“Como viver? Como tornar-se o que se é? Qual é o caminho?”

Estas questões formam o ponto de partida de “Artes de Viver – Velhas Verdades” novo livro do jornalista e historiador londrinense Tony Hara. A obra reúne 17 breves ensaios que apresentam a filosofia como “arte de viver’ e promove a aproximação de duas filosofias milenares aparentemente distintas: a filosofia grega e a filosofia oriental.

Para essa aproximação, Hara passeia pelas ideias de pensadores orientais e ocidentais como Pu-tai, Lao Tsé, Platão, Confúcio, Epicuro, Heráclito, São João Crisóstomo, Chuang Tzu, Sócrates, Xenofonte, São Francisco Xavier, Diógenes, Alan Watts, Pirro, Matsuo Bashô, Nietzsche e Peter Sloterdijk, entre outros.

Tony Hara: "Somos treinados, educados a nos ver e agir como empresas disputando um lugar de destaque no grande mercado da vida"
Tony Hara: "Somos treinados, educados a nos ver e agir como empresas disputando um lugar de destaque no grande mercado da vida" | Foto: Marina Hara/ Divulgação

Publicado de maneira independente com patrocínio do Promic, “Artes de Viver – Velhas Verdades” é um exercício de pensamento para uma mudança de conduta diante do planeta Terra e seus habitantes. Um pequeno livro artesanal costurado manualmente pelo próprio autor.

Nas palavras de Hara, a obra “é um exercício de distanciamento das verdades dominantes de nossa época, e de admiração pelas forças criadoras e afirmadoras da vida”. E que se torna necessário “desentranhar as verdades que assimilamos por obediência, por força do hábito ou por preguiça de pensar”.

A seguir Tony Hara fala sobre “Artes de Viver – Velhas Verdades”

Você já se aventurou por vários territórios da filosofia em seus livros anteriores e agora, em “Artes de Viver – Velhas Verdades”, entra no território da filosofia oriental. Por que o interesse pela filosofia oriental?

Fui conduzido ao pensamento oriental antigo por conta das reflexões e pesquisas que li sobre as mudanças climáticas, sobre o colapso ambiental, sobre o esgotamento da Terra. Como adiar o fim do mundo, ou melhor, a extinção de nossa espécie? Acho que no modo de vida dos antigos pensadores chineses podemos encontrar alguma luz. O ideal de vida deles era uma vida discreta e simples. Na era do Antropoceno, num tempo em que somos estimulados a consumir os recursos da Terra para ostentar e exibir nossos sucessos, vitórias e mercadorias, fui atraído pelas histórias da vida simples e discreta.

“Artes de Viver” promove a aproximação de duas filosofias de mundos completamente diferentes: a filosofia grega e a filosofia oriental. Que relação você estabelece entre elas?

Os gregos antigos entendiam a filosofia como uma “technè tou biou”, isto é, uma arte de viver. A questão fundamental era: como viver? Eu gosto dessa ideia da filosofia como um exercício do pensamento destinado a elaborar um modo de vida adequado, justo e correto em relação ao outro e ao mundo. Li os clássicos da literatura chinesa e japonesa e seus comentadores, buscando elementos que pudessem me ajudar a avançar nessa questão do “como viver?”. Essa abordagem me afastou dos estudos comparativos, como aqueles realizados por François Jullien, por exemplo. Mais do que uma comparação, fiz uma seleção, uma escolha de filósofos do Oriente e do Ocidente, que por seus atos e palavras, buscaram viver em harmonia consigo mesmo num mundo imperfeito.

Você propõe posições sinceras e autênticas diante da vida, posições pautadas pela simplicidade. Como a ideia de simplicidade se encaixa num mundo cada vez mais complexo e conturbado?

O filósofo Byung-Chul Han chama a individualidade padrão de nossa época de “sujeito do desempenho”. Somos treinados, educados a nos ver e agir como empresas disputando um lugar de destaque no grande mercado da vida. Alto rendimento, produtividade incessante, avaliações permanentes, estabelecimento de metas sempre mais elevadas… Essa forma de programar a vida torna o sujeito cada vez mais complexo e perturbado. Han diz em um de seus livros: “O regime neoliberal introduz uma era do esgotamento. Hoje, explora-se a psique. Por isso, esta nova era é acompanhada de doenças mentais, como a depressão ou síndrome de burnout”. Penso que a vida simples tem a ver, de alguma forma, com a percepção da falência do empresário de si.

Em “Artes de Viver” você estabelece distinções entre verdades assimiladas por obediência e verdades assimiladas por transformação. Como reconhecê-las?

Assimilamos e tentamos obedecer até o limite do esgotamento, as verdades difundidas pelo regime neoliberal. Mas essas verdades constituem, no fundo, um sujeito permanentemente insatisfeito, pois nada é suficiente para quem o suficiente é pouco, como já dizia Epicuro. Hoje em dia, muitos indivíduos que se encaminham para a velhice percebem, antes mesmo do colapso psíquico, que a obediência à verdade imposta pela ditadura do capital é insustentável, insuportável. Fuga para o interior, para o campo, busca do silêncio, do retiro, da meditação, do prazer de estar próximo dos amigos, da natureza, do fazer artesanal… Acho que essas buscas individuais, minoritárias é claro, sinalizam uma mudança de percurso, de valores, de princípios verdadeiros; uma possível forma de transformação ou regeneração do humano fora da esfera das patologias do esgotamento.

Nos textos que compõem o livro você apresenta ideias e atitudes de pensadores que apostaram em converter a vida em arte. Por que essas ideias e atitudes são importantes para a humanidade hoje?

Os pensadores que fizeram essa aposta nos deixaram esse recado: não estamos condenados a ser o que somos. A filosofia como arte de viver é uma arte da transformação de si, uma elaboração ética e estética. Arte difícil, dolorosa, no limite, trágica, porque parece ser tolo, idiota, infantil, louco, insistir em criar um modo próprio de estar no mundo. Menos ego e mais eco, dizem os ambientalistas de nosso tempo. Para fazer essa passagem do que somos, do nosso ego inflado, narcísico, para um “eu” ecológico, relacional, que se sente pertencente ao planeta, e não seu mero consumidor, seria preciso, talvez, um entendimento dessa velha arte de viver.

Livro foi costurado manualmente pelo autor
Livro foi costurado manualmente pelo autor | Foto: Reprodução

Serviço:

“Artes de Viver – Velhas Verdades”

Autor – Tony Hara

Páginas – 76

Quanto – R$ 30

Onde encontrar – Através do e-mail: [email protected]

Imagem ilustrativa da imagem A velha arte de viver