Baseado na história real de Hiroo Onoda – um tenente do exército imperial japonês que passou quase 30 anos escondido nas Filipinas após a Segunda Guerra Mundial, sem saber da derrota japonesa –, o drama "Onoda: 10.000 Noites na Selva", dirigido por Arthur Harari, calma e pacientemente estabelece as condições e a mentalidade que poderiam levar um homem a continuar lutando por uma causa perdida, mesmo sem saber do desfecho. Ninguém avisou o soldado Hiroo Onoda do fim da guerra mais traumática que o mundo já viveu.

Onoda é exatamente um personagem saído dos melhores filmes de clássicos americanos de Howard Hawks ou John  Ford, alguém com um dever a cumprir e alguém que manterá sua equipe unida para cumpri-lo
Onoda é exatamente um personagem saído dos melhores filmes de clássicos americanos de Howard Hawks ou John Ford, alguém com um dever a cumprir e alguém que manterá sua equipe unida para cumpri-lo | Foto: Divulgação

O ator Yûya Endô interpreta o jovem Onoda (e Kanji Tsuda, o mesmo personagem, mais velho), que após treinamento brutal, se junta a um pequeno bando de tipos durões e desajustados em missão secreta para estabelecer uma posição de resistência na ilha de Lubang, nas Filipinas.

Onoda e seus homens desenvolvem uma espécie de culto fervoroso, que lhes permite justificar o roubo dos habitantes locais e ignorar os relatos de que a guerra acabou. (Hiroo Onada viveu anos no Brasil, no Mato Grosso do Sul, mas morreu em 2014 no Japão.)

O diretor francês Arthur Harari assumiu a respeitável empreitada de recontar e tornar compreensível a verdadeira odisseia de um oficial japonês, Hiroo Onoda, que ali permaneceu em estado de guerra ativa por trinta anos após o fim da Segunda Guerra Mundial . Cumpriu ordens específicas e secretas do alto comando japonês.


Harari narra a desventura do jovem tenente Onoda e os contornos nebulosos de sua missão; a narrativa é tanto um conto de guerra quanto um retrato psicológico: Onoda é exatamente um personagem saído dos melhores filmes de clássicos americanos de Howard Hawks ou John Ford, alguém com um dever a cumprir e alguém que manterá sua equipe unida para cumpri-lo.

O diretor Harari dá grande humanidade a um homem que se tornou uma "aberração", um vestígio do passado, uma atração turística
O diretor Harari dá grande humanidade a um homem que se tornou uma "aberração", um vestígio do passado, uma atração turística | Foto: Divulgação

Atento à paisagem, atento ao passar do tempo e ao movimento interno dos personagens, Harari capta em toda a sua importância o absurdo e a solenidade da situação, daqueles valores militares, do heroísmo ao sacrifício, firmeza e resignação.

Para a resolução épica dessa façanha entre o sublime e às vezes o ridículo, o filme utiliza um personagem externo, um jovem em busca daquele Coronel Kurtz de Conrad/Coppola, com alguns flashes fordianos e que lhe proporciona uma saída nobre para o grotesco. Mas para isso, o filme precisa de um tempo mais largo para ser resolvido, o que não diminui sua qualidade e nem seu interesse, mas requer paciência para seguir a trama.

Lá pela metade do filme, na década de 1970, um muito maduro adulto Onoda sobrevive na solidão. A mise en scène reconstrói com ele os pequenos rituais: preparar a comida, dormir e caminhar. Andar muito. A câmera passa várias vezes pelos mesmos lugares: onde antes acontecia uma tragédia, agora não há vestígios e vice-versa. Ninguém vai encobrir os mortos porque a vida continua e as ervas daninhas crescem.

O trabalho de Harari ao longo do tempo é tão dramático quanto irônico: no final, em Moscou eles comem no McDonald's. A partir daqui, Onoda encontra sinais de que a Segunda Guerra Mundial acabou, mas se recusa a acreditar neles: eles acreditam que estão tentando enganá-lo com notícias falsas. O diretor Harari dá grande humanidade a um homem que se tornou uma "aberração", um vestígio do passado, uma atração turística.

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Ninguém avisou o soldado Hiroo Onoda do fim da guerra mais traumática que o mundo já viveu
Ninguém avisou o soldado Hiroo Onoda do fim da guerra mais traumática que o mundo já viveu | Foto: Divulgação

Diante da patética e solitária valentia de Onoda, que durante três décadas viveu a sua própria Segunda Guerra Mundial, a memória cinéfila resgata uma frase do notável cineasta francês Jean Pierre Melville que abria um de seus filmes mais famosos, “O Samurai”, policial noir com Alan Delon: “Não há solidão mais terrível do que a do samurai; à exceção, talvez, do tigre na selva”.


“Onoda” está a partir desta segunda-feira (8) no Cine Ouro Verde, às 16 e 19h30.




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