Zeca Corrêa Leite
De Curitiba
Na próxima Bienal do Livro, que vai acontecer em São Paulo, o poeta Hamilton Faria estará lançando seu mais novo livro de poesias, complementado por fotografias: ‘‘Súbitos para São Pedra’’. São instantâneos da cidade, captados na lente do fotógrafo e nas palavras dos poemas. ‘‘A poesia tem que sair para a rua’’, diz.
A frase é uma força de expressão – não só a poesia tem que se expandir, como a arte em geral, para sensibilizar os povos e dar melhor qualidade de vida às pessoas. O escritor afirma que o mundo está precisando com urgência de um ‘‘reencanto’’. E é dentro dessa perspectiva que ele está divulgando a revista ‘‘Desenvolver-se com Arte’’, editada pelo Instituto Pólis, de São Paulo, com depoimentos de voluntários que apostaram na transformação social através da arte, e conseguiram seus intentos.
O título da publicação – que está no número 33 – foi emprestado do nome de um grupo associado à Aliança por um Mundo Responsável e Solidário, espalhado por todo o mundo. ‘‘Essa aliança tem várias entradas e pessoas que se preocupam com vários temas. Um deles é a questão do papel da arte e do artista na sociedade. Então criamos o grupo Desenvolver-se com Arte’’, explica.
‘‘Muitas vezes o artista está completamente isolado e não se preocupa em trazer essa poética, que está presente na cultura em geral, para o mundo e fazer com que haja apropriação. A publicação é uma reflexão e uma sistematização de experiência de arte e sociedade’’, discorre Faria. O tema propicia discussões e, por isso mesmo, em 2001 será realizado em São Paulo um seminário internacional, com representantes de diversos países.
Os itens a serem tratados estão em estudo, mas a proposta é de que o evento seja dinâmico, ‘‘que parta da criatividade das pessoas, para depois elas conversarem sobre seu trabalho, sobre o processo de criação, as ligações sociais e as experiências disso’’, conforme Faria. ‘‘Nesta publicação apresentamos 18 experiências de arte e cidadania, arte e processo de transformação de sociedade.’’
Hamilton Faria deixa claro que este trabalho passa longe da ‘‘arte engajada, com ponto de vista ideológico’’. Em sua concepção é necessário repensar outros parâmetros, para que se possa deflagrar um mundo novo. A proposta de Desenvolver-se com a Arte, segundo ele, ‘‘é um processo de reencantamento, na medida em que essas coisas são repostas’’. Daí a razão do lançamento da revista ser feito com ‘‘conversas’’, para amealhar mais e mais simpatizantes.
Dentro dessa proposta de conquista pelo belo e pela sensibilização, Faria e um grupo de poetas vêm realizando recitais em São Paulo. As andanças levaram Hamilton e seus versos para lugares mais distantes, como no Peru, Índia, Dinamarca, França, etc.
‘‘Estamos vivendo num mundo que perdeu muito dos seus laços, das suas relações, sociabilidades e muito mais. Acredito que a arte pode repor isso, tanto no plano real como no imaginário, pois ela recria o real, e é maior do que o real no sentido de que muitas vezes um poema deflagra uma realidade, modifica determinadas relações’’, argumenta.
Adepto do pacifismo, o artista afirma que a questão da paz vai ser fundamental para o próximo milênio. ‘‘Será mais importante do que a miséria, a ecologia. Estive há pouco tempo na Colômbia e as pessoas estão tendo formação de árbitros de rua, para arbitrar conflitos de rua. Olha a que ponto nós chegamos, sem falar dos que morrem cotidianamente por grupos ligados a narcotráficos e outros grupos. Ainda assim é interessante ver que a paisagem das cidades que vai mudando em função da arte.’’
Utopia? Aos céticos Hamilton Faria aponta o exemplo de Itapecerica da Serra, região pobre de São Paulo onde estão sendo criados ‘‘barracões culturais da cidadania’’. Desde a implantação dos primeiros barracões, perceberam-se as mutações: ‘‘Aquela paisagem do bandido com arma na cintura, está mudando por um cara com um violão debaixo do braço. É uma paisagem nova nas periferias de São Paulo. Está sendo uma nova idéia, nova mensagem de resgatar realmente essas poéticas.’’
•‘‘Desenvolver-se com Arte’’, publicação do Instituto Pólis. Mais informações diretamente com a entidade, Rua Cônego Eugênio Leite, 433, São Paulo – SP, CEP: 05410-010. Telefone (11) 853-6877, fax (11) 852-5050.O poeta Hamilton Faria vai lançar nova obra, durante a Bienal do Livro. Enquanto isso, ele está divulgando a revista ‘‘Desenvolver-se com Arte’’
Arquivo FolhaHamilton Faria: ‘‘Estamos vivendo num mundo que perdeu muito dos seus laços’’