50 ANOS DE ARTE AMERICANA
PUBLICAÇÃO
domingo, 09 de janeiro de 2000
VISUAIS
50 ANOS DE ARTE AMERICANA
ReproduçãoA seção América na Encruzilhada, um dos pontos altos da mostra, inclui obras da Pop Art que tem como representantes máximos Andy Warhol, consagrado pelas serigrafias coloridas de Marylin Monroe e outras celebridades, e Roy Lichstenstein
Amir Labaki
Agência Folha
O MoMA, de Nova York, reúne expoentes das artes plásticas da segunda metade do século em exposição que fica aberta até fevereiro
Um curioso paradoxo marca a segunda parte da exposição The American Century (O Século Americano), que vai até fevereiro no Whitney Museum of American Art de Nova York (MoMA). A primeira mostra, dedicada ao período entre 1900 e 1950, exibiu uma cena cultural americana muito mais variada e exuberante, embora a produção específica das artes plásticas tenha conhecido sua época áurea na era posterior, entre as décadas de 50 e 60, incluídas na corrente exposição.
The American Century empresta seu título de um editorial de Henry Luce para a revista Life, em 1941, em que proclamava a primazia dos EUA como potência mundial. A mostra do Whitney Museum tenta transpor a hegemonia política para a arena estética. Não convence, tanto devido à justiça histórica (arte e política nem sempre andam de mãos dadas) quanto à indecisão curatorial. O impacto da presente mostra é muito menor do que o da anterior. A menos significativa produção em artes plásticas da primeira metade do século foi compensada, na primeira exposição, por um generosa seleção de marcos em fotografia, arquitetura, design, filme e mesmo literatura. Quando mais forte era agora o universo a apresentar (1950-2000), a curadoria de Lisa Phillips diluiu o todo ao adotar um critério pretensamente democratizante na disposição de escolas e na representação de artistas. Essa segunda parte estrutura-se quase como um índice cronológico dos movimentos. Para tudo caber nos exíguos quatro andares do museu, optou-se por repartir quase de maneira equânime os espaços entre as décadas. O resultado foi a equiparação de desiguais. O recorte da exposição não privilegia, como deveria, os dois principais movimentos da arte americana do século, o expressionismo abstrato (Pollock, Rothko) e a arte pop (Warhol, Lichtenstein).
Procurou-se ainda restringir quase todos os artistas a apenas uma obra, empobrecendo-os por uma simplificadora leitura icônica. Há um maior número de artistas para uma muito mais superficial apresentação de cada um deles. Os pontos altos da mostra situam-se logo nos dois primeiros dos quatro andares, dominados respectivamente, em A América Assume o Comando, pela fase madura do expressionismo abstrato (Pollock, De Kooning, Rothko) e, em América na Encruzilhada, pela explosão da arte pop, de Warhol, Lichstenstein e Rauschenberg, e do minimalismo de Frank Stella e Chuck Close.
Os dois últimos andares, A Ascensão das Alternativas, 1970-80, e Chegando ao Milênio, de 1980 até hoje, perdem em foco e diluem-se na fragmentação. A pluralização de tendências, típica do período, e a proximidade histórica por certo tornaram mais instável o terreno para a curadora.
A exposição acelera-se em A Ascensão das Alternativas. Primeiro vem Earthworks, as megaintervenções em espaços heterodoxos por artistas como Robert Smithson. Segue-se a Arte Conceitual, assim batizada a partir de um texto de Sol Le Witt de 1967: A idéia vira máquina que faz arte. Quase nada fica das salas reservadas à expansão do cânone (Miriam Schapiro e Sherry Brody), à nova imagem em pintura e escultura (Elizabeth Murray) e ao ressurgimento da pintura (Basquiat). Entre elas, uma esquina de alta voltagem criativa traz exemplos da cultura de rua: a nova boêmia. A amostragem academicista rompe-se para o último oásis da exposição.
Aqui estão dois dos auto-retratos de Mapplethorpe, Tulsa é mais um poderoso flagrante fotográfico de Larry Clark do universo sexo, drogas & rock n roll e, por fim, Nan Goldin rouba-nos o fôlego com os 690 slides do audiovisual A Balada da Dependência Sexual (1976-92). Ainda mais problemática é a a seleção de Chegando ao Milênio. O Mundo Mediado não inova, mas tampouco desaponta ao organizar-se em torno de artistas identificados com o pós-modernismo como Cindy Sherman, Richard Prince e Barbara Kruger.
Uma didática sala traz a cronologia da luta travada contra o reacionarismo cultural nos EUA pós-1980, dos ataques a Mapplethorpe e Serrano aos cortes no orçamento do National Endournament for the Arts. Só faltou mesmo a recente cruzada do prefeito Giuliani contra a mostra Sensation do Brooklyn Museum.
Mas o vale-tudo impera em O Retorno, o Sujeito. Parece um versão
compacta de uma das Bienais do próprio Whitney. O espírito canônico da
mostra cede ao efêmero. Puzzle Bottle, de Charles Ray, com um boneco dentro de uma garrafa, é o isolado momento de bom humor. Tale de Kiki Smith, com um longo rabo de merda saindo do ânus de uma boneca de quatro, concede à estratégia do escândalo. A seu lado, o sutil artesanato com bonecas de pano de Mike Keller nos lembra o melhor Leonilson.
The American Century: Art & Culture 1950-2000 não acaba assim. O Indivíduo Revisitado destaca o retorno da literatura autobiográfica com leituras de Frank McCourt, Kathryn Harrison e Christopher Reeve que fazem o som ambiente em corredores, lobbies e banheiros. Videos com anúncios da GAP e trechos de Os Simpsons surgem em monitores dispersos nas escadas. Cada milímetro do museu parece ocupado pela mostra.