São Paulo, 30 (AE) - Wim Wenders não demonstrou grande aborrecimento por ter perdido para outro filme um Oscar dado como certo. Tanto é que pretende explorar um pouco mais o sucesso do seu "Buena Vista Social Club, lançando outros dois longas com os grandes músicos cubanos. Sua assessoria informou que os documentários serão centrados no concerto que os artistas fizeram em Amsterdã. Outro que promete seguir a trilha de Wenders é o espanhol Fernando Trueba, que já ganhou um Oscar com "Belle Époque - Sedução", e agora está rodando um filme sobre música latina, reunindo nomes como Cachao, Paquito dRivera, Chucho e Bebo Valdés.
A música cubana é mesmo estupenda, uma das três melhores do planeta, ao lado da brasileira e da norte-americana. Isso por si só já justificaria o sucesso de Buena Vista. Mas deve haver algo a mais na composição desse êxito. É como se o filme passasse uma vitalidade que já não é deste mundo. Como se esses personagens - Ibrahim Ferrer, Omara Portuondo, Compay Segundo, Rúben Gonzáles - guardassem não apenas alguma fórmula mágica de longevidade, mas, principalmente, de alegria de viver.
A esta altura do campeonato, a história deles já é bem conhecida. Antes de serem redescobertos por Wenders e pelo guitarrista americano Ry Cooder, estavam esquecidos e aposentados. Ferrer engraxava sapatos; Compay enrolava charutos. Não se queixam de nada. Apenas parecem compreensivelmente felizes com o sucesso. Ganham algum dinheiro, têm fama, são aclamados por onde passam.
O CD faturou o Grammy de produção latina e já vendeu mais de um milhão de cópias mundo afora. O filme faz sucesso em qualquer latitude. É a glória, recebida com modéstia, simplicidade e mesmo a sublime indiferença de quem não precisa muito dela. Os valores da trupe são inatuais, típicos de pessoas que habitavam um mundo do passado.
Pelo menos aparentemente, porque, se fossem apenas sobreviventes de um tempo que o vento levou, Compay, Ferrer & Companhia não tocariam tanto a sensibilidade contemporânea. Na verdade, é como se eles fossem porta-vozes de algumas carências atuais da humanidade - calor, alegria, afeto, sensualidade, para ficar nas mais óbvias.
Se Wenders tivesse se conformado a um estilo de filmagem convencional, talvez perdesse esse efeito regenerador. Mas os vigorosos velhinhos cubanos parecem ter influenciado em primeiro lugar o cineasta alemão. Wenders nunca foi tão "caribenho", livre, leve e solto quanto nesse documentário singelo. Captou tudo em vídeo, depois passou para película, no processo conhecido como kinescopagem. Fica mais barato, dá mais agilidade
parece mais espontâneo. Enfim, adequação da linguagem àquilo que se quer dizer. O resultado se aproxima do brilhantismo.