SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Para conseguir jogar a final de Roland Garros havia apenas um caminho: uma injeção no pé esquerdo. Só assim para Rafael Nadal, 36, superar a dor e enfrentar o norueguês Casper Ruud, 13 anos mais jovem.

Foi um atropelamento. O espanhol venceu com facilidade por 3 sets a 0 (6/3, 6/3 e 6/0) em 2h18 de partida neste domingo (5), em Paris.

Uma decisão controlada por Nadal do início ao fim para coroar seu 14º título do torneio. Recorde absoluto. O segundo colocado, o francês Max Decugis, ganhou oito vezes na era do amadorismo. Sua última conquista foi em 1914.

Também representou seu 22ª troféu em simples masculino em Grand Slams (circuito que reúne também o Aberto da Austrália, Wimbledon e Aberto dos Estados Unidos). Ele tem dois de vantagem sobre o suíço Roger Federer e o sérvio Novak Djokovic.

"Tive meu médico aqui comigo. Joguei sem sentir meu pé, com uma injeção no nervo, então meu pé estava adormecido. É por isso que fui capaz de jogar", disse Nadal, em entrevista após a vitória para o canal Eurosport.

O tenista também lembrou que ficou um mês sem treinar e que, além da lesão, enfrentou uma fratura na costela.

As dores no pé esquerdo são decorrentes da síndrome de Müller-Weiss, uma doença degenerativa rara que afeta um dos ossos da parte central do pé. Nadal recebeu o diagnóstico em 2005.

"Este osso se submete a tensões significativas e, por razões desconhecidas, perde sua vascularização e se torna necrótico", disse Denis Mainard, presidente da Associação Francesa de Cirurgia do Pé, à agência AFP.

Nos casos mais graves, "o osso se desintegra, pode se fragmentar e, ao final, evoluir para uma osteoartrite com redução do arco plantar", completou

O problema físico fez nascer a especulação de que Nadal poderia anunciar a aposentadoria após a final. Não foi o que aconteceu.

"É muito difícil descrever o que sinto. Estar aqui aos 36, competindo no torneio mais importante da minha carreira mais uma vez... Não sei o que vai acontecer no futuro, mas vou continuar lutando", disse, ao descartar abandonar uma carreira em que já lhe rendeu US$ 500 milhões em premiações e patrocínios (R$ 2,4 bilhões pela cotação atual), segundo a revista Forbes.

Antes da decisão, ele chegou a falar, meio de brincadeira, meio a sério, que aceitaria perder para o norueguês em troca de um pé novo.

Ao entrar em quadra neste domingo, os gritos de "Nadal! Nadal!" não deixaram dúvidas sobre qual a preferência da maioria do público. Isso também ficava claro com as bandeiras da Espanha, algumas com a frase "Vamos, Rafael!".

Na metade do terceiro set, a linguagem corporal de Casper Ruud era de quem havia desistido da partida. Talvez por causa dos problemas físicos, o espanhol entrou em quadra para decidir logo. Foi o que aconteceu.

"Agora sei o que é lhe enfrentar em uma decisão. Pelo menos não fui a primeira vítima", disse Ruud para Nadal, a quem tem como ídolo. Ele passou por períodos de treinos na academia do rival e, em seu discurso como vice, agradeceu a hospitalidade.

Rafael Nadal já havia reconhecido estar jogando melhor do que esperava nas quadras francesas.

"Busquei um nível que eu pensava já não ter", disse ele após o triunfo sobre o rival Novak Djokovic, nas quartas de final. Uma vitória que, mesmo com seu histórico quase inacreditável no Aberto da França, era por muitos considerado improvável.

Então líder do ranking mundial e defensor do título, o também veterano Djokovic, 35, havia chegado às quartas sem ter perdido um set.

O horário do jogo, à noite, em tese favorecia o sérvio, já que a umidade torna a quadra mais cadenciada. O espanhol, gênio do saibro, gosta da quadra lenta, mas não lenta a ponto de oferecer aos adversários um tempo estendido de recuperação diante de suas pancadas.

No primeiro game, foi para cima e quebrou o saque de Djokovic. O set inaugural foi decidido rapidamente. O rival exibiu força no segundo, porém foi o machucado Rafael, que vinha de um triunfo em cinco sets, quem se mostrou mais inteiro, sobressaiu até na parte física e fez 3 sets a 1 :6/2, 4/6, 6/2 e 7/6 (7/4).

Em seguida, superou o alemão Alexander Zverev --que se lesionou no 2º set após derrota no 1º e viu frustrada sua tentativa de assumir a liderança do ranking, agora do russo Daniil Medvedev-- e se colocou outra vez na decisão. Contra Ruud, 23, provou de novo que, de noite ou de dia, Roland Garros é seu lugar.

Depois de vencer também o Aberto da Austrália, a pergunta é se Nadal estará em Wimbledon, no final deste mês. Seu problema no pé torna isso pouco provável, mas em 2023, em Paris, ele deverá estar presente em busca do 15º título

Não por acaso, em sua fala de agradecimento, com a taça na mão pela 14ª vez, chamou Roland Garros de o melhor torneio do mundo.