A volta de Bukowski em tempos de cancelamento
A editora Harper Collins resgata a literatura de Charles Bukowski e relança oito livros do escritor
PUBLICAÇÃO
quarta-feira, 10 de abril de 2024
A editora Harper Collins resgata a literatura de Charles Bukowski e relança oito livros do escritor
Marcos Losnak/ Especial para a Folha
Décadas atrás ele era considerado um misantropo exemplar. Nos dias de hoje é considerado um misógino asqueroso e bêbado. Apesar da controvérsia em tempos de cancelamento, o escritor norte-americano Charles Bukowski (1920 – 1994) continua com uma legião de fãs ávida por sua literatura.
Bukowski chegou ao Brasil em 1983 quando a editora Brasiliense publicou “Cartas na Rua”, primeiro livro do autor lançado em língua portuguesa. Ao longo da década de 1980 a editora continuou lançando obras como “Mulheres” e “Misto Quente”. A partir da década de 1990, foi a vez de a editora L&PM passar a publicar a obra de Bukowski no Brasil. Lançou mais de 30 títulos.
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Agora é a vez da editora Harper Collins passar a publicar os livros de Bukowski no País. No segundo semestre de 2023 publicou cinco volumes. Os romances “Hollywood”, “Factótum” e “Pulp”. O de poesia “Arder na Água, Afundar no Fogo”, e o que reúne cartas “Sobre a Escrita”. Em 2024 lançou mais três, o volume de contos “A Sinfonia do Vagabundo”, o de poesia “O Amor é um Cão dos Infernos” e a coletânea “Corro Com a Caça”. Todos com novas traduções e posfácios de acadêmicos. Traduções, em sua maioria, realizadas por mulheres – Isadora Sinay, Emanuela Siqueira, Bruna Barros, Érika Nogueira Vieira e Marina Della Valle – algumas declaradamente feministas.
Um dos destaques está em “Sobre a Escrita” que reúne cartas escritas por Bukowski entre 1945 e 1993. Cartas enviadas para editoras, revistas literárias e escritores. Revela um escritor tentando publicar seus escritos com a determinação de um touro com sede. Passeando entre uma montanha de recusas e alguma aceitação, deixa claro seu processo de escrita como fluxo. Os textos precisam surgir de um fluxo que não deve ser modificado depois, não deve ser reescrito. Talvez isso explique o fato de que em seus livros de contos e poemas o leitor encontre textos reveladores ao lado de textos tediosos.
E com sede de ser publicado, não guardava cópias dos textos. Em uma carta de 1961 explica: “Como você sabe, sou muito desleixado. Não guardo cópias. As coisas que mandei e foram aceitas, não tenho cópias. Coisas que mandei e não voltaram, não tenho cópias delas.”
O FLUXO DA ESCRITA
Apegado ao fluxo, Bukowski desprezava a forma na escrita. Isso fica evidente em várias cartas. Em suas palavras, a forma era uma gaiola na qual ele não queria entrar: “Concentrar-se em forma e lógica na construção da frase parece imbecilidade no meio da loucura.” Apesar do discurso, em outras cartas ele faz questão de discutir a literatura de autores consagrados e o trabalho formal de suas literaturas.
Quando o editor de uma revista literária nomeou os poemas de Bukowski como um estilo completamente “solto, preguiçoso e repetitivo”, ele respondeu em carta de 1960: “Não consigo trabalhar um poema. Poetas demais trabalham de forma conscienciosa demais em suas coisas e quando você vê o trabalho publicado, eles parecem estar dizendo... veja aqui meu velho, olhe só para esse POEMA. Eu até poderia dizer que um poema não deveria ser um poema, mas mais um pedaço de alguma coisa que acaba saindo certa. Não acredito em técnica ou escola ou maricas... acredito em agarrar as cortinas como um monge bêbado... e puxar, puxar e puxar...”
E prossegue em outra carta: “É quando você começa a mentir para si mesmo em um poema para conseguir apenas ‘escrever’ um poema que você fracassa. É por isso que eu não retrabalho os poemas, mas deixo-os ir na primeira vez que escrevo, porque se eu menti originalmente então não tenho por que afundar a faca, e se eu não menti, bem, então raios. não há com o que me preocupar.”
Para entender sobre o que Bukowski está dizendo, basta entrar de cabeça inicialmente nos poemas de “Arder na Água, Afundar no Fogo”. Depois nos contos de “A Sinfonia do Vagabundo”. Os dois livros oferecem uma visão completa da literatura do autor. E também revelam porque Charles Bukowski pode ser considerado tanto um misantropo exemplar quanto um machista bêbado e escroto. Mas se trata, acima de tudo, de literatura. E a infinita interpretação de texto faz parte da literatura.
SERVIÇO:
“Sobre a Escrita”
Autor – Charles Bukowski
Organização – Abel Debritto
Tradução – Isadora Sinay
Posfácios – Nara Vidal e Luis Antonio de Assis Brasil
Editora – Harper Collins
Páginas – 256
Quando – R$ 69,90
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“Arder na Água, Afundar no Fogo”
Autor – Charles Bukowski
Tradução – Alexandre Bruno Tinelli
Editora – Harper Collins
Páginas – 336
Quando – R$ 69,90
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“A Sinfonia do Vagabundo”
Autor – Charles Bukowski
Tradução – Bruna Barros
Posfácio – Luis Fernando Balby
Editora – Harper Collins
Páginas – 272
Quando – R$ 69