500 ANOS DE ESQUECIMENTO
PUBLICAÇÃO
quarta-feira, 29 de março de 2000
Ranulfo Pedreiro
De Londrina
Os confetes que pairam sobre os 500 Anos do Descobrimento enfeitam, muitas vezes, um oba-oba rastaquera. Mas, se a badalação é desprovida de profundidade, o momento ao menos proporciona benefícios como o lançamento de textos menos dogmáticos sobre a história do Brasil. A Nova Fronteira publicou três títulos que marcam pela sobriedade: Formação do Brasil Colonial, de Arno e Maria José Wehling; O Império do Brasil, de Lúcia Maria Bastos Pereira das Neves e Humberto Fernandes Machado; e República Brasileira, de Lincoln de Abreu Penna.
A coleção surgiu originalmente durante o centenário da República, comemorado em 1989. Na época, saíram os volumes Uma História da República, transformado em República Brasileira, e Formação do Brasil Colonial. Faltava, portanto, O Império do Brasil, lançamento que veio cobrir o hiato e fechar a trilogia.
Os textos buscam uma visão global, sem uma dissertação estritamente cronológica. Mas também não esfarelam ao se dissociar em capítulos específicos. A costura, bem-feita, elimina remendos e proporciona o que o leitor não especialista procura: a compreensão em conjunto, associando elementos culturais, sociopolíticos e econômicos. Grandes fatos não estão distantes de sua implicação cotidiana.
No caso de O Império do Brasil, a costura é confeccionada com os elementos que resultaram na configuração de um Estado, nas características de uma nação. Uma das vantagens é que os autores driblam o isolamento com que a história brasileira normalmente é narrada, dedicando atenção ao contexto internacional.
Formação do Brasil Colonial traz uma análise a partir do século 16 até o século 19 baseada nos povos que formaram o País: índios, negros e europeus as diferenças e o convívio conflituoso. Como pano de fundo, estão a catequização, o absolutismo e o mercantilismo. Maria José Wehling é doutora em Filosofia em Pensamento Luso-Brasileiro e titular de Metodologia da História da Universidade do Rio de Janeiro. Arno Wehling é professor da Universidade de São Paulo e doutor em História.
O Império do Brasil é um texto encorpado que escapa de clichês ao se desenquadrar de uma linha de pesquisa histórica. Lúcia Pereira das Neves e Humberto Fernandes Machado ambos doutores em História Social citam Georges Duby como mestre e declaram que a história reside no estabelecimento de correlações.
Com uma visão amplificada dos acontecimentos internacionais e o desenvolvimento do Brasil como nação, o estudo se dedica ao período entre a partida da corte de Lisboa rumo à colônia, em 1807, até a Proclamação da República em 1889. O assunto é dividido entre os capítulos A Corte na América, Portugueses ou Brasileiros?, O Poder do Café, Entre a Tradição e o Progresso, Coronéis, Clientes e Bacharéis, Salões e Cortiços, A Morte da Escravidão e O 15 de Novembro.
O ciclo se fecha com República Brasileira, de Licoln de Abreu Penna que fez o mestrado em História na Universidade de Paris. Aqui, novamente, os indivíduos dão o tom da análise, que caminha por rumos sociais. A forte presença da oligarquia agrária, os ideais republicanos, a ditadura militar, o governo Collor, a reeleição de Fernando Henrique Cardoso e a manutenção de uma profunda desigualdade social balizam a obra, revista e atualizada na reedição.
A trilogia, nada oficialesca, desvenda o ralo conhecimento que o leitor comum possui da história brasileira. Resta dissociar o que há realmente para comemorar nestes 500 anos do carnaval que contornam o tema.
Formação do Brasil Colonial De Arno Wheling e Maria José Wehling. Editora Nova Fronteira, 402 páginas. Preço: R$ 30,00.
O Império no Brasil De Lúcia Maria Bastos das Neves e Humberto Fernandes Machado. Editora Nova Fronteira, 504 páginas. R$ 35,00.
República Brasileira De Lincoln de Abreu Penna. Editora Nova Fronteira, 384 páginas. Preço: R$ 30,00.Três títulos da Nova Fronteira lembram o quanto o brasileiro desconhece a própria História
ReproduçãoUma das ilustrações do livro Formação do Brasil ColonialFormação do Brasil Colonial: vários povos vivendo conflituosamente no mesmo espaçoReproduçãoO Império do Brasil analisa a formação de uma identidade brasileira através de correlaçõesReproduçãoRepública Brasileira revela que as diferenças sociais permanecem com o passar dos governos