Lúcio Horta
De Londrina
O local de trabalho todo mundo conhece: qual ‘‘boleiro’’ de Londrina, craque ou perna-de-pau, que não assistiu a uma partida de futebol no Estádio do Café ou no Vitorino Gonçalves Dias, o VGD? Serão para esses dois locais que os olhos do País estarão voltados durante a fase de preparação e na disputa do Pré-Olímpico. Mas a residência oficial da Seleção Brasileira, desde segunda-feira, é um hotel localizado bem no centro da Cidade, logo no início do Calçadão da Avenida Paraná. É lá que os jogadores vão permanecer, durante o Pré, quando estiverem longe da bola e dos gramados.
O Crystal Palace Hotel, novo ‘QG’ da Seleção Brasileira, nunca recebeu tantos hóspedes ilustres ao mesmo tempo. Há 15 anos instalado no cruzamento das ruas Quintino Bocaiúva e Hugo Cabral, rapidamente se tornou um dos mais conhecidos de Londrina. A inauguração foi exatamente no dia 15 de março de 1985. Antes, a mesma esquina abrigou um supermercado da família Fuganti – nome que é sinônimo de tradição na Cidade – e, posteriormente, uma loja da rede Casas Felipe.
A idéia de construir um hotel nasceu no final da década de 70 e foi encampada pela família de Rômulo, Remo e Mafalda Veronese – pioneira em Londrina na área da construção civil –, além de Anselmo Maselli. Rômulo morreu em julho de 98 e Remo, em dezembro de 99, na Itália. Se estivessem vivos, receberiam a trupe canarinho com rojão e tapete vermelho.
– Eles gostavam muito de futebol. Com certeza seria uma festa - avalia Jurandir Brugin, gerente do hotel e que trabalha com a família Veronese desde antes da fundação do Crystal.
Nesses quinze anos, muitas figuras ilustres passaram pelos apartamentos do Crystal, como o governador Jaime Lerner (PFL), o líder do PT, Luiz Inácio Lula da Silva e até o presidente da República, Fernando Henrique Cardoso (PSDB) – que não pernoitou mas passou por lá. Sem contar o meio artístico: Xuxa, por exemplo, foi uma das primeiras personalidades a entrar no hotel. A turma do sertanejo também esteve lá completa – Chitãozinho e Xororó, Leandro e Leonardo, Zezé di Camargo e Luciano, Daniel etc.
Mas, pelo menos no campo esportivo, o principal hóspede que o Crystal já recebeu é mesmo a seleção brasileira pré-olímpica. O grupo conta com mais de 40 pessoas, entre jogadores, comissão técnica e pessoal de apoio. Para comportar tanta gente de um mesmo time, o hotel reservou nada menos que 50% das vagas, distribuídas em dois andares (de um total de quatro) devidamente ‘‘lacrados’’ para o público externo. Para que nada dê errado, os 73 funcionários estarão em alerta constante.
– Está sendo um sufoco - confirma o gerente.
Os jogadores foram instalados estrategicamente no primeiro andar, próximos da sala de café e refeição (exclusiva para a delegação), sala de jogos, sala de preleção e teatro para entrevistas coletivas. Cada apartamento – com cerca de 30 metros quadrados, duas camas, mesa, frigobar e aparelhos de televisão (com canalização por assinatura) e ar-condicionado – está recebendo dois atletas. Detalhe: no frigobar tem somente água. Bebida alcóolica, nem pensar. Já o técnico Luxemburgo terá uma suíte maior, com salinha separada, para reuniões e convidados. Mas não será a suíte presidencial: esta é ocupada por um morador fixo do hotel.
Na hora do lazer, na sala de jogos os jogadores têm à disposição sinuca, pebolim, pingue-pongue, televisão e até mesas para carteado – jogo condenado pelo ex-técnico da seleção, Mário Lobo Zagalo (que chegou a proibir jogos que valiam dinheiro) mas que é um dos passatempos preferidos do atual, Wanderley Luxemburgo. Antes das partidas, durante a preleção, a comissão técnica vai contar com equipamento multimídia, utilizado com os tradicionais vídeos para motivar o elenco. Nos compromissos com a imprensa, em entrevistas coletivas, o teatro terá o número de cadeiras reduzido de 450 para 100, especificamente para jornalistas credenciados, sem contar as oito na mesa principal.
Além de montar toda a estrutura, o Crystal ainda tem de administrar a ‘‘confusão’’ do dia-a-dia da Seleção. Somente os jogadores, por exemplo, no mês em que a Seleção estará na cidade, deverão consumir cerca de uma tonelada de alimentos, com cinco refeições por dia. Os pratos serão preparados pelo chef de cozinha Paulo Fernando Queiróz, sob orientação de um nutricionista da CBF. O cardápio será enviado diariamente a ele, via fax.
– Já recebemos orientação: a alimentação será a base de carboidratos (massas), com proteínas (carnes), vitaminas (frutas) e pouca gordura. Será muito simples, nada pesado ou sofisticado - afirmou o chef, que já serviu a seleção brasileira em Curitiba, quando trabalhava num hotel da capital paranaense. Mas foi um dia só, num jogo amistoso, e não numa competição inteira.
– Por isso estávamos apreensivos. Mas agora já recebemos as orientações e está tudo bem - diz Paulo Queiróz.
Ele informa que chegou a pedir conselhos para o chef de cozinha do Hotel Bourbon, de Foz do Iguaçu, que recebeu a Seleção durante a Copa América, em junho e julho passados.
Já a quantidade de roupas que vai passar pela lavanderia do hotel, durante o período em que a Seleção estiver hospedada, é uma incógnita. ‘‘Não dá para prever porque nunca recebemos uma delegação por tanto tempo. Mas estaremos preparados’’, assegura o gerente.
Outra preocupação é com a segurança. Só entrarão no hotel, além dos hóspedes habituais e funcionários, jornalistas credenciados para as entrevistas coletivas. Ainda assim, nos horários previamente marcados. Evitar o assédio direto dos fãs, que diariamente se acotovelam na frente do hotel, é a palavra de ordem.
Além disso, a presença da Seleção no Crystal vai coincidir com o vestibular de verão da Universidade Estadual de Londrina (UEL), que ocorre de 9 a 12 deste mês. Muitos vestibulandos estarão no hotel no mesmo período dos jogadores.
Para o gerente Brugin, a coincidência será outro fator para testar a capacidade do hotel.
– A exigência será muito grande. Mas também será uma escola para nós. Estaremos dispensando, à Seleção Brasileira, um tratamento de nível internacional. Por isso, só temos a ganhar.