SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Quando o heptacampeão Lewis Hamilton cruzou a linha de chegada do GP da Emilia-Romagna apenas na 13ª posição, uma volta atrás de Max Verstappen, da Red Bull, o vencedor da corrida, o chefe da Mercedes, Toto Wolff, nem esperou o inglês retornar aos boxes para conversar com ele.

Pelo rádio, o austríaco mostrou seu descontentamento.

"Desculpe pelo que você teve que pilotar hoje. Eu sei que é indirigível. Foi uma corrida horrível. Vamos sair dessa", afirmou.

Aquela era a quarta etapa de uma temporada em que a Mercedes parece irreconhecível nas pistas. Ainda que George Russell tenha terminado a corrida em quarto, ele também não tinha um veículo capaz de lutar pela vitória --passadas cinco corridas, Hamilton e o recém-chegado à equipe têm como melhores resultados no ano um terceiro lugar cada um.

Para mais da metade das escuderias do grid, um único pódio já seria motivo de comemoração. Mas não é o caso para o time que ostenta a maior hegemonia da história da F1. De 2014 a 2021, a Mercedes ganhou oito títulos de construtores e sete de pilotos, sendo seis com Hamilton e um com Nico Rosberg.

A equipe comandada por Wolff foi a que mais se beneficiou da mudança de regulamento na categoria em 2014, quando teve início a era dos motores híbridos.

Nesta temporada, a F1 estreou uma nova regulamentação para os carros, e, desta vez, a equipe alemã viu as rivais Ferrari e Red Bull saltarem à frente.

O carro da Mercedes "veio com um conceito radical", explica Wolff, "que no papel teve ótimos resultados". Eles não se confirmaram na pista. "A realidade é que a física e a física teórica não combinam no momento."

Os novos veículos da categoria trazem de volta o conceito do "carro asa". Projetado no formato de asas de avião invertidas, eles usam elementos do "efeito solo", o responsável por acelerar o ar que passa por baixo do carro para que haja mais aderência e velocidade.

O conceito produziu carros que oscilam ou saltam ao longo de um circuito, o chamado efeito "porpoising". Todas as equipes estão sofrendo com isso em algum grau, mas o caso da Mercedes é o pior.

Enquanto não se fabrica uma solução, os carros de Hamilton e Russell precisam aumentar a altura em relação ao solo, o que afeta a performance.

Na última etapa, em Miami, a equipe estreou algumas peças, incluindo a asa traseira, e viu avanços no primeiro treino livre, na sexta-feira, quando Russell chegou a fazer o melhor tempo. Na corrida, porém, o desempenho não foi o mesmo --o recém-chegado foi quinto, e Hamilton, sexto.

A Mercedes reservou para a etapa deste domingo (22), às 10h, no circuito de Barcelona, o maior pacote de atualizações --a Band vai transmitir a prova. No treino de classificação do grid largada, neste sábado (21), Russell terminou em quarto, e Hamilton, em sexto. Leclerc larga na frente, seguido por Verstappen e Carlos Sainz.

A pista espanhola foi o lugar onde a primeira parte da pré-temporada foi realizada em fevereiro. Naquela ocasião, os carros da equipe apresentavam um conceito mais próximo do convencional, semelhante aos veículos rivais, ainda sem os chamados "sidepods zero", como ficaram conhecidas as laterais dos carros de Hamilton e Russell por serem bem estreitas, deixando as bordas do assoalho salientes.

Essa saliência pode estar por trás justamente do efeito "porpoising" que está fazendo o carro quicar nas pistas e perder desempenho, sobretudo velocidade, tanto nas retas como nas curvas.

A ideia de levar para a Espanha as atualizações do W13 é comparar o comportamento do carro atual e o desempenho daquele usado no início do ano, de modelo mais convencional.

"Nós continuamos testando configurações, instalamos novos componentes, e isso nos forneceu respostas e indicações de qual direção seguir", afirmou Russell.

O heptacampeão tem sido mais sacrificado do que o novato. Hamilton vem permitindo que a Mercedes faça em seu carro os testes mais complicados, e isso ajuda a entender por que o novo companheiro tem mais pontos (59 a 36).

"É uma nova experiência, com certeza. Você sempre quer tentar avançar, mas é muito difícil quando não está realmente avançando", admite o britânico.

Em todas as entrevistas, ele tenta demonstrar confiança de que a situação será revertida. "Estamos com a mesma velocidade que estávamos na primeira corrida, então temos de continuar tentando. Infelizmente, não melhoramos nessas cinco corridas, mas espero que, em algum momento, isso aconteça."

Além do desejo de voltar a brigar por vitórias e, quem sabe, até pelo título que faria dele o maior vencedor da categoria de forma isolada, deixando o também heptacampeão Michael Schumacher para trás, o inglês defende uma impressionante marca de vitórias.

Desde que estreou na categoria, em 2007, ele sempre venceu ao menos uma etapa em todos os anos. Com isso, tornou-se o primeiro piloto da história a atingir três dígitos no número de triunfos, com 103 --Schumacher é o segundo na lista, com 91.

Para manter sua escrita, Hamilton vai precisar se agarrar mais do que nunca ao mantra que costuma lembrar em momentos difíceis e que foi sua primeira tatuagem: "Still I Rise" ("Ainda me levanto"), título de um poema de Maya Angelou (1928-2014), escritora negra e ativista em prol dos direitos humanos.