua das ondas." Durante os últimos meses de sua vida, Fernando estava organizando um livro de poemas. Deixa uma filha, Tupá.

***

Rodrigo Garcia Lopes é poeta, romancista, tradutor e compositor, autor de "O enigma das ondas" (Iluminuras, 2020)