Comoção, alegria e consternação. Alívio e euforia, dificilmente a indiferença. A partida de Diego Maradona, uma das maiores lendas do futebol, aos 60 anos, repercutiu mundo afora na mesma medida em que seu talento e personalidade arremataram multidões aos estádios ou para a frente da TV.

Imagem ilustrativa da imagem Maradona foi um 'Charles Chaplin de chuteiras', diz fã
| Foto: Ronaldo Schemidt/AFP

Vítima de uma parada cardiorrespiratória em sua casa, na cidade de Tigre, região metropolitana de Buenos Aires, Maradona ainda se recuperava de uma cirurgia para drenar uma hemorragia no cérebro, o que o deixou no hospital por oito dias. Embora seja considerado um procedimento simples, as preocupações da equipe médica giravam em torno das condições de saúde de Maradona, agravada por um histórico nada saudável.

“Que Deus traga ao Maradona a paz que deu ao Mané Garrincha”, desejou o colunista da FOLHA Oswaldo Militão, em alusão aos danos à saúde causados pelos vícios que marcaram a vida dos dois jogadores.

Grande admirador dos “artistas da bola”, definiu, Militão lembrou de imagens que vieram à sua mente imediatamente ao saber da partida de Maradona. Uma delas, é claro, do gol contra a Inglaterra em que o argentino deixou cinco adversários para trás, na Copa do Mundo de 1986.

Militão contou que se lembrará com alegria da tabela de cabeça entre Maradona e Pelé na noite do dia 15 de agosto de 2005, quando, à frente do programa “La Noche del 10”, Diego recebeu o amigo Edson para uma entrevista. Outra boa lembrança foi ver Maradona em visita ao ex-companheiro de Napoli na conquista da Itália, em 1989 e 1990, e da Uefa, em 1988 e 1989, Careca.

“O futebol está mais pobre. Não vai aparecer outro, como não vai aparecer outro Pelé, Mané Garrincha, os artistas da bola. Eles vão embora e não vão aparecer outros artistas da bola, um verdadeiro driblador. Onde aprenderam isso? Na várzea, jogando pelada. As várzeas não existem mais, os construtores compraram os terrenos”, lembrou Militão.

Milhões de fãs e amigos ao redor do mundo aproveitaram as redes sociais para se despedir e demonstrar o seu carinho pelo ídolo argentino. Um deles foi Pelé, que disse esperar jogar bola com Maradona no céu.

DE PAI PARA FILHO

Imagem ilustrativa da imagem Maradona foi um 'Charles Chaplin de chuteiras', diz fã
| Foto: Dibyangshu Sarkar/AFP

Diego Armando Maradona deixou os gramados em 25 de outubro de 1997, com quase 37 anos, 676 jogos e 345 gols na carreira. À época, o hoje advogado e morador de Londrina João dos Santos Gomes Neto, 28, ainda era uma criança que, por influência do pai, passou a se interessar por Maradona. “Primeiro pelo futebol, depois pela pessoa”, contou.

Gomes Neto lembrou que, quatro anos antes da Copa do Mundo de 1986, a histórica disputa entre Argentina e Inglaterra pela soberania das Ilhas Malvinas havia terminado mal para os “hermanos”, o que fez acirrar a tensão entre as duas nações também dentro de campo. Com a derrota ainda “engasgada” no peito e a "ferida" ainda aberta na formação social do povo argentino daquela geração, “aquele jogo não seria só uma partida de futebol e havia um clima de que o jogo não iria acabar”, definiu.

Para o jovem advogado, fã incurável do eterno “Pibe de Oro”, Diego Maradona foi responsável por fazer justiça com os pés e - principalmente - com a mão. “Essa imagem foi muito simbólica, quando ao final do jogo o repórter pergunta se havia sido a ‘mão de Deus’. É uma partida muito representativa para o esporte no sentido de analisar o contexto da prática esportiva, não só do desenvolvimento do futebol, mas da sociedade como um todo”, explicou.

Questionado sobre qual é o único ponto positivo da histórica comparação com Pelé, o que se confunde com a provocação dos argentinos na defesa da tese de que Maradona foi maior, o jovem responde com a maturidade de um veterano. “A representatividade da América Latina no mundo futebolístico: discute-se quem é o maior, um argentino ou brasileiro”, orgulhou-se de ter nascido na América Latina.

Seu pai, o também advogado João dos Santos Gomes Filho, 55, se referiu a Maradona apenas como ‘Diego’, como quem fala de um amigo próximo. Para ele, Maradona foi a mais perfeita metáfora da América Latina. “Era canhoto, nasceu em um lugar muito pobre, sem perspectivas, em um modelo econômico neoliberal exploratório e fadado a ser o que o pai dele foi. Ele só tinha uma chance e construiu através do seu talento um amálgama de genialidade e um espólio político. Ele foi um Charles Chaplin de chuteira”, comparou.