SANTOS, SP (FOLHAPRESS) - A restrição ao número de pessoas nas delegações olímpicas da Tóquio-2020, por conta do coronavírus, já é de conhecimento de todos. Quem ficou em casa, contenta-se em assistir pela televisão ou matar a saudade por ligações.

Ninguém próximo aos atletas, porém, deve ter escolhido uma alternativa igual à do pai de Pedro Barros, 26, skatista que estará competindo no park nesta quarta (4), a partir de 21h (de Brasília).

Morador de um reduto do skate brasileiro, o Rio Tavares, em Florianópolis (SC), André Barros, 49, preferiu se isolar em outros mares, mais precisamente na Nicarágua. "Não quero estar lá [em Santa Catarina] nesse momento, no meio da multidão. Quero ficar refletindo", diz o pai de Pedro.

A decisão foi tomada ao saber que não poderia seguir para o Japão e acompanhar o filho. "Sempre estive do lado dele e justo no campeonato mais importante, não estarei. É triste para nós dois. A gente compartilhou isso a vida toda", lamenta.

O número de credenciais olímpicas criou um mal-estar com o medalhista de prata do street, Kelvin Hoefler, que pediu para levar a esposa. Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo depois da conquista de Kelvin e de Rayssa Leal, também prata, o presidente da Confederação Brasileira de Skate (CBSK), Eduardo Musa, alegou que não poderia privilegiar um ou outro.

Apaixonado pelo surfe, André Barros preferiu, então, subir na prancha no meio do Oceano Pacífico, a quase 6 mil quilômetros da capital catarinense. A terapia perfeita para digerir a distância de Pedro durante os treinamentos da seleção e a participação nos Jogos.

"Quero ficar recluso, pegando onda, que é o que eu mais gosto na vida, já que não estarei com ele, e ele sabe disso", explica.

Não que, no caso do pai de Pedro, a opção signifique fechar-se em um quarto escuro, afastado do mundo exterior. Pelo contrário. Está na praia e, o melhor, em casa. Ele conversou com a reportagem diretamente de sua residência em Miramar.

"Hoje até estou aqui com um amigo do surfe, mas quando precisa tem também uma comunidadezinha de brasileiros. É tudo bem simples aqui, com cara de antigo, é quase como se eu estivesse no meio dos anos 1980", descreve.

Uma paz que, de fato, talvez não encontrasse na casa de Florianópolis. O frenesi em torno da estreia do skate nas Olimpíadas, com as disputas de street, é a outra parte da explicação para o destino. André previu tudo o que está acontecendo, a "última página" da virada do esporte no Brasil e no mundo.

"Antes, tinha de ir pros EUA para ser conhecido", lembra. "Agora, o skatista vai ser visto como atleta, como olímpico e, por isso, será visado por todas as marcas, não só as do skate, como foi até hoje". Os holofotes principalmente em cima de Rayssa, de apenas 13 anos, confirmam isso.

"É aquilo do carisma da Fadinha, do Kelvin abraçando o peruano", aponta. "Teve a rusga de que tanto falaram [de Kelvin com Leticia Bufoni, skatista do street], mas aquilo é igual briga de família", minimiza.

E André conhece seus vizinhos do Rio Tavares, no sul da ilha, localidade que responde por mais dois skatistas da seleção: Yndiara Asp e Isadora Pacheco, de quem também é empresário -além de cuidar da carreira do filho.

"É o bairro do mundo que mais leva atletas para a Olimpíada", brinca. "Talvez a maior concentração por metro quadrado de pistas [de bowls, para a prática do park]. Pessoal prefere que instalar piscinas".

Esse movimento começou com o próprio André, quando construiu a sua pista no quintal do terreno antes mesmo dos outros cômodos. Segundo reportagem da revista Trip de 2016, seriam ao menos 25 bowls no Rio Tavares naquela época. O de André, inclusive, é aberto ao público até hoje, por alguns dias da semana.

"É uma vida cultural tão forte, que não tem como sair dali. Seria como deixar o North Shore, no Havaí", compara o pai de Pedro Barros, citando o famoso reduto do surfe.

Pedro está entre os cotados a uma medalha no park, a despeito da modéstia de André. "Ele já estava quase aposentado, foi com a missão de mostrar o que é o skate. Transmitir o nosso carinho pelo esporte", sonha.

Não existe, por isso, rancor algum com os rumos dos últimos meses. Desde fevereiro na Nicarágua, aproveita para refletir os próximos passos do STU (Street Total Urbe), o circuito nacional de skate, do qual é diretor de marketing. E aproveita também para torcer, claro. Ele acompanhou as performances nos dias 25 e 26 de julho.

"Torcendo pro pessoal, pô, ja me deu um terereco aqui no peito", relata, e, à espera da vez de Pedro, admite. "Estou até com medo de ter taquicardia. [Se vier pódio] Corro para o aeroporto e pego o primeiro avião, pode preparar o caminhão de chope", avisa ele, que é dono de uma marca de cerveja.

Se não vier medalha, sem problemas. André já conseguiu o que ele o filho queriam, cumprir a "missão", como repetiu mais de uma vez durante a entrevista. "Uma das coisas mais lindas que a gente pode fazer é espalhar para o mundo o nosso jeito de encarar as coisas e por meio do que a gente ama fazer."